Argentina terá ‘superministro’ ante pior crise desde 2001
Designado para conter crise financeira e política, Sergio Massa acumula a pasta de Economia e outras duas. Se tiver sucesso, quer se credenciar à Presidência da República em 2023
Durou apenas 24 dias o período de Silvina Batakis à frente da pasta de Economia na Argentina: nesta quinta-feira (28), imerso em um dos piores cenários econômicos do continente, o governo do presidente Alberto Fernández anunciou uma nova reconfiguração de seu gabinete e nomeou Sergio Massa para o cargo. Ele, que até aqui era o presidente da Câmara dos Deputados e encabeçava a base aliada, já chegou com status de “superministro”: além do Ministério até aqui comandado por Batakis, que agora vai dirigir o Banco de la Nación, Massa também unifica sob sua asas as pastas de Desenvolvimento Produtivo e Agricultura, e de Pecuária e Pesca.
A última troca de ministros havia ocorrido no início do mês, após a renúncia intempestiva de Martín Guzmán ao posto. Além da própria crise, pairava sobre a cabeça de Guzmán uma rusga com a vice-presidenta Cristina Kirchner, que geralmente costuma vencer as quedas de braço nos altos círculos de poder. E, daquela vez, não foi diferente. Desde então, uma situação econômica já em frangalhos se deteriorou ainda mais: o temor pela escalada do dólar provocou uma imediata escassez de produtos importados, especialmente eletrônicos, levou a uma nova revisão para cima da projeção da inflação para este ano (que já beira os 80%) e culminou, na semana passada, com o cumprimento da profecia autorrealizável – as piores cotações da história do peso ante o dólar, superando pela primeira vez a barreira dos 300 por um no câmbio paralelo, onde se compra o chamado dólar “blue”. A situação só não é pior do que a crise argentina de 2001, durante o corralito: na época, o governo do então presidente Fernando de la Rúa (1999-2001) adotou uma série de medidas para restringir os saques bancários e desatou a ira da população – que protestou em massa nas ruas e forçou a renúncia do presidente, levando a um vazio de poder quedas de diferentes sucessores nas últimas semanas de dezembro daquele ano. No auge da crise, pontos turísticos da capital se transformaram em campos de guerra, com episódios de saques e casos de repressão policial que deixaram dezenas de mortos.
Em seu menos de um mês no cargo, Batakis até encontrou tempo de fazer a tradicional visita ao Fundo Monetário Internacional (FMI), onde teve uma reunião “produtiva” antes de cair, mas nada aplacou a ira dos mercados com a piora do cenário na economia argentina. Assim, não demorou para que a agora ex-ministra pagasse o preço e perdesse a pasta. Alberto Fernández justificou a nova troca e a unificação dos ministérios citando a busca por uma “melhor coordenação” após o que “vivemos como país e como sociedade nos últimos meses, e em particular nas últimas semanas”. Para além das urgências econômicas, que são o principal foco de interesse da população, a ascensão de Massa foi encarada como uma nova jogada no xadrez político dos corredores do poder em Buenos Aires: em um governo fraturado entre o presidente e Cristina Kirchner, Massa talvez fosse o principal nome a manter bom trânsito entre as duas alas.
Como comentou o analista Mario Wainfeld no Página 12, o principal diário progressista da Argentina, trata-se de um governo que já havia sido eleito com um arranjo muito sui generis: antes do último pleito, Cristina era mais conhecida e poderosa do que o próprio Fernández, e aceitou fazer da nova administração uma “diarquia” para viabilizar a chapa, diante da rejeição pessoal em torno de seu nome. O resultado? Uma gestão de duas cabeças, produto de uma combinação tempestuosa desde o início e que agora ganha um terceiro cérebro – na prática, um Sergio Massa superpoderoso atuará como uma espécie de primeiro-ministro, não apenas articulando a política econômica em um cenário de terra arrasada e tentando aglutinar a base aliada hoje em pé de guerra, mas já de olho na eleições presidenciais de 2023. A missão é difícil em todas as frentes, mas qualquer aceno de melhora (ou mitigação dos desastres político e socioeconômico) seria a cartada que falta para ele despontar como o nome dos peronistas para tentar manter a Presidência no próximo ciclo.
