Colômbia entra no mapa dos protestos
Direita volta ao poder no Uruguai ▪ Chile cancela de vez o futebol pelos protestos ▪ Xenofobia contra venezuelanos ▪ País a país, um resumo das notícias do continente, no Giro Latino #8
Desde o início do paro nacional convocado contra o governo de Iván Duque, na quinta-feira passada (21), a Colômbia seguiu mobilizada, completando sua primeira semana cheia de protestos – e lamentando, também, seus primeiros mortos pela repressão policial. O caso que ganhou maior notabilidade foi o do estudante secundarista Dilan Cruz, alvejado pela polícia a uma curta distância. Em um 2019 em que manifestações massivas já sacudiram países – e governos – em outras nações sul-americanas, como Bolívia, Chile, Equador, Peru e Venezuela, a Colômbia parece ter entrado definitivamente no mapa do descontentamento que cresce.
O GIRO LATINO chega para sua oitava edição com as notícias de todo o continente, uma colaboração exclusiva do analista político peruano Alonso Gurmendi, professor de Direito na Universidade do Pacífico, em Lima, e a repercussão da decisão inédita do futebol chileno, que optou por encerrar sua temporada prematuramente em função dos protestos sociais.
Un sonido:
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ARGENTINA 🇦🇷
O futuro chanceler do país, Felipe Solá, disse que a Agentina está “de luto em relação ao Brasil”. Sem poupar críticas ao governo do presidente Bolsonaro, o ex-governador de Buenos Aires vê “uma espécie de raiva ideológica” no bolsonarismo. No UOL.
Assessores próximos ao presidente eleito Alberto Fernández garantem que os novos embaixadores serão escolhidos com prioridade para os diplomatas de carreira. A afirmação vem em resposta aos temores de que indicações com viés partidista possam provocar uma virada drástica na política externa do país. O novo governo considera prioritárias as embaixadas argentinas nos EUA, Brasil, Espanha, China, Vaticano e Israel. No Clarín.
O governo Macri mostrou descontentamento com a “atípica dureza” de um pedido de esclarecimentos feito por um braço da ONU que zela pela independência do sistema judiciário. O órgão havia considerado “fiáveis” as denúncias sobre um suposto “plano sistemático e estrutural de amedrontamento do Poder Judiciário”. Claudio Avruj, secretário de Direitos Humanos da Argentina, reforçou que o governo preza pela separação dos poderes e considerou o pedido de informes um ato de “oportunismo político”. No Clarín.
BOLÍVIA 🇧🇴
O líder radical Luis Fernando Camacho, um dos cérebros por trás da renúncia forçada de Evo Morales, oficializou sua saída do Comitê Cívico pro Santa Cruz para concorrer nas novas eleições gerais do país. A decisão do opositor foi bem recebida pela parcela mais à direita da população, sobretudo após Camacho romper com o ex-presidente Carlos Mesa, que foi o principal adversário de Evo nas eleições de outubro. Em La Prensa.
Muito criticado diante das crises recentes na região, o secretário-geral da OEA, Luis Almagro, falou à BBC sobre a situação boliviana dos últimos meses. Para o líder da entidade, “o golpe ocorreu quando Evo quis se manter no poder”.
Os 14 anos de Evo mudaram a história da Bolívia. Para entendê-los, é preciso mergulhar em livros que explicam não só o líder, mas desde sua trajetória da liderança sindical ao declínio político. Em El País.
CHILE 🇨🇱
Em novo desdobramento dos protestos, a Câmara de Deputados aprovou, na quarta-feira (27), o corte dos salários parlamentares em 50%. O projeto, que tramitava há seis anos na casa, tornou-se uma prioridade do governo como forma de aplacar as pressões sociais. Após a câmara baixa aprovar a medida sem qualquer voto contrato, cabe ao Senado ratificar (ou não) a redução. Se confirmado, o salário bruto dos congressistas cairia para 4,67 milhão de pesos chilenos mensais (pouco mais de R$ 23 mil). Na Tele13.
Um relatório da Human Rights Watch, uma das principais organizações de defesa dos direitos humanos no mundo, denunciou os policiais chilenos por “graves violações” durante os protestos que ocorrem no país desde 18/10. O documento contabiliza pelo menos 1.015 feridos por agentes do Estado e aponta as lesões oculares propositais como um dos casos mais flagrantes de abuso do poder. O uso indevido de armas de fogo, os abusos sexuais e as acusações de tortura também aparecem no comprometedor relatório. Em El País.
