Copa do Mundo ameniza dores e faz Argentina sonhar
Em catarse coletiva, argentinos ‘encarnam’ Maradona para driblar baixo astral da penúria econômica e gritam, beijam e se unem em coro pelo mais-que-sonhado tri no Catar
– O que está lendo?
– Mario Benedetti.
– E por quê?
– Para esquecer o futebol.
– Não deves esquecer.
– É que, se penso todo o dia na mesma coisa, fico nervoso.
– Tens que estar nervoso.
– Vou acabar doente.
– Tens que ficar doente.
Diálogo de Jorge Valdano, cronista e ex-jogador da Seleção Argentina, campeão do mundo em 1986, com um treinador que encontrou durante a carreira.
Ao redor do obelisco, no centro nevrálgico de Buenos Aires, nenhum carro circulou ao final da terça-feira (13): milhares de torcedores argentinos, em júbilo, tomaram as ruas centrais da capital para celebrar a vitória contra a Croácia e a passagem à sexta final de Copa do Mundo que o país vai ter a chance de disputar. No bairro de Liniers, um grupo entusiasmado saudava uma simpática senhora com o canto ritmado de abuela la la la la, no mesmo compasso de “Go West”, do Village People. Outra mulher idosa foi exaltada em Rosario, a terra natal de Lionel Messi, também ouvindo uma serenata por ter sido identificada – sem qualquer comprovação, apenas pelo sentimento da multidão – como a própria avó do jogador (não era; ambas já faleceram). Na mesma cidade santafesina, durante os festejos, um homem escalou o cavalo de um monumento para soltar seu grito o mais alto que pôde, enquanto horas antes, em Buenos Aires, houve gente sequestrando ônibus para dirigi-lo até a própria casa e não se atrasar para a partida. Subir em placas, semáforos ou o que vier pela frente se tornou o segundo esporte mais popular do país após o futebol nos últimos dias, e em outro registro que correu o mundo, um casal – que, segundo a própria moça contou nas redes, nem se conhecia antes do momento agora eterno – compartilhou um beijo após os 3 a 0 diante dos croatas.
A Argentina vive dias febris, com uma doença que também é remédio para as dores cotidianas, enferma de futebol enquanto o resto parece desmoronar. A Argentina conclui 2022 com a segunda maior inflação da região, que, se não superar os 100% no ano, só o fará graças a um controverso congelamento de preços; com uma crise judicial e política que abala os planos de Cristina Kirchner para o futuro próximo (e 2023 é ano de eleição presidencial); e com uma miríade de problemas muito sérios que, ao menos por uns dias, já no importan un carajo porque o futebol voltou a unir o país, devolver o sorriso e fazer com que toda a gente sonhe por alguns momentos. Neste domingo (18), ao meio-dia de Brasília e de Buenos Aires, seis da tarde em Doha, no Catar, o fogo da parrilla vai arder mais forte, o fundo da garrafa pet cortada ao meio terá um dedo a mais de fernet na mistura com coca, o McDonald’s vizinho ao obelisco vai se preparar para ter mais umas vidraças quebradas, um campeão mundial de 1978 vai estar em casa vendo o jogo ao lado do filho após se recusar a viajar para assistir à decisão in loco – e não haverá um único argentino indiferente quando o país começar a disputar a taça contra a França, em um jogo no qual ambos buscam seu terceiro título mundial.
Os argentinos sempre mantêm pulsante a obsessão pela Copa, mas em 2022 parecem querer – e confiar – um pouco mais, como bem contou o tradicionalíssimo e (por que não conspiratório) comercial da Quilmes lançado às vésperas do torneio. Porque agora é um time que comprovou conseguir ser campeão, o que por quase três décadas não ocorreu – e dessa vez, com direito a um “novo Maracanazo”. Porque Maradona estaria olhando e garantindo tudo de cima. Porque é a provável última chance de Lionel Messi, que faz um torneio verdadeiramente maradoniano, abandonando a discrição na fala, colocando o time nas costas e vendo seus companheiros jogarem por ele como se realmente não fosse haver outra oportunidade de lhe consagrar com a única conquista que ainda escapa ao homem que já ganhou todo o resto que podia. Algumas manchetes até chegaram a extrapolar sua declaração após a semifinal, dando a entender que ele havia confirmado que o jogo de domingo seria sua despedida da Seleção Argentina em Copas, embora a frase do gênio tivesse mais o sentido de que seria muito difícil – não impossível – chegar em condições de disputar o próximo Mundial em alto nível, quando estará completando 39 anos. “Son muchos años para el siguiente y no creo que me dé”, afinal.