Ainda sem tomar posse oficialmente, algo que só deve ocorrer na próxima quarta-feira (3/8) em função dos entraves burocráticos em torno de sua saída do comando da Câmara, Massa tem seu impacto ainda projetado com um olhar cético e otimismo reticente (o “blue” fechou a semana em leve queda, cotado a 296). Após passar a manhã desta sexta reunido com o presidente na residência oficial de Olivos, o flamante superministro prometeu que ambos vão “anunciar um conjunto de medidas” tão logo a posse seja homologada, na metade da semana que vem. Até lá, muita expectativa e nenhuma certeza – como tudo o que cerca a Argentina em assuntos envolvendo economia.
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Un sonido:
DESTAQUES
🌎 Varíola do macaco tem primeira morte na região – A Opas, Organização Pan-Americana da Saúde, disse na quarta (27) que quase 5,3 mil casos de varíola do macaco foram relatados até agora em 18 países e territórios nas Américas – incluindo EUA e Canadá. Estes dois, junto ao Brasil, são também os que concentram a maioria dos contágios confirmados. A vice-diretora da entidade, Mary Lou Valdez, alertou que qualquer pessoa pode contrair a doença, independentemente do gênero ou orientação sexual, após alertas iniciais sobre uma maior prevalência em homens que mantêm relações com outros homens. A entidade também havia dito que nenhuma morte pela doença havia sido relatada até então – no entanto, na sexta (29), o Brasil confirmou um óbito, o primeiro fora da África. No último dia 23, a Organização Mundial da Saúde declarou o surto de varíola do macaco uma emergência de saúde global. Diante dos riscos, a Opas reforçou que negociações para a produção de vacinas já estão em estágio “avançado”. Via Reuters.
🇨🇱 Chile promete gratuidade da saúde para setembro – O governo de Gabriel Boric anunciou, na quarta (27), o fim do sistema de copagamento no sistema público de saúde do país, prometendo gratuidade universal a partir de setembro. Até aqui, cerca de 10 milhões de usuários de baixa renda já eram isentos do pagamento, mas outros 5,3 milhões de pessoas ainda precisavam arcar diretamente com parte dos custos do Fundo Nacional de Saúde, o Fonasa. O chamado “Copagamento Zero”, considerado pelo governo a mais importante mudança na saúde pública desde que a gestão de Michelle Bachelet garantiu atendimento gratuito a idosos em 2006, deve propiciar uma economia média de 265 mil pesos (cerca de R$ 1,5 mil) por ano para os beneficiários do Fonasa que ainda precisavam contribuir. Por outro lado, o governo passará a absorver custos estimados em 21 bilhões de pesos (R$ 120 milhões) anuais. Via EFE.
🇵🇦 Protestos seguem e ex-presidente anuncia candidatura – Os protestos que tomaram o país durante o mês de julho (relembre na edição #140) já são considerados os maiores desde a crise social e política de 1989, que terminou com a última invasão militar dos EUA na América Latina e com a derrocada e prisão do ditador Manuel Antonio Noriega (1983-1989). Agora, já em período democrático e após gozar de anos de relativa estabilidade, sindicatos, organizações sociais e grupos indígenas seguem nas ruas – mesmo após ver o governo de Laurentino Cortizo acatar uma série de requisições relacionados ao alívio do custo de vida da população, especialmente em relação ao preço dos combustíveis, da cesta básica e da saúde. Nos últimos dias, por sinal, o coro foi engrossado por populações originárias: na quinta (28), representantes da etnia Ngobe fizeram uma marcha pacífica ao longo de mais de 40 quilômetros Rodovia Pan-Americana, estrada que liga o Panamá a outros países da América Central e que vem sendo alvo de bloqueios há semanas. Os indígenas marcharam em direção à sede da Presidência, pedindo um país mais justo e igualitário. No mesmo dia, lideranças do paro também levaram à mesa de diálogo demandas do setor de educação, cobrando mais investimentos. Enquanto tudo se desenrola, um bastidor político pode mudar o jogo nos próximos tempos: aproveitando o estado de descontentamento geral, o ex-presidente Ricardo Martinelli (2009-2014) anunciou que vai concorrer novamente em 2024, a despeito das investigações por corrupção contra ele. Fontes no Panamá já haviam dito ao GIRO que, desde o princípio do protestos, o nome de Martinelli estava à espreita. Na BBC.