Em resposta ao relatório, o senador conservador Andrés Allamand – que foi ministro de Defesa entre 2011 e 2012, no primeiro mandato de Piñera – foi à televisão afirmar que “sem violações aos direitos humanos, é impossível normalizar o país”. O presidente Sebastián Piñera, por sua vez, alega que o Chile não tem efetivo policial suficiente para lidar com a crise que não acaba e pediu ao Congresso que autorize, em regime de urgência, o uso das Forças Armadas para proteger infraestrutura pública.
O Campeonato Chileno de futebol foi oficialmente encerrado nesta sexta (29), mesmo com seis rodadas ainda por disputar, após várias tentativas frustradas de retomar as disputas desde que os protestos ganharam corpo e suspenderam o torneio em outubro. Sem alternativas, os clubes votaram por considerar definitiva a tabela de classificação do momento da interrupção. Durante a semana, explicamos as razões para a dificuldade do retorno do futebol. No Impedimento, as implicações do término prematuro da temporada.
COLÔMBIA 🇨🇴
Há um leque de fatores que leva os colombianos ao sétimo dia seguido de Paro Nacional. A morte do jovem Dilan Cruz, atingido por uma bomba de gás jogada por agentes do Estado, é a mais simbólica. O garoto rapidamente se tornou símbolo da luta estudantil, ganhando homenagens pelo país, também por ter a morte confirmada no exato dia em que se formaria no ensino médio. Tão ampla como as manifestações é a gama das organizações que compõem os manifestos. Em El País.
Dilan Cruz tornou-se a vítima que simboliza a repressão aos protestos na Colômbia, mas não foi o único a perder a vida em meio à turbulência. No último sábado (23), um soldado do Exército se suicidou após ser estigmatizado e perseguido por seus colegas depois de manifestar publicamente apoio aos protestos no país e denunciar o que via como “falências” dentro das Forças Armadas. Brandon Cely Páez, que vivia na região metropolitana de Bogotá, tinha 21 anos e cumpria o serviço militar obrigatório. Em El Espectador.
Un hilo:
COSTA RICA 🇨🇷
O país vive um crescimento vertiginoso nos casos de dengue: entre janeiro e metade de novembro de 2019, foram 8.179 pessoas infectadas, segundo divulgou o Ministério da Saúde da Costa Rica na quinta-feira (28). O número representa um aumento de quase 335% em relação ao mesmo período do ano passado, quando foram reportados 2.411 casos no país. Na Prensa Latina.
EL SALVADOR 🇸🇻
Demonstrando simpatia aos Estados Unidos desde que assumiu, o presidente salvadorenho adotou uma rara postura que desagradou Washington: em viagem oficial ao Japão, Nayib Bukele confirmou, na sexta (29), que também visitará a China, entre os dias 2/12 e 6/12, além de uma passagem final pelo Catar. Os EUA advertiram que, se Bukele firmar compromissos com Pequim, a Casa Branca “avaliará” quais programas de cooperação com El Salvador poderiam vir a ser afetados. Em ElSalvador.com.
EQUADOR 🇪🇨
Michelle Bachelet, ex-presidenta do Chile e hoje Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, declarou na sexta (29) que os distúrbios ocorridos no Equador em outubro “tiveram um alto custo humano”, reforçando os pedidos por investigação sobre o possível uso de força desproporcional contra os manifestantes que tomaram as ruas do país em outubro. A declaração veio após a divulgação do relatório da missão da ONU, que esteve em solo equatoriano entre 21/10 e 8/11 para investigar as consequências dos protestos. De acordo com a investigação, o país registrou 9 mortos, 1.507 feridos e 1.382 detidos. As manifestações ocorreram após o governo de Lenín Moreno decretar estado de exceção no país, temendo as reações ao anúncio do fim a um histórico subsídio aos combustíveis – apesar da violência, a pressão popular deu resultados e o subsídio acabou mantido.
GUATEMALA 🇬🇹
Um esquema de corrupção dentro do poder público guatemalteco, envolvendo compra de remédios, ligou o alerta da vigilância da ONU. Desde 2015, além de uma alta suspeita dos preços, o setor de seguridade social vinha concentrando 68% da compra de remédios no mesmo grupo de empresas. Por meio do golpe, nomes ligados às companhias recebiam quantia em troca de licitações. Em El País.
