Guatemala vai às urnas em crise e sem 4 candidatos
Em pleito marcado pela exclusão controversa de alguns presidenciáveis e polêmica manutenção de outros, guatemaltecos também votam sob fantasma de perseguições a opositores do governo
Chegou o dia: no domingo (25), mais de 9 milhões de guatemaltecos poderão escolher um novo presidente, vice, 160 deputados, 20 representantes no Parlamento Centro-Americano (Parlacen) e outras centenas de cadeiras em nível municipal. Mais do que dar à população o poder de definir novos cargos, a votação do final de semana também testará os limites da democracia de um país que, há pelo menos dois anos, convive com uma profunda crise judicial, política e, em tempos recentes, eleitoral. O cenário é pantanoso: como explicado em detalhes pelo GIRO LATINO, quatro presidenciáveis – incluindo Carlos Pineda, que chegou a liderar pesquisas recentes, e a chapa composta pela líder indígena Thelma Cabrera e pelo ex-procurador de direitos humanos Jordan Rodas – tiveram candidaturas suspensas ou excluídas do pleito. Mas, apesar de diversos alertas vindos de dentro e fora do país, essas decisões controversas se mantiveram inalteradas até o fechamento desta edição, às vésperas do primeiro turno.
São “critérios arbitrários que infringem o direito à participação política”, disse à RFI a ONG estadunidense Washington Office on Latin America (WOLA) a respeito das impugnações, e algo que faz as eleições acontecerem em um “contexto de deterioração do Estado”, declarou a Human Rights Watch. Representante da HRW nas Américas, Juan Papier relacionou o contexto eleitoral delicado aos desmandos do atual presidente conservador Alejandro Giammattei, que nos últimos anos é acusado de liderar uma onda de implacáveis perseguições judiciais e de aparelhar o Ministério Público, entre outras instituições, contra opositores. Para Papier, tudo isso é parte de um “projeto político” do líder direitista, fato que se soma à prisão do jornalista (e notório crítico de Giammattei) José Rubén Zamora, recentemente condenado a seis anos de prisão no caso mais emblemático envolvendo os alegados abusos de autoridade e perseguição promovidos por órgãos sob a batuta do presidente.
Enquanto a densa poeira de crise que paira sobre as urnas não baixa, a incerteza também se desenha nas pesquisas eleitorais. Segundo consulta feita pelo Grupo Impacto 360, que ouviu 900 pessoas entre os dias 9 e 12 deste mês, o binômio liderado pela conservadora Zury Ríos larga na frente entre 25,5% dos entrevistados. Filha do finado ditador Ríos Montt – que entre 1982 e 1983 liderou um curto e brutal mandato conhecido pelo massacre de milhares de indígenas no contexto da Guerra Civil (1960-1996) – a líder de direita foi alvo de protestos convocados por grupos originários que pedem a anulação de sua candidatura justamente por sua filiação. Ao mesmo tempo que “viola o direito de participação” de Thelma Cabrera, dizem os indígenas, o Tribunal Supremo Eleitoral (TSE) falha ao permitir a participação de Ríos. Há um precedente: no início do ano, exatamente como em eleições passadas, a candidata viu sua candidatura ser impugnada com base em um artigo da Constituição que veda a participação eleitoral de familiares de golpistas – a decisão, porém, foi revertida pelos tribunais constitucionais a favor da herdeira do general, gerando polêmica. É isso mesmo: pelo artigo 186 da Carta Magna guatemalteca, envolvidos num golpe e no governo subsequente ou seus parentes de até quarto grau de consanguinidade não podem postular à Presidência. No entanto, o entendimento atual da Justiça é que a regra só vale para a primeira eleição após o fim de um regime de exceção, o que liberaria a participação da filha do ditador.
Zury Ríos, porém, não lidera todas as pesquisas. Com 21,3% das intenções de voto, a empresária Sandra Torres, que chegou a ser presa em 2019 por corrupção, aparece em primeiro lugar nas consultas do Encuesta Libre, feitas entre 5/6 e 14/6. Antiga companheira do ex-presidente Álvaro Colom (2008-2012), falecido este ano, Torres é figurinha conhecida no jogo político guatemalteco e já tentou chegar ao Executivo pelo voto em 2015 e 2019, sendo derrotada por Alejandro Giammattei nas últimas eleições. A líder política representará a Unidade Nacional de Esperança (UNE), mesmo partido de Colom e conhecida legenda social-democrata, de centro; ela, no entanto, vale-se de um discurso bem mais conservador. Assim como Ríos, Torres também teve candidatura impugnada mais cedo este ano, já que seu vice, o pastor Romero Guerra, estaria impedido de se postular ao cargo por sua função religiosa, outro impedimento eleitoral previsto constitucionalmente.
Mas de forma similar ao desfecho da filha do ditador, Torres viu tudo ser apatifado pelas altas cortes e pôde seguir normalmente na corrida eleitoral. As outras quatro candidaturas mencionadas no início, porém, não tiveram a mesma sorte, o que só aumentou o burburinho.
Em terceiro lugar na pesquisa do Grupo Impacto 360 (16,8%) e como segundo mais bem cotado na promovida pelo jornal Prensa Libre (13,4%) aparece Edmond Mulet, diplomata de carreira à frente do centro-direitista Cabal. Com cargos de relevância na ONU, incluindo o de chefe da missão da entidade no Haiti nos anos de intervenção internacional no sempre convulsionado país caribenho, Mulet ficou muito perto de se tornar o quinto candidato excluído do pleito: meses atrás, o mesmo órgão do Ministério Público acusado de perseguição acusou o diplomata de obstrução de justiça, após Mulet apresentar recursos legais a favor do jornalista José Rubén Zamora – cuja detenção ele também critica. Apesar das tentativas do MP de levar o caso à Justiça para excluir o candidato das eleições, nada foi adiante. O presidenciável, porém, criticou as investidas e o “assédio” do que chamou de “forças mais obscuras do país”.
É nesse contexto turbulento que os três candidatos mais bem cotados, ao lado de uma longa lista com outros 19 nomes menos conhecidos, tentarão chegar à Presidência. Mas o caminho é longo, especialmente em um país onde o voto não é obrigatório e a abstenção está sempre à espreita. E tudo aponta para um segundo turno, marcado para 20/8, já que nenhum dos candidatos parece chegar perto dos 50% mais um dos votos válidos para vencer de primeira – algo que deve repetir o que ocorreu em todas as eleições desde 1985, quando a Guatemala voltou à democracia. Um regime democrático que sofreu duras investidas sob o governo Giammattei e cujo futuro dependerá dos resultados preliminares deste final de semana.
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🇦🇷 Em giro inesperado, coalizão peronista define chapa única e não terá ‘crivo’ das primárias presidenciais – De forma surpreendente, a ampla representação peronista – da qual fazem parte o presidente Alberto Fernández e sua vice Cristina Kirchner – pegou o país no contrapé e anunciou nesta sexta-feira (23), um dia antes de terminar o prazo para a inscrição das listas de pré-candidatos, que o ministro da Economia, Sergio Massa