Certo é que, a despeito da brutal crise econômica dos últimos tempos, a Argentina foi um dos países que mais procurou ingressos para a Copa de 2022 nos meses prévios à competição, tamanha a expectativa de que este año sí. Não os outros, nem mesmo em 2014 quando se esteve tão perto, em outra final, aquela perdida para a Alemanha no Rio de Janeiro, mas agora, sim, agora não pode escapar. Passado o choque da estreia, quando a Arábia Saudita superou os platinos de virada em uma das maiores surpresas da história das Copas, a Argentina voltou a ser o que se esperava, não parou mais de vencer, e a chegada à final fez centenas de torcedores buscarem passagens de última hora para o Catar, esgotando os voos existentes e fazendo a Aerolíneas Argentinas inclusive disponibilizar aviões extras, com bilhetes que chegam a custar 1,7 milhão de pesos (quase R$ 30 mil no câmbio paralelo). Não está claro como esses fanáticos de última hora farão para entrar no país da Copa, ou se de fato serão aceitos, já que o Catar vinha operando com um visto especial para turistas durante o período da competição, que incluía a comprovação de que a pessoa já chegava ao país com ingresso comprado – o que, em cima da hora e numa final de Copa do Mundo, nem todos vão ter.
Outro problema para resolver depois, certamente pensam os viajeros, em meio à deliciosa febre que não se restringe às fronteiras da República Argentina. A Copa que restaura o orgulho de um país ferido – como não foi possível fazer, por exemplo, em 2002, quando uma equipe igualmente badalada caiu ainda na primeira fase e não amenizou outra crise tremenda que o país então atravessava – também é um poderoso instrumento de soft power. Argentina e Brasil são talvez os dois maiores fenômenos desta parte do mundo quando se trata de conquistar torcidas em outras nações do Sul Global, especialmente aquelas não tão boas no futebol. No caso argentino, o que fez sucesso nas redes foi uma improvável parceria com Bangladesh, de onde surgiram vários vídeos virais de celebrações massivas pelo sucesso de Messi e companhia, o que rendeu um movimento (que começou como piada, mas depois ganhou contornos reais) de argentinos começando a torcer pela equipe bengali de críquete, o esporte favorito de lá, e culminou com o governo de Alberto Fernández confirmando a reabertura de uma embaixada em Daca. Fechada desde 1978, justamente o ano em que os hermanos debutaram como campeões do mundo, a representação diplomática na capital de Bangladesh agora buscará fortalecer os laços entre os dois países e estabelecer parcerias comerciais – apesar do bom timing do anúncio, a decisão tinha sido tomada antes, motivada pelo recorde de exportações argentinas para lá, beirando os US$ 900 milhões em 2021.
Uma conquista albiceleste também marcaria a recuperação da hegemonia para o futebol sul-americano, sempre o único capaz de realmente competir com os europeus no cenário mundial, mas abalado desde a virada do século: não apenas os clubes daqui começaram a perder suas estrelas cada vez mais jovens para o rico mercado do outro lado do oceano, como as seleções locais deixaram de se alternar com as do Velho Mundo nas conquistas mundiais. Após o título do Brasil em 2002, já são quatro Copas consecutivas de vitórias europeias – a pior sequência da América do Sul em todos os tempos, que também iguala o maior período de seca em número de anos, os 20 entre os dois títulos do Uruguai em 1930 e 1950, com o agravante de que naquela época duas Copas simplesmente nem aconteceram no meio do caminho, impedidas pela Segunda Guerra e suas consequências imediatas.
Se os franceses buscam repetir a conquista de 2018, em uma rara sucessão imediata de taças que só a Itália (em 1934 e 1938) e o Brasil (em 1958 e 1962) conseguiram fazer há muitas décadas, para a Argentina se trata da tentativa de encerrar a travessia de um deserto geracional: já vão 36 anos desde que Diego Armando Maradona conduziu a camisa celeste e branca para o topo do planeta no México, na mesma seleção do Jorge Valdano que lia o uruguaio Benedetti para não enlouquecer com o futebol, enquanto ouvia que, às vezes, talvez seja exatamente essa loucura que um sujeito e um país precisam. Esta é a busca pela taça, aliás, na primeira Copa do Mundo sem Maradona, morto precocemente aos 60 anos no final de 2020, em uma tristeza nacional que também virou mística: para os mais fiéis, o homem a quem tantos chamavam de D10s passou a abençoar o time desde que se foi, e nos últimos tempos a Argentina celebrou a Copa América, em 2021, derrotando o Brasil em pleno Maracanã para erguer sua primeira taça de qualquer tipo em 28 anos, e também a tal Finalíssima, em junho deste ano, massacrando por 3 a 0 a Itália campeã europeia num duelo de reis continentais.