🇭🇹 Haiti tem quase 500 mortes por gangues em nove dias – A violência não é novidade, mas os números têm chegado a níveis descontrolados: segundo a ONU, somente entre os dias 8 e 17 deste mês, pelo menos 471 pessoas foram mortas, feridas ou estariam desaparecidas em meio ao enfrentamento entre gangues em Cité Soleil, maior favela da capital Porto Príncipe. A entidade também reportou “graves incidentes de violência sexual contra mulheres e meninas”, além de “crianças recrutadas por gangues”. A situação de total descontrole – e que parece dar um jeito de redefinir os padrões de brutalidade a cada semana – e o subsequente domínio de grupos armados vêm gerando toda a sorte de efeitos colaterais, como um êxodo urbano massivo, picos de desabastecimento e até igrejas vandalizadas. A situação vem na esteira de uma grave crise política que ganhou camadas ainda mais incertas após o assassinato do presidente Jovenel Moïse, há um ano – ainda longe de ser totalmente solucionado, o crime também fez surgir a necessidade da convocação de novas eleições, impasse que o premiê Ariel Henry (ele próprio acusado de participar do magnicídio) se nega a resolver. Via AFP.
🇵🇪 Após inúmeras crises, Castillo completa um ano na Presidência – Há um ano nesta quinta-feira (28), Pedro Castillo recebia a faixa presidencial e dava início a um governo que não teve sequer um dia de paz. E que ano: caótico desde a fase de apuração de votos – já que a derrotada Keiko Fujimori não aceitou o resultado e passou a levantar (sem provas) acusações de fraude nas urnas – a jornada de Castillo no poder foi marcada por um cenário de total divisão, sem que nenhuma das opções do segundo turno convencesse firmemente o eleitorado (o próprio Castillo sequer teve 20% dos votos no primeiro turno e venceu o segundo por menos de 45 mil votos). Cercado de polarização e sendo acompanhado por uma imprensa tradicional pouco ou nada interessada em facilitar a vida do governo, o presidente completa um ano no cargo tendo sobrevivido, ao menos por enquanto, a duas moções de vacância, cinco investigações – a última delas, que analisa suposto crime de tráfico de influência, reaberta na última sexta (22) –, um convite para deixar seu próprio partido Perú Libre e até mesmo protestos sociais, incluindo uma série de conflitos no campo. Além de crises internas, o contexto sanitário e mundial pouco ajudou: Castillo juramentou como chefe de Estado ainda em meio aos piores dias da pandemia de covid-19, que, em dado momento, renderam ao Peru a triste marca de país com as mais altas taxas proporcionais de mortalidade por coronavírus no mundo. Para além de uma legião de cerca de 100 mil órfãos e um colapso no sistema de saúde, a informalidade e a pobreza decolaram. Em 2022, ao passo que o vírus dava alguma trégua, veio a guerra na Europa: por tabela, foram as altas de preços, em especial de combustíveis, que fizeram Castillo enfrentar a fúria das ruas pela primeira vez, enquanto seguia sendo alvo do Congresso que mais derruba presidentes no continente (saiba mais no vídeo do GIRO). Com mais crises para resolver do que tempo para governar, Castillo inicia seu segundo ano com a respiração ofegante. O prognóstico para o que virá, porém, vai exigir mais fôlego – e caso não haja, sua vice, Dina Boluarte, até já se disse disposta a assumir o trono.
Un hilo:
REGIÃO 🌎
O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, segue tentando ampliar laços diplomáticos em meio à guerra. Além de receber a visita de seu homólogo guatemalteco em Kyiv (leia mais na seção do país), o mandatário manteve conversas em nível oficial com outras duas lideranças da região: os presidentes Rodrigo Chaves, da Costa Rica, e Luis Lacalle Pou, do Uruguai. Nas conversas, trataram de temas econômicos e diplomáticos afins, mutuamente condenando o lado russo do conflito.
A Copa América feminina de seleções, principal competição sul-americana da categoria, terá sua grande final na noite deste sábado (30): em Bucaramanga, a anfitriã Colômbia tenta conquistar o primeiro título de sua história contra as poderosas brasileiras – que ganharam sete das oito edições do torneio disputadas até hoje (a única exceção fica por conta de 2006, quando a Argentina conquistou a taça dentro de casa). Além do título continental, o torneio também definiu vagas para outras competições envolvendo o resto do planeta: as duas finalistas garantiram lugar nos Jogos Olímpicos de 2024 – e ambas, ao lado da terceira colocada Argentina, também asseguraram um lugar na Copa do Mundo do ano que vem. Paraguai e Chile, as equipes seguintes na classificação, ainda têm chance de vaga no Mundial de 2023, mas precisarão disputar uma repescagem. A finalíssima acontece às 21 horas de Brasília, com transmissão do SporTV. No GE.