HAITI 🇭🇹
Charlot Jeudy, líder do Kouraj (“Coragem” em créole), organização mais importante do país em defesa dos direitos da população LGBTQ+, foi encontrado morto em sua casa na última segunda-feira (25). As razões da sua morte não foram esclarecidas e a polícia não respondeu aos pedidos por comentário feitos pela imprensa internacional. O Haiti proíbe o casamento homoafetivo e o estigma social permanece grande no país. Jeudy tinha 35 anos de idade e sofria perseguição: o Kouraj precisou mudar de sede três vezes nos últimos meses após ataques. A Embaixada da França e a dos EUA em Porto Príncipe solicitaram investigação sobre as circunstâncias da morte do ativista. Via AP.
Una palabra:
Guache – “senhor” na extinta língua chibcha, falada na região próxima a Bogotá, capital colombiana. Com a colonização espanhola, o termo ganhou a conotação pejorativa de “rude” ou “violento”.
HONDURAS 🇭🇳
Mais um jornalista foi morto no país, na última segunda-feira (25). José Arita estava saindo do Canal 12, onde trabalhava, quando foi alvejado por um grupo de quatro homens armados que o aguardavam no exterior do edifício. As razões para o crime ainda são desconhecidas, mas estariam relacionadas ao trabalho de Arita: segundo o Colégio de Jornalistas de Honduras (CPH), é o oitavo comunicador social assassinado no país este ano – desde 2001, o número chega a 84, e apenas sete dos homicídios foram solucionados pela polícia. Via AP.
MÉXICO 🇲🇽
Donald Trump estaria disposto a incluir os cartéis mexicanos na lista de organizações terroristas reconhecidas pela Casa Branca. As pressões se intensificaram nos últimos dias por pressão dos LeBarón, família mórmon vitimada por uma matança em 4/11. A entrada dos cartéis na lista é vista como um movimento diplomático delicado – mexicanos temem que seria um primeiro passo para legitimar uma intervenção militar estadunidense no país em nome do combate ao terrorismo. Em El País.
Todos os estabelecimentos comerciais da Cidade do México vão parar de oferecer sacolas plásticas para seus clientes a partir de 1/1/2020. A obrigatoriedade, que valia para supermercados, passou a incluir também centros comerciais e lojas de departamentos após um acordo conjunto. Estima-se que a capital mexicana, a segunda região metropolitana mais populosa da América Latina (atrás de São Paulo) com 21 milhões de habitantes, produza 128 toneladas de lixo plástico diariamente. No Excelsior.
Prestes a completar um ano no poder, o presidente López Obrador convocou a população para uma celebração na famosa e turística praça central, conhecida como El Zócalo. Em meio ao festejo, o Infobae trouxe uma retrospectiva do primeiro ciclo do partido Morena, listando o que foi ruim, o que foi bom e o que segue pendente.
NICARÁGUA 🇳🇮
Não é novidade que a Nicarágua sob o regime de Daniel Ortega não tolera defensores dos direitos humanos. Nem mesmo a marcha das “Mães de Abril”, composta por mulheres que perderam seus filhos durante a jornada de repressão promovida pelo governo em 2018. Detido de forma arbitrária, o grupo civil foi acusado de traficar armas ilegalmente, mas só carregava garrafas de água. No Nomada.
PANAMÁ 🇵🇦
O país apresentou, na quarta (27), uma série de medidas legais para combater a evasão fiscal e a lavagem de dinheiro, por ocasião do 10º Fórum Global da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). O Panamá tornou-se o “patinho feio” da evasão em 2016, após o estouro do escândalo dos Panama Papers, revelando como um escritório de advocacia panamenho abriu mais de 214 mil empresas offshore para clientes estrangeiros nas últimas cinco décadas, muitas delas utilizadas com fins ilegais. Em La Estrella de Panamá.
PARAGUAI 🇵🇾
O Supremo Tribunal de Justiça do Brasil (STJ) revogou na sexta (29) o mandado de prisão emitido em 19/11 contra Horacio Cartes, ex-presidente paraguaio que governou entre 2013 e 2018. O habeas corpus foi proferido sob o entendimento de não haver “razões que justifiquem” um pedido de prisão preventiva. Cartes é acusado de lavagem de dinheiro e investigado pela Operação Lava Jato, suspeito de ter ajudado o doleiro Darío Messer, preso em São Paulo, a fugir da Justiça. Via EFE.
O senador Paraguayo Cubas protagonizou cenas dantescas durante a semana. Dias depois de agredir policiais com cintadas e ser denunciado pelo ministério do Interior, “Payo” Cubas teve o mandato cassado após ser visto defendendo a morte de 100 mil brasileiros que moram no país. A Câmara votou a saída do político pouco depois de o vídeo viralizar. No ABC Color.