Agora, a última equipe latino-americana ainda em pé no Catar parte em busca da coroa maior. Amanhã, um grupo de 26 homens saídos de Santa Fe, Buenos Aires, Córdoba, Neuquén, La Pampa, Entre Ríos e Tucumán, de capitais e cidadezinhas, serão milhões em tantos outros lugares, nas províncias argentinas e fora do país, carregando consigo todos os sonhos do mundo. Ou, pelo menos, os sonhos desta parte do mundo.
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🇵🇪 Interior peruano tem protestos e mortes após prisão de Castillo – Pelo menos 22 pessoas foram mortas e outras centenas ficaram feridas em meio à repressão executada por agentes de segurança contra os protestos em várias cidades do país, especialmente no sul, em regiões como Apurímac e Ayacucho. Dois ministros do governo recém-instalado já renunciaram em protesto contra a violência. Em sua maioria, manifestantes favoráveis ao ex-presidente Pedro Castillo pedem o fim do governo de Dina Boluarte, o fechamento do Congresso, a instauração de uma assembleia constituinte e a antecipação das eleições (leia mais no último GIRO) – acuada, a própria presidenta, que teria mandato até o meio de 2026, falou em antecipar o pleito para abril de 2024, e já cogitou realizar o processo antes mesmo disso, no fim de 2023. Na sexta (16), porém, o Congresso rejeitou a proposta de antecipação das eleições, o que deve render novos capítulos à crise nos próximos dias. O ex-presidente Ollanta Humala (2011-2016), o último a cumprir um mandato cheio no país, foi às redes se juntar às vozes cobrando a renúncia de Boluarte. Diante de casos de bloqueios de estradas, invasões a aeroportos em cidades como Arequipa e Cusco e episódios de depredação, o novo governo decidiu colocar o Exército e a polícia nas ruas no início da semana, tudo sob decreto de estado de emergência e toque de recolher (ignorado pelos manifestantes). Seguindo as multidões enfurecidas e várias organizações sociais, o governo ayacucheño culpou Boluarte e seus ministros pelo banho de sangue, exigindo a renúncia de toda a alta cúpula em Lima. Defensores dos direitos humanos também pedem o fim da intervenção de militares e cobram justiça. Enquanto isso, fervilhando ainda mais o caldo, na quinta (15), a Justiça do Peru determinou a prorrogação por mais 18 meses da prisão preventiva imposta a Pedro Castillo; ele ainda pode ser processado por crimes de rebelião e atentado contra as instituições. O ex-presidente – que já investiu numa defesa alegando ter sido dopado antes do pronunciamento golpista que culminou com sua própria queda no último dia 7 – se diz vítima de perseguição e enviou um pedido de ajuda à Comissão Interamericana dos Direitos Humanos (CIDH). Já Boluarte, pressionada por todos os lados, vem tentando demonstrar que tem apoio externo: na noite de sexta, o perfil oficial da Presidência do Peru revelou que ela conversou com o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, que teria dado o respaldo de Washington ao seu governo, e recebeu uma mensagem do papa Francisco, que estaria orando pela “paz estável e duradoura” no país. Na RPP.
🇨🇱 Chile define como será a nova Constituinte – Enfim, acordo: os presidentes das duas Casas do Congresso chileno apresentaram, na segunda (12), os termos do compromisso para a nova tentativa de reescrever a Constituição do país – e venceu a hipótese de uma formação mista, diferentemente da anterior, que havia sido inteiramente eleita para redigir a Carta Magna. Agora, a nova Constituinte vai contar com uma “comissão de especialistas” de 24 membros, escolhida pela Câmara e pelo Senado, à qual vai se somar posteriormente o chamado Conselho Constitucional – este, sim, eleito por voto popular (e com paridade de gênero), com 50 membros. Também vai funcionar em paralelo uma espécie de “conselho técnico”, com 14 juristas escolhidos pelo Congresso para garantir que o texto tenha coesão interna e não atropele nenhuma outra norma legal. O corpo de especialistas já deve começar a atuar em janeiro, enquanto se espera que o Conselho Constitucional seja eleito em abril. Ao final do processo, a novíssima Constituição deve outra vez ser submetida a plebiscito com participação obrigatória, em novembro ou dezembro de 2023. A última tentativa de mudar a Carta Magna fracassou em setembro, quando o texto acabou rejeitado por quase 62% dos eleitores chilenos nas urnas, mas já havia acordo entre os partidos do país para que o processo fosse reiniciado. Em El Mostrador.