ARGENTINA 🇦🇷
Há 70 anos nesta terça-feira (26), morria a lendária María Eva Duarte de Perón, a “Evita”. Então primeira-dama da Argentina e rosto de projetos sociais e trabalhistas impulsionados no primeiro governo de Juan Domingo Perón (1946-1955), Evita tinha apenas 33 anos e se converteu em imagem de culto para muitos argentinos humildes. O aniversário redondo foi celebrado com homenagens, e também com o lançamento de uma nova série televisiva sobre o destino macabro do corpo da primeira-dama: Santa Evita, disponível na plataforma Star+, é baseada no livro de mesmo nome de Tomás Eloy Martínez, lançado em 1995, que conta as desventuras do cadáver por duas décadas após a queda da gestão peronista. Um resumo da história, na BBC.
BOLÍVIA 🇧🇴
Na reportagem do Diálogo Chino, especialistas e agricultores discutem os impactos da construção de uma rodovia que pretende ligar as províncias de Potosí e Cochabamba. Para alguns habitantes da região, o projeto de 259 quilômetros significaria maior facilidade de acesso a outras partes do país e ganhos econômicos – uma obra esperada há mais de 15 anos. Mas ambientalistas alertam para possíveis riscos socioambientais. Além de danos diretos à natureza, se o projeto for adiante, cruzará o território que abriga pelo menos 30 comunidades indígenas, além de uma porção de zonas arqueológicas.
Paralisação total e congestionamento na fronteira entre Brasil e Bolívia. Foi assim que a semana começou quando, na segunda (25), protestos de caminhoneiros tomaram a região que divide o território do Mato Grosso do Sul com o país altiplânico. A ação foi capitaneada por pessoas contrárias à decisão do governo de Luis Arce de adiar para 2024 a realização do Censo Demográfico, que atualizará diversos números oficiais. A ausência do censo neste ano, alegam manifestantes, pode deixar de atualizar estatísticas que impactam diretamente no cálculo de recursos repassados a municípios do país. Protestos similares foram registrados dentro da Bolívia. Ao menos na zona fronteiriça, as estradas foram liberadas algumas horas depois. No G1.
CHILE 🇨🇱
Com risco de ser rechaçada, a nova Constituição pode tomar novos rumos nos próximos meses. O presidente Gabriel Boric abriu a possibilidade de ajustes na proposta, caso ela seja aprovada no plebiscito de setembro. “Estamos de acordo entre todos que apoiam o governo de que é possível melhorar”, afirmou o mandatário. Como informado pelo GIRO em edições passadas, pesquisas apontam que a intenção de voto para o “eu rechaço” ultrapassou o “eu aprovo” em 13 pontos percentuais: 48% a 35%. Ao se aproximar de setembro, mês de sua aprovação ou rejeição definitiva, o texto que poderá substituir a constituição herdada da ditadura militar de Pinochet atingiu em junho o menor patamar de apoio desde o início de sua criação – apenas 33% dos chilenos seguem endossam a mudança como está. Na semana passada, Boric já havia indicado sua preferência por criar uma nova Convenção Constitucional se o texto proposto fosse rejeitado, e agora surge com uma nova alternativa para tentar recuperar o apoio à hipótese de aprovação. Via EFE.
COLÔMBIA 🇨🇴
Nesta semana, a Jurisdição Especial para a Paz (JEP) acusou 32 militares colombianos por crimes de guerra e contra a humanidade pelo assassinato de cerca de 349 pessoas nos departamento de Casanare e Antioquia. Em uma das acusações, anunciada na segunda (25), a JEP informou que a maioria das vítimas eram homens jovens, civis, com 18 a 25 anos de idade. Também havia nove mulheres (uma delas grávida), uma pessoa da comunidade LGBTQIA+ e idosos, entre outros. Foi a primeira vez que a JEP formulou uma acusação de crime de lesa-humanidade por motivos de gênero. Os novos desdobramentos nos casos dos falsos positivos (leia mais na edição #129) se deram justamente na semana em que a ONU publicou um novo relatório com números preocupantes: pelo menos 100 defensores dos direitos humanos foram mortos em todo o país em 2021 e há cerca de 54 mil pessoas sitiadas em zonas rurais no departamento de Chocó, na costa do Pacífico, sob ameaça de grupos armados. Em El Tiempo.