PERU 🇵🇪
César Villanueva, ex-primeiro-ministro peruano, foi detido acusado de tráfico de influência, em um desdobramento de investigação que envolve a Odebrecht. Villanueva fez parte do governo do presidente Martín Vizcarra entre abril de 2018 e março deste ano e integrava o Parlamento, dissolvido pelo mesmo Vizcarra em outubro. Em El Comercio.
Un dibujo:
PORTO RICO 🇵🇷
Passados mais de dois anos desde que a ilha foi devastada pelo furacão Maria, em setembro de 2017, o mais importante observatório espacial do Caribe ainda não voltou a operar. O Arecibo, maior radiotelescópio do mundo entre 1963 e 2016 (quando a China construiu um ainda maior), sofreu danos estruturais durante a intempérie, e os orçamentos apertados tornaram a reconstrução muito mais lenta do que os cientistas gostariam. A esperança: em outubro, a NASA concedeu uma bolsa de US$ 19 milhões à universidade que administra o observatório, com o objetivo de que ele volte a ser um dos “guardiães” da Terra, identificando asteroides em possível rota de colisão com o planeta. Via UPI.
REPÚBLICA DOMINICANA 🇩🇴
As relações comerciais dominicanas com a China se estreitam ano a ano. Em 2019, as exportações ao país asiático já superaram a marca de US$ 200 milhões, mais que o dobro do registrado há um ano. O número é suficiente para colocar Pequim no top-5 dos maiores importadores de produtos dominicanos, entre eles, o abacate, que acaba de entrar na lista de compras da China. No Diario Libre.
URUGUAI 🇺🇾
Mesmo distante do protagonismo político, o ex-presidente Pepe Mujica, que governou entre 2010 e 2015, vira protagonista em novas produções independentes. Depois de ver seus 12 anos de cárcere representados no drama Uma Noite de 12 Anos (2018) e agora no recente documentário El Pepe, una vida suprema, o ex-Tupamaro surge em nova obra do streaming, dessa vez ao lado do filósofo (de outros mil rótulos) Noam Chomsky. O longa nem saiu, mas já ganhou conta oficial no Instagram, além de uma fila de fãs ansiosos. No TV Show. Em El País.
Como bem diz a correspondente Sylvia Colombo, o Uruguai desperta curiosidade por ser diferente de seus vizinhos, em diversos pontos. Moderado, eclético, laico e discreto, o país pode – e deve – ser entendido por meio de cinco obras literárias. No blog da própria Sylvia, na Folha.
Liberais, sim. Amigos, talvez não. Confirmada a eleição de Luis Lacalle Pou, como contamos em detalhes no GIRO EXTRA de quinta (28), o Mercosul se volta à direita. Mas só na economia. Com promessa de manter os avanços civis feitos pelo Frente Ampla, Pou até pode se aproximar do governo brasileiro por razões comerciais, mas a relação deve parar por aí. De todo modo, Bolsonaro ligou para o eleito e prometeu ir à posse em março. Na BBC.
VENEZUELA 🇻🇪
O país lidera com sobras o ranking de nações latino-americanas mais endividadas com a China: são US$ 67,2 bilhões em empréstimos de Pequim a Caracas, um movimento que se intensifica em todo o continente – os chineses buscam ampliar sua influência política na região através das amarras econômicas, garantindo um bom fluxo de matérias-primas enquanto expandem mercados consumidores para seus próprios produtos. A lista dos mais endividados na região segue com Brasil (US$ 28,9 bi), Equador (US$ 18,4 bi) e Argentina (US$ 16,9 bi). Na BBC, as implicações desse crescente endividamento para os latinos.
Um novo relatório da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) diz que Brasil e Venezuela são os principais responsáveis pelo crescimento da pobreza na região. Em 2019, estima-se que a região chegue a 191 milhões de pobres e miseráveis, superando 2018 em 6 milhões. Segue a tônica da estagnação regional, que reserva um crescimento de 0,2% para o ano, segundo o FMI. N’O Globo.
A cada protesto que estoura no continente, a acusação se repete: venezuelanos infiltrados estariam mobilizando as massas para desestabilizar governos opostos a Nicolás Maduro. Eles se tornaram o bode expiatório da América, e vêm sendo expulsos às dezenas na esteira das manifestações sociais na Colômbia, Equador, Bolívia e Chile. As acusações também aumentam a xenofobia contra venezuelanos que emigraram em busca de uma vida melhor longe da crise bolivariana. Na BBC.