🇬🇹 Mistério sobre saúde presidencial vira briga política – O estado de saúde do presidente Alejandro Giammattei vem sendo alvo de cada vez mais especulações na Guatemala, especialmente depois que o mandatário deixou de cumprir agenda fora do Palácio de Governo. Desde o final de novembro, a imprensa opositora a Giammattei começou a divulgar informações sobre a hospitalização – até ali mantida em segredo – do presidente, depois atribuída oficialmente a uma anemia causada por uma hemorragia gastrointestinal que exigiu transfusão de sangue. O presidente passou pelo menos três dias internado, e o portal Con Criterio, que divulgou a informação com exclusividade em 29/11, agora vem afirmando que Giammattei poderia estar passando por um tratamento oncológico, citando fontes ligadas a um centro de radioterapia na capital guatemalteca. Em meio às especulações, o deputado oposicionista Aldo Dávila pediu, na segunda-feira (12), que fosse criada uma “comissão interpartidária” para verificar a situação da saúde do presidente, visto que “a população se encontra na incerteza” e “suas aparições públicas não dão clareza sobre a situação”. Em La Hora.
🇵🇷 Decisão histórica fortalece sonho por virar o 51º estado dos EUA – É improvável que se veja uma consequência concreta no curto prazo, mas o velho sonho porto-riquenho de se juntar oficialmente como o 51º estado dos EUA deu mais um passo histórico na quinta-feira (15): por 233 votos a 191, o que incluiu um sempre difícil apoio republicano à iniciativa, a Câmara aprovou um projeto que busca criar – pela primeira vez com apoio de Washington – um referendo vinculante sobre o status da ilha. A dificuldade, agora, é superar a barreira seguinte, já que uma aprovação no Senado exigiria 60 votos favoráveis que hoje parecem não existir, mas analistas apontam que o passo dado nessa semana fortalece a ideia de que a situação “colonial” de Porto Rico é cada vez menos sustentável. Diferentes votações já foram realizadas na ilha para definir seu status – com opções que incluem a manutenção do não-lugar atual, como “estado livre associado” aos EUA, a integração formal à União e a independência total –, geralmente com a opção por se juntar de vez aos Estados Unidos saindo vencedora, inclusive no plebiscito mais recente, em 2020. Até aqui, porém, nenhum voto tinha caráter vinculante, e a única maneira de oficializar a consulta pública é com a anuência das duas partes do Congresso em Washington. No NY Times.
🇨🇷 Pedidos de asilo crescem 75 vezes em uma década e Costa Rica endurece regras – O governo de Rodrigo Chaves vai dificultar o processo para solicitar asilo na Costa Rica, após uma série de mudanças que passaram a valer neste mês. Segundo a administração costa-riquenha, o programa de asilo, que deveria ser utilizado apenas por pessoas sob risco de perseguição ou morte em seus países de origem, está sendo abusado por “migrantes econômicos”. “Cerca de 90% ou mais dos solicitantes não se qualificam”, disse Chaves, citando informações da autoridade migratória do país, que gasta US$ 300 milhões ao ano para lidar com os pedidos. De fato, as solicitações explodiram na última década: de 900 pedidos em 2012 para mais de 67 mil este ano, em uma contagem que só vai até setembro. A Costa Rica se tornou o destino preferido de pessoas vindas da vizinha Nicarágua, especialmente após o recrudescimento do regime orteguista de 2018 para cá, e também atrai migrantes de Cuba e Venezuela. Para quem já está na fila e não corria risco em casa, o governo vai propor um visto de trabalho com validade de dois anos em troca do fim do processo de asilo. Via AP.
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Em 2014, Messi se juntou à campanha das Avós da Praça de Maio.
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REGIÃO 🌎
Entre promessas de cooperação e falas duras, aconteceu em Havana, na quarta-feira (14), a cúpula da Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América (ALBA), criada em 2004 por Hugo Chávez, então presidente da Venezuela, e Fidel Castro, líder máximo da Revolução Cubana. Teve de tudo: desde a insperada aparição de um cada vez mais recluso Daniel Ortega – que negou os abusos cometidos na Nicarágua e pediu “força” contra o “imperialismo agressor” – até críticas do venezuelano Nicolás Maduro direcionadas a líderes que denunciam seu colega nicaraguense: “uma esquerda covarde”, disse o chavista, sem citar o mandatário chileno Gabriel Boric, conhecido por ser um dos líderes desse lado do espectro a falar abertamente contra o autoritarismo de Ortega. O evento também contou com a presença do presidente Luis Arce, da Bolívia, talvez o mais moderado entre os chefes de Estado presentes. Ao lado do anfitrião Miguel Díaz-Canel, Arce mostou apoio à vice-presidenta da Argentina Cristina Kirchner (recentemente condenada por corrupção) e ao ex-presidente peruano Pedro Castillo, destituído e preso na última semana. Segundo os líderes na ALBA, ambos são vítimas de “perseguição” por serem de esquerda. Via AFP.