A vice-presidenta eleita Francia Márquez esteve em São Paulo, onde se encontrou na quarta (26) com o ex-presidente brasileiro e favorito nas pesquisas para este ano, Luiz Inácio Lula da Silva. Ao lado de outras lideranças do Partido dos Trabalhadores (PT), especialmente mulheres, a integrante da chapa vencedora nas eleições colombianas tratou de temas afins como direitos humanos, gênero, meio ambiente e tecnologia. O encontro – extraoficial, já que a posse só acontece em 7/8 – também serviu para sinalizar uma certa cooperação entre o governo Petro e Lula, caso eleito. Os dois também falaram de uma possível retomada de ações da Unasul, bloco político e econômico à esquerda criado em 2008 e que acabou caindo em desuso após uma onda conservadora varrer a região. A visita ao Brasil também mandou recados silenciosos: Márquez não se encontrará com Jair Bolsonaro, que, por sua vez, também não deve estar em Bogotá para a cerimônia de posse do próximo domingo. No UOL.
Una palabra:
Despecho – Equivalente à sofrência em termos musicais, é a categoria que reúne as canções de quem tem o coração ferido. O cantor colombiano Darío Gómez, conhecido como “el rey del despecho”, morreu de mal súbito nesta terça-feira (26) em Medellín, aos 71 anos. O artista construiu fama com composições sobre amores e desamores – e uma das mais memoráveis foi justamente Nadie es eterno en el mundo, lançada em 1989.
COSTA RICA 🇨🇷
Em 1947, o escritor costa-riquenho Joaquín Gutiérrez publicou Cocorí, obra infantil que entrou para o cânone literário do país. Quatro décadas depois, membros do movimento negro começaram a criticar o livro por passagens consideradas racistas: a história conta a trajetória de um menino negro que se apaixona por uma menina branca, comparada a uma rosa, a mais bela que ele já viu. O protagonista passa então a se questionar por que as coisas belas duram tão pouco, enquanto os animais da selva e as plantas carnívoras – que ele entende como coisas ruins – duram tanto. A discussão póstuma em torno de Cocorí cresceu ainda mais em anos recentes após a publicação de uma caricatura com representações racistas da obra, usada para divulgar um espetáculo financiado pelo governo. Os desdobramentos dessa história estão disponíveis em texto e áudio na Radio Ambulante.
CUBA 🇨🇺
Vacinas produzidas em Cuba já podem ser usadas na Europa – ao menos, em um país isolado do Velho Continente. A mudança veio após Belarus aprovar, na quarta (27), o uso emergencial da Soberana Plus, um dos três imunizantes contra a covid-19 desenvolvidos pelo renomado Instituto Finlay de Vacinas de Havana. A própria entidade confirmou a informação. Com isso, o governo belarusso se torna o primeiro europeu a dar luz verde para uma vacina cubana desde o início da pandemia. A vacina, que segundo cientistas da ilha têm eficácia acima de 90%, também abasteceu os latino-americanos Venezuela e Nicarágua, além de Irã e Vietnã. Em comum, todos, assim como Belarus, têm governos vistos com reservas pelas potências ocidentais. No Granma.
EL SALVADOR 🇸🇻
De olho em restaurar todos os títulos da dívida soberana do país, que têm vencimento em 2023 e 2025, o presidente Nayib Bukele enviou ao Congresso – que conta com ampla maioria governista – dois projetos de lei para garantir fundos necessários para o pagamento e, ao mesmo tempo, afastar rumores de um possível default. A decisão desta terça (26) também acontece em um momento nada amistoso entre o governo salvadorenho e o mercado de crédito global, especialmente o FMI: crítico à pioneira lei que fez da Bitcoin uma moeda legal no país, o órgão internacional teme que San Salvador tenha problemas de liquidez no curto e médio prazo, sobretudo pela desvalorização abrupta do montante da criptomoeda comprado com dinheiro público. Bukele discorda, dizendo que há capacidade tanto para honrar compromissos imediatos quanto para antecipar as dívidas que vencem em breve (só a que vence em 2023 está em US$ 800 milhões). Enquanto isso, se o governo insiste na moeda digital, especialistas também mantêm os alertas de uma possível crise financeira por lá. No Infomoney.