🇵🇪 Notas peruanas
O Peru passou por um 2019 muito intenso. A recente crise política entre o Presidente Martín Vizcarra e o Congresso fujimorista, que culminou na dissolução da Casa, alterou totalmente o panorama político. Pela primeira vez em quase uma década, o fujimorismo se encontra em uma posição política muito enfraquecida. Até há pouco, o debate no Peru tinha mudado do eixo horizontal da política econômica (direita – esquerda) para o eixo vertical dos direitos sociais (liberal – conservador), formando uma aliança incomum entre a centro-direita liberal e a esquerda progressista; as duas contra a direita conservadora. A derrota do Fujimorismo e o novo panorama das eleições antecipadas resultou em um retorno do debate político ao eixo econômico. Considerando o contexto regional – de insatisfação e frustração popular na ânsia por demandas de progresso social – a desigualdade econômica e a carência de mobilidade social, a esquerda peruana vê nessas eleições uma oportunidade única para introduzir a sua principal proposta histórica: a mudança da Constituição de 1993 (aprovada durante o governo do próprio ditador Alberto Fujimori) e o fim do modelo econômico liberal. A Constituição peruana regula um Estado reduzido, um banco central independente, e uma economia dirigida pelo livre comércio e o empreendedorismo privado, não o desenvolvimentismo ou protecionismo dirigido pelo Estado. Até hoje, a esquerda não conseguiu convencer o povo a adotar a necessidade de um experimento econômico radical. Os próximos meses dirão se o novo contexto regional mudará essa regra da política peruana. Ao mesmo tempo, é importante não perder de vista o fato que o fujimorismo ainda tem níveis de aceitação suficientes para conquistar um come-back, especialmente diante do sistema eleitoral peruano, que se baseia em listas partidárias e não em distritos individuais, que elegem um nome cada. O que a situação do Peru tem de diferente são as circunstâncias muito específicas da crise do governo Pedro Pablo Kuczynski (PPK), que criaram um potencial para uma aliança sui generis entre a centro-direita e a centro-esquerda, que poderia reordenar a política em torno de seus ideais compartilhados. Todavia, assim que o conservadorismo saiu do panorama, as velhas rivalidades resurgiram e destruíram qualquer possível sinergia no centro. Se isso não foi possível no Peru, com todas essas condições citadas, eu acredito que, lamentavelmente, nossa América do Sul deve continuar dividida em relação à economia e não unida a favor dos direitos humanos. Em tempos de Bolsonaros e Trumps, isso é uma perda incalculável. (por Alonso Gurmendi, desde Lima, especial para o Giro Latino)
⚽ Copa dos renegados
Após a definição da Libertadores, com a épica virada do Flamengo sobre o River Plate para conquistar o título, no último sábado (23), após um jejum de 38 anos, parecia que o calendário de torneios continentais das Américas estaria definitivamente encerrado. Afinal, o vencedor do Norte já era conhecido desde maio – quando o Monterrey, do México, venceu a Liga dos Campeões da Concacaf (a “Concachampions”) – e os dois grandes torneios secundários também já estavam definidos: a Copa Sul-Americana terminou no início de novembro, com o título do equatoriano Independiente del Valle, e os membros ricos da Concacaf iniciaram seu experimento elitista entre as duas ligas mais poderosas – a mexicana (Liga MX) e a estadunidense (MLS) – com a chamada Leagues Cup, vencida em setembro pelo Cruz Azul. Mas ainda havia, sim, uma outra competição continental de segunda (terceira?) linha, reunindo clubes que no passado já venceram o principal título das Américas do Norte, Central e Caribe, mas pouco a pouco viram a distância financeira se tornar intransponível (a Concachampions é vencida há 14 temporadas consecutivas, desde 2006, por equipes do México): a Concacaf League. Ela chegou ao fim na virada brasileira de terça para quarta (27), com título do Saprissa, da Costa Rica, sobre o hondurenho Motagua. Implacável hierarquia da bola: também ali já começa a se formar um domínio muito claro dos países com o futebol mais rico da América Central – foi a terceira edição do torneio, e em todas a final envolveu equipes de Costa Rica e Honduras. O Saprissa se juntou na lista de vencedores ao compatriota Herediano, campeão de 2018, e ao Olimpia de Tegucigalpa, o primeiro campeão, dois anos atrás.
Campeonato encurtado pelas ruas: o Campeonato Chileno foi encerrado prematuramente na sexta (29), após reunião de dirigentes, que não encontraram soluções para jogar futebol em meio à crise. Leia na seção sobre o Chile, mais acima nessa newsletter.
O Giro Latino é uma newsletter produzida por Girão da América, Impedimento e Fronteira.
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