ARGENTINA 🇦🇷
Argentina, 1985, filme lançado este ano pela Amazon Prime Video sobre o histórico julgamento dos militares à frente da última ditadura do país (1976-1983), foi indicado na segunda-feira (12) ao Globo de Ouro de melhor filme em língua não-inglesa – categoria antes conhecida como “melhor filme estrangeiro”. A película estrelada por Ricardo Darín concorre com outras quatro obras internacionais, incluindo a megaprodução alemã Nada de novo no front, da Netflix, inspirada no famoso livro de Erich Maria Remarque sobre a Primeira Guerra Mundial. Embora com um eleitorado distinto, o Globo de Ouro é considerado um bom indício do que pode ocorrer no prestigiado Oscar, que divulga sua lista de indicados no final de janeiro. Via Télam.
BOLÍVIA 🇧🇴
Não é toda hora que uma oposição de direita exige a cabeça de um comandante do Exército na América Latina, mas aconteceu nesta semana na Bolívia: a bancada do Creemos – a coalizão fundada pelo ultraconservador Luis Fernando Camacho, figura do golpe de 2019 e atual governador de Santa Cruz – enviou uma carta ao presidente Luis Arce cobrando a destituição do general Juan José Zúñiga, que lidera a força militar do país. O pedido alega que o Zúñiga teria descumprido a Constituição e a Lei Orgânica das Forças Armadas ao “se inclinar” a favor do partido do governo. Isso porque, na segunda (12), em um discurso celebrando o aniversário do Exército, o general fez referência aos recentes protestos que paralisaram a economia cruceña por mais de um mês, atribuindo-os a uma “oligarquia” que atenta “contra a unidade da Pátria”. “Nosso território foi o eterno campo de batalha dos grupos oligárquicos que buscam o controle político e de nossos recursos naturais, sobrepondo sempre seus interesses de classe”, afirmou o militar, garantindo que combateria as “castas” que desestabilizam o país. Até o fechamento desta edição, o governo não havia respondido ao pedido da oposição. No Página Siete.
COLÔMBIA 🇨🇴
Respaldado pelas duas Casas legislativas, foi aprovado na segunda (12) o projeto que cria o chamado Ministério da Igualdade e Equidade, com foco em agir contra todos os tipos de desigualdade – sejam elas sociais, econômicas ou políticas. A nova pasta ficará sob a batuta da vice-presidenta Francia Márquez, cuja carreira política tem o ativismo social como um elemento indissociável. Ao celebrar a criação do Ministério, Márquez disse que “se avançarmos juntos como sociedade, daremos passos significativos para fazer da Colômbia uma potência da vida”. Entre as possíveis primeiras medidas da nova pasta, destacam-se projetos de renda mínima para as mães chefes de família e garantias de igualdade salarial entre gêneros. No UOL.
Dale un vistazo:
“Tive uns anos de espanhol formal na escola, a partir daquele ano, espanhol da Espanha, o que achei muito estranho, os ll e y com outros sons. Se quero me sentir em casa, preciso que lluvia soe quase como chuva, aquelas que espero que aliviem o calor no verão. Lá e aqui.
Sempre tive no celular a previsão daqui ao lado para saber se essas chuvas vêm, quando e como. Se romperão a água pairando no ar com gotas mais rápidas e grossas, como aquele gol de contra-ataque de Julián Álvarez. Não acho estranho que por questões de destino, trabalhe em um lugar em que sintonizar o rádio significa muitas vezes tropeçar nesse outro idioma, o que chamam de rioplatense. Por vários motivos, ser essa criatura meio uma coisa meio outra, um pé lá, outro cá, meio cão, meio peixe, me convém; estar sempre à espreita do outro, que são mais de um, sempre, e não necessariamente estrangeiro. Pode ser uma casa de religião ou um bar de esquina no bairro em que cresci em Porto Alegre, e que não era território de gente como eu até pouquíssimo tempo atrás. O bairro ainda sobrevive em poucas casas, de madeira, que hoje fotografo, para mantê-lo ali.