EQUADOR 🇪🇨
A final da Copa Libertadores 2022, marcada para 29/10, pode não acontecer em Guayaquil. É o que já se especula nos corredores da Conmebol, principal entidade do futebol sul-americano. Segundo bastidores que tomaram a imprensa esportiva da região, o Estádio Monumental Isidro Romero Carbo, casa do guayaquileño Barcelona, não cumpriria com uma série de requisitos necessários para a realização do evento, sobretudo em relação à infraestrutura de transmissão – um dos momentos esportivos mais assistidos no continente, teve quase 40 milhões de espectadores só no Brasil durante a partida que sagrou o Palmeiras tricampeão contra o Flamengo, em novembro de 2021. Segundo o Barcelona, estaria no radar um investimento milionário para melhorias dentro e fora da cancha – o que, no entanto, seria insuficiente para a entidade organizadora. A repercussão foi tão negativa que o próprio governo equatoriano resolveu entrar na história e prometer não medir esforços para que a sede seja mantida. Sem data para o veredito que determinará qual o rumo da finalíssima, a Conmebol lida com um problema que já aconteceu recentemente: a final da Sul-Americana, originalmente marcada para o Estádio Mané Garrincha, em Brasília, também precisou de nova sede. A pedido da CBF, o jogo foi remarcado para Córdoba, na Argentina, no Estádio Mario Kempes. Autoridades brasileiras temiam a realização na capital já que o jogo, a ser realizado em 1°/10, aconteceria um dia antes do primeiro turno das conturbadas eleições presidenciais no Brasil. No GE.
GUATEMALA 🇬🇹
O presidente Alejandro Giammattei visitou a Ucrânia na segunda (25), onde se encontrou com seu homólogo Volodymyr Zelensky. A fim de estreitar relações, o mandatário latino manifestou solidariedade à causa ucraniana no conflito com a Rússia, mencionando “os efeitos econômicos globais que têm gerado inflação, aumento dos custos de vida e, portanto, mais pobreza”. A economia guatemalteca, assim como várias na região, depende da importação de grãos produzidos na região afetada pela guerra, fato que “pode levar a uma crise alimentar”, disse Giammattei. O encontro é fruto de um convite feito por Kyiv em junho. Os dois líderes aproveitaram a oportunidade para abolir o visto obrigatório para guatemaltecos e aprofundar relações econômicas bilaterais. A visita do primeiro líder latino-americano à Ucrânia após o desenlace da guerra não ficou sem resposta por parte de Moscou: em nota, a embaixada russa na Guatemala criticou o encontro e menosprezou o que chamou de apoio de um “pequeno Estado da América Central”, sugerindo que Zelensky estaria carente de apoio. Via AFP.
HONDURAS 🇭🇳
O governo de Xiomara Castro extraditou aos EUA, na terça (26), Herlinda Bobadilla, chefe do cartel da família Montes Bobadilla e acusada de liderar uma rede de tráfico de drogas dentro e fora do país. Bobadilla, de 61 anos, foi levada pela Força Aérea hondurenha para o estado da Virgínia, onde enfrentará os tribunais por acusações relacionadas ao tráfico de cocaína em território estadunidense. Uma ordem de captura sob recompensa de até US$ 5 milhões estava em vigor não só pela prisão da líder, mas também de seus filhos, que há anos também atuam no comando do cartel. Via AFP.
Un clic:
MÉXICO 🇲🇽
Não apenas um, mas dois motivos fizeram o governo mexicano voltar a cobrar de brasileiros a apresentação de vistos físicos no momento de entrada no país. Desde 2000, em um acordo de reciprocidade, brasileiros e mexicanos estavam isentos da necessidade de um visto, o que sempre facilitou o turismo mútuo. Tudo mudou no final de 2021: em novembro, alegando uma alta nos números de migração – em sua maioria pessoas de diversas nacionalidades que deixavam o Brasil rumo ao México para tentar chegar aos EUA – a administração de Andrés Manuel López Obrador passou a exigir uma documentação emitida de forma digital, solicitada até 30 dias antes do embarque. Não adiantou – e só piorou: além de não reduzir suficientemente o fluxo migratório, a modalidade online passou a apresentar diversos problemas, enfurecendo turistas brasileiros. Em junho, no ápice da pane (que chegou a impedir viagens já marcadas), o Itamaraty fez um pedido formal aos pares mexicanos, exigindo “medidas urgentes” para reparar a situação. Agora, tentando resolver o problema antigo e o novo, o México apela ao tradicional visto de turismo. Em El Economista.