Enxergar o outro, el otro, é se ver, reconhecer nossas próprias estranhezas, nos deslocarmos, até enxergar as coisas mais difíceis de perceber em nós mesmos. Heródoto e os Citas.”
Clique aqui para ler o restante de “Lluvias de verão”, texto de Renata Dal Sasso que reflete sobre a iminente final da Copa do Mundo, a partir de uma perspectiva brasileira (dentre tantas possíveis).
CUBA 🇨🇺
Aquele morde e assopra sem fim: sem encerrar os bloqueios econômicos, mas também sem a mesma hostilidade de anos passados, os EUA seguem dando pequenos passos a favor da ilha. Na última semana, pelo menos três parlamentares democratas desembarcaram em Havana para um encontro com o governo do presidente Miguel Díaz-Canel. Além do mandatário, participaram da reunião lideranças legislativas da ilha e membros da chancelaria cubana. Ainda que o tema do encontro não tenha sido detalhado, Díaz-Canel compartilhou uma foto dizendo que a conversa contou com a abordagem de “nossas diferenças e temas de interesse comum”. E completou: “afirmamos nossa disposição de melhorar as relações bilaterais”. A visita da delegação ianque se soma a uma porção de outros pequenos encontros recentes entre representantes dos dois países – o que, no entanto, não muda a relação de sufocamento econômico. Via AP.
EL SALVADOR 🇸🇻
“Votaremos [a extensão do regime de exceção] quantas vezes for necessário”, disse na quarta (14) o presidente do Legislativo, Ernesto Castro, após a Casa de maioria governista aprovar a nona prorrogação do polêmico dispositivo que vem ditando a vida de El Salvador e fazendo surgir um sem-número de denúncias de violações contra os direitos humanos (leia um resumo da crise aqui). Além de mais uma vez prolongar a restrição de diversas garantias constitucionais, a medida que avançou essa semana inclui punições a novos delitos, incluindo sanções a familiares que acobertam casos de extorsão. Tudo envolvendo a crise de segurança pública salvadorenha é registrado aos vários dígitos: são quase 60 mil pessoas presas desde março (muitas delas sem julgamento ou mesmo qualquer envolvimento com as gangues miradas pelo governo) e mais de 4 mil denúncias de abusos. Via AP e teleSUR.
EQUADOR 🇪🇨
Após vários meses de conversas, um desfecho a caminho: o presidente Guillermo Lasso disse, na quarta-feira (14), que o país está prestes a fechar um acordo de livre-comércio com a China, sua principal parceira de negócios, o que deve aumentar o volume de exportações equatorianas ao gigante asiático e fomentar a indústria local. Menina dos olhos de Lasso e sua política de abertura, o acordo está “praticamente fechado”, disse o mandatário, gabando-se de “uma negociação altamente eficiente em menos de 10 meses”. Segundo estimativas, a tratativa pode injetar US$ 1 bilhão ao setor exportador do país. Via Reuters.
Uma chacina que deixou pelo menos cinco pessoas mortas na quarta (14) em Orito, na fronteira entre o Equador e a Colômbia, ligou a luz de alerta de autoridades nos dois lados da divisa. Segundo agentes de segurança, a matança indiscriminada teria sido obra de um grupo de pistoleiros que atua em ambos territórios – o bando seria uma das várias células armadas que surgiram de forma residual após o desmantelamento das FARC em 2016, um problema que levou violência a diversas regiões da América do Sul. Pelas redes sociais, os respectivos presidentes Guillermo Lasso e Gustavo Petro trocaram menções sob promessas de realizar “ações conjuntas” para enfrentar a violência na fronteira. Via AFP.
HAITI 🇭🇹
Vivendo novo surto de cólera, após ser devastado pela doença ao longo da década passada, o Haiti vem recebendo um alívio nos últimos dias: com apoio da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), cerca de 1,17 milhão de doses da vacina oral contra a doença começaram a ser distribuídas para a população local. Ao todo, já foram confirmados mais de 14 mil casos e ao menos 280 mortes desde a nova crise sanitária. O Haiti espera receber outro meio milhão de doses nas próximas semanas, e agora luta contra as próprias dificuldades internas – como o controle violento de gangues sobre amplas áreas das suas principais cidades – para conseguir distribuir o imunizante de forma eficiente. No site da ONU.
Un hilo:
Vídeos da loucura que tomou conta da Argentina nos últimos dias.
HONDURAS 🇭🇳
Passa a régua: após alguns meses de consultas e negociações, o governo hondurenho e a ONU assinaram, na quinta (15), um memorando para confirmar a instalação da Comissão Internacional Contra a Corrupção e a Impunidade no país (Cicih), que terá atuação nas entranhas do Ministério Público. O documento recebeu as assinaturas do chanceler Eduardo Enrique Reina e do secretário-geral adjunto da ONU, Miroslav Jenča. A presidenta Xiomara Castro e o secretário-geral da entidade multilateral, António Guterres, participaram como testemunhas. Pelas redes sociais, Castro celebrou o acordo e disse que o país terá “especialistas internacionais” à frente de investigações contra redes de corrupção “de alto impacto e que saquearam o país”. A mandatária, que exalta o fato da medida ser uma promessa de campanha, exortou a Cicih a fazer um trabalho “justo e independente”. É a segunda missão dessa natureza a atuar no sistema hondurenho neste século. Via AP.
MÉXICO 🇲🇽
Se o “plano A” foi rejeitado sem demoras pelo Congresso no início do mês, a carta na manga do presidente Andrés Manuel López Obrador para promover uma reforma eleitoral segue adiante: após a vitória na Câmara na semana passada, nesta quinta (15) foi a vez de o Senado dar luz verde ao projeto de lei por meio do qual o governo busca reduzir o orçamento e a estrutura do Instituto Nacional Eleitoral (INE), o TSE mexicano. Ainda que alguns membros da oposição sigam torcendo o nariz para a medida – alegando que as mudanças poderiam afetar o caráter independente do órgão, no limite comprometendo processos eleitorais – outros parlamentares, antes desconfiados, acreditam que o “plano B” seja menos inflexível. Entre outros elementos, a redução de cargos do INE prevista pelo projeto de lei permitiria um alívio de US$ 150 milhões em despesas públicas, esse um dos pontos mais desejados pelo governo. Por sua vez, o INE alerta que não foi consultado e aponta riscos. Na Folha.
NICARÁGUA 🇳🇮
O alto comissário da ONU para os Direitos Humanos, Volker Türk, denunciou na quinta (15) o que chamou de “esforço sistemático” do governo de Daniel Ortega em reprimir membros da dissidência política, um dos temas que têm chamado a atenção do mundo nos últimos meses diante de uma escalada de arbitrariedades. Türk mencionou o número crescente de prisões de opositores, o fechamento massivo de ONGs e organizações políticas, além da perseguição e censura a canais da imprensa – 26 meios de comunicação nacionais e três internacionais foram fechados a mando do orteguismo, lembrou o representante. A autoridade também cobrou Manágua pela libertação dos presos políticos, um grupo que, segundo o alto comissário, “passou de 195 em setembro para 225 no início deste mês [de dezembro]”. No site da ONU.
PANAMÁ 🇵🇦
Sem acordo com a companhia canadense First Quantum Mineral (responsável por controlar uma das maiores minas de cobre da região), o governo pediu na quinta (15) que as operações de mineração fossem imediatamente interrompidas, levando a uma queda brusca nas ações da empresa e aumentando a tensão entre as partes. O impasse aumentou no dia anterior, data limite estabelecida pelo governo panamenho para que a firma canadense assinasse um novo contrato – que já havia sido sinalizado em janeiro – prevendo um pagamento anual de US$ 375 milhões aos cofres públicos do país do istmo pela exploração do minério. O aumento dos royalties é parte de uma promessa do atual presidente Laurentino Cortizo, no cargo desde 2019. Segundo autoridades do governo envolvidas na negociação, a empresa estrangeira teria mudado os termos de última hora, oferecendo uma proposta que mudaria “fundamentalmente” os termos econômicos. A empresa canadense agora diz que está procurando “todas as vias legais disponíveis” para retomar a operação, que envolve 40 mil empregados e corresponde a 3% do PIB panamenho. Via Reuters.
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PARAGUAI 🇵🇾
Fornecedores de couro das montadoras Jaguar Land Rover e BMW podem ter ligação com o desmatamento ilegal em uma área do Paraguai habitada por um dos povos indígenas isolados mais ameaçados do mundo. A denúncia foi feita na terça-feira (13) pela ONG Survival International, em documento enviado à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Italiano (OCDE). Conforme a entidade, duas empresas italianas são responsáveis pela compra do couro vindo por fazendas que ocupariam ilegalmente a terra do povo Ayoreo, etnia que vive entre Paraguai e Bolívia e conta com cerca de 5 mil pessoas atualmente – parte deles, ainda em isolamento. “O governo paraguaio entregou a maior parte do território ancestral dos Ayoreo para empresas do agronegócio que estão desmatando ferozmente a floresta: primeiro eles cortam as madeiras nobres, depois ateiam fogo, e finalmente introduzem o gado na terra desmatada. Os Ayoreo estão testemunhando a destruição de seus meios de subsistência, de sua saúde física e mental e de suas vidas”, comentou Teresa Mayo, coordenadora da campanha pela proteção das terras junto à ONG. No site da Survival.