“Não aceitamos, não vamos entregar nossa independência a nenhum governo estrangeiro”. O discurso não é novo, mas voltou a ser repetido pelo presidente López Obrador na quinta (28), quando o mandatário foi questionado sobre consultas feitas por EUA e Canadá em relação à lei de energia mexicana. Os dois países ao norte, que assinaram com o México o acordo de livre-comércio T-MEC (que modernizou e substituiu o Nafta, criado em 1994), argumentam que o modelo energético estatal preferido por AMLO traria problemas ao meio ambiente, já que teria uma produção majoritariamente poluente. Defendendo empresas privadas, os dois países dizem que é preciso fazer uma revisão de acordos em benefício do tratado multilateral. Obrador não quer conversa: defendendo artigos que protegem interesses soberanos do país, disse que a “independência” do México nesses assuntos deve ser preservada, mesmo que isso custe abandonar o T-MEC. Para aliviar as tensões, o chanceler mexicano Marcel Ebrard disse logo após o discurso do presidente que o governo vai considerar algumas exigências para evitar polêmicas. No Jornada.
NICARÁGUA 🇳🇮
Mais uma condenação a um líder de oposição ao governo de Daniel Ortega: agora, Yubrank Suazo, que se destacou nos protestos de 2018, recebeu uma pena de 10 anos, segundo informou o Centro Nicaraguense de Direitos Humanos (Cenidh) na quarta-feira (27). Suazo foi diretor do próprio Cenidh, e seu julgamento teria acontecido a portas fechadas, sem a presença de jornalistas ou público. Os protestos de 2018 são considerados um ponto de inflexão na história recente da Nicarágua, quando Ortega iniciou uma escalada autoritária que segue até os dias atuais, prendendo opositores e fechando entidades críticas ao regime. Yubrank Suazo havia sido detido já na época e posteriormente liberado com uma anistia firmada no ano seguinte às manifestações, mas voltou a ser preso em 2022 sob acusações de conspirar contra a integridade nacional e supostamente divulgar notícias falsas sobre o governo. Na CNN.
PARAGUAI 🇵🇾
Parece história de filme – e um que parece comum no Paraguai: informações da Polícia Civil de São Paulo dão conta que Jarvis Gimenes Pavão, integrante da facção PCC, estaria por trás de um plano para assassinar o ex-presidente paraguaio Horacio Cartes (2013-2018). A investigação aponta que uma transferência de Pavão em 2016, a mando do então presidente, teria motivado a conspiração de vingança. Tudo acontece no contexto violento que transformou a fronteira entre os dois países em um palco de guerra entre cartéis de droga e suas disputas por território. Uma guerra que já cobrou vidas de autoridades: outra investigação revelou que a mesma quadrilha transnacional teria encomendado a morte do promotor paraguaio Marcelo Pecci, que há anos liderava investidas contra o crime (saiba mais no GIRO #135). Via EFE.
PORTO RICO 🇵🇷
Drama que se repete: pelo menos cinco haitianos morreram na costa de Porto Rico, enquanto outros 68 foram resgatados com vida, após supostamente terem sido jogados no mar pela tripulação do barco que os estaria levando irregularmente até a ilha vizinha. É um cenário comum: em busca de um acesso mais fácil aos EUA, muitos haitianos percorrem o trajeto de mar que separa a ilha de Hispaniola e Porto Rico, um território associado ao gigante do Norte. Fazem isso, porém, em embarcações irregulares, que com frequência naufragam no trajeto – ou, então, ficam à mercê de traficantes de pessoas que, para fugir das autoridades, soltam os migrantes em ilhas desabitadas e os obrigam a nadar até chegar a Porto Rico, como parece ter sido o caso desta vez. Via AP.
Un nombre:
Peru – Existem várias teorias a respeito da história do nome do país berço da civilização incaica. Uma delas remonta ao cenário do início da colonização espanhola, quando os invasores chegaram ao território andino: ao questionar os indígenas sobre como se chamava o lugar, teriam ouvido respondido “Viru” (do rio Viru, ao norte do país). Os espanhóis, diz essa hipótese, entendiam “Peru” e, com o tempo, começaram a chamar todo o país daquela forma. No Dicionário Oxford consta outra versão: o nome, na verdade, teria vindo de “Birú” ou “Peru”, do guarani, que significa “rio”. Outros historiadores defendem que Birú era, na verdade, o nome de um cacique do sul do Panamá – e que todas estas terras recebiam o nome dele.
REPÚBLICA DOMINICANA 🇩🇴
Uma nova lei anticorrupção que vai garantir o ressarcimento de qualquer peso roubado aos cofres públicos. Foi com essa promessa difícil de cumprir que o presidente Luis Abinader assinou a chamada Lei de Extinção de Domínio, na quinta (28), que prevê punições mais duras para quem for condenado por crimes de corrupção na administração pública. “Neste país, quem faz, paga, e quem rouba devolverá o roubado. Simples assim”, afirmou o presidente, confiante que desta vez será diferente das tentativas anteriores de combater delitos do tipo – todas fracassadas. No Listin Diario.
URUGUAI 🇺🇾
Luis Suárez, ou “Lucho”, nome que não sai da boca dos uruguaios, voltou à terra natal: na quarta (27), o “Pistolero” assinou contrato com o Nacional de Montevidéu, clube no qual foi revelado para o futebol nos anos 2000, sendo rapidamente lançado ao topo do futebol europeu. É uma contratação atípica para um futebol empobrecido, de um atleta que, embora nascido no país, ainda tinha mercado em ligas recheadas de dólares e euros. Suárez se reencontra com o paisito aos 35 anos, mas seu futuro está definido apenas até o final de 2022 – ele assinou por apenas cinco meses. Confirmado o retorno, também veio outra decisão importante: o número que o atacante fardaria com a tricolor da capital. E após Emmanuel Gigliotti, atual dono da 9, ceder o manto da grande área ao novo companheiro, os uruguaios já sabem qual camisa terão no armário daqui a alguns dias. O ídolo instantâneo será apresentado no domingo (31), no Estádio Gran Parque Central, às 15 horas. Dizendo-se “orgulhoso” ao voltar, Luisito não deve demorar a ser visto por brasileiros: ele já estará à disposição do técnico Pablo Repetto na próxima terça (2), para o duelo contra Atlético Goianiense, em partida válida pela primeira perna das quartas-de-final da Copa Sul-Americana, o segundo escalão dos torneios de clubes do continente, abaixo da Libertadores. “Aí é foda”, brincou, pelo Twitter, a conta oficial do clube brasileiro, já prevendo o esperado encontro de milhões.
VENEZUELA 🇻🇪
Não foi um desfecho inesperado, mas, na prática, o ouro venezuelano guardado em Londres segue interditado: nesta sexta-feira (29), as altas cortes britânicas concluíram que as decisões do Supremo da Venezuela não são válidas, impondo uma derrota ao governo de Nicolás Maduro, que tentava reaver o depósito em metal precioso estimado em US$ 1 bilhão – quantia nada desprezível para um país que vive longa crise. Oficialmente, o descrédito da corte londrina às decisões de Caracas implica um novo reconhecimento à autoridade do líder opositor Juan Guaidó, que ainda conserva certo apoio internacional como presidente encarregado do país, embora já não conte nem com argumento legal nem com poder real para justificar a posição. A Venezuela alega que o sequestro do ouro impediu uma resposta mais eficiente à pandemia, enquanto Guaidó argumenta que o dinheiro pouco resolveria os dramas humanitários dentro de casa, sendo imediatamente usado para pagar dívidas com aliados, como Irã e Cuba. Via Reuters.
Após anos de conflito e relações inexistentes, um aperto de mão à vista: autoridades da Venezuela e do governo eleito do colombiano Gustavo Petro, que tomará posse em 7/8, informaram conjuntamente na quinta (28) que vão nomear novos embaixadores para suas respectivas capitais. A declaração foi dada pelo ministro das Relações Exteriores venezuelano, Carlos Faría, e seu futuro homólogo, Álvaro Leyva. Além da “disposição de progredir com uma agenda de trabalho para a normalização gradual de relações bilaterais”, como disseram os pares, os dois governos devem trabalhar para resolver o complexo e violento conflito armado e humanitário que se estende por toda a região fronteiriça entre os países, tema que Petro já apontou como sendo prioritário para sua gestão. Em El Economista.
Ventos positivos: após oito anos de retração, o PIB do país deve fechar 2022 com um aumento de 10%, um ganho que muitos consideravam impossível alguns anos atrás. Além de ser reflexo de um natural momento de retomada global após dois anos de pandemia, a situação de melhora geral na Venezuela reflete o aumento do consumo, estimulado pela volta de venezuelanos ao país após anos vivendo no exterior e pelo uso de doláres no dia a dia. De acordo com o Observatório Venezuelano de Finanças, o consumo aumentou 21% nos últimos meses. Já a atividade econômica subiu 16,6% no segundo trimestre de 2022. A estabilização da produção petroleira (que corresponde a mais de 90% da economia do país), maiores investimentos do governo e o fim do quadro de hiperinflação também estão entre os fatores por trás de números menos aflitivos. Na RFI.
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