PERU 🇵🇪
Enquanto todos olhavam para o outro lado, mais preocupados com o destino da prisão preventiva de Pedro Castillo e os pedidos e renúncia de Dina Boluarte, outro ex-presidente acabou ressurgindo nas manchetes nas últimas horas da sexta-feira (16): a “Lava Jato peruana” pediu 15 anos de prisão para Martín Vizcarra, que governou o país entre 2018 e 2020, por supostamente receber propina antes do período em que ocupou a Presidência. O pedido do Ministério Público se baseia em denúncias relativas à época em que Vizcarra foi o governador regional de Moquegua (2011-2014), quando teria embolsado valores para garantir que empresas vencessem licitações para as obras contratadas pelo Estado. Como presidente, Vizcarra foi bem-sucedido em dissolver o Congresso em 2019 (o que Castillo, agora, não conseguiu fazer), mas no ano seguinte acabou derrubado pela nova Legislatura eleita na votação que ele próprio precisou convocar após fechar a Casa. À época se vendendo como um paladino anticorrupção em um país desiludido com seus políticos, teve sua imagem abalada pelas denúncias que vieram à tona na sequência. Na RPP.
REPÚBLICA DOMINICANA 🇩🇴
País do beisebol, a República Dominicana nunca jogou nem tem qualquer expectativa de disputar uma Copa do Mundo de futebol tão cedo – mas o torneio do Catar fez o país ganhar manchetes de maneira inusitada nos últimos dias, graças ao trabalho de um cabeleireiro que desenhou o rosto de Lionel Messi na nuca de um cliente. O vídeo, que voltou a viralizar nesta semana, na verdade já circula desde o ano passado, e é obra do venezuelano Antonio Ahumada, radicado em solo dominicano desde 2014. Na época, Ahumada escreveu ser “um privilégio” ver o argentino jogar bola.
URUGUAI 🇺🇾
Se sair do papel, o Uruguai contará nos próximos anos com o maior prédio da América Latina: na quarta-feira (14), o governo do departamento de Maldonado aprovou o projeto para a construção de um arranha-céu de 320 metros de altura na turística cidade litorânea de Punta del Este, onde antes ficava um hotel. O projeto, por enquanto chamado de Torre Cipriani por conta do grupo que o propôs, inclui um novo hotel, setores residenciais e um cassino. A oposição de esquerda no governo local se recusou a votar a proposta, considerando-a um “disparate” do ponto de vista urbanístico, e duvidando das garantias da construtora, que promete entregar a obra em 33 meses. Se for concluído, o prédio superará a Gran Torre Santiago, no Chile, hoje a maior da América do Sul, com 300 metros, e também a Torre Obispado, do México, que detém a liderança latino-americana com 305 metros. Em El País.
Fora do poder desde a posse do conservador Luis Lacalle Pou em 2020, a coalizão de centro-esquerda Frente Ampla (cujos representantes ocuparam cargos de presidente durante os 15 anos anteriores à guinada recente) voltou a se mobilizar nas ruas da capital na quinta (15), de olho em um aceno aos eleitores num momento delicado para o atual governo – que segue sufocado por um crescente escândalo envolvendo uma figura do círculo presidencial (entenda como a crise se embaraça). Sob o lema “El Frente te escucha”, o bloco político também deve percorrer os rincões do país para tratar de “temas sensíveis”. Na Prensa Latina.
VENEZUELA 🇻🇪
O presidente Nicolás Maduro anunciou, na segunda-feira (12), sua intenção de “abrir totalmente” as passagens de fronteira do país com a Colômbia a partir de janeiro, ampliando um processo de reabertura política e geográfica já em andamento entre os vizinhos – as relações formais entre Caracas e Bogotá foram reativadas em setembro após três anos de conflito diplomático. Em recado à nação pela TV, o mandatário venezuelano disse que “carros, motos e caminhões” terão caminhos abertos sem restrição pelas linhas que separam os países. O líder chavista também fez questão de mencionar seu homólogo colombiano, pivô do processo de reinserção política e diplomática da Venezuela: “estamos preparando tudo para cumprir o que anunciamos e o que foi prometido ao presidente Gustavo Petro”. Via AP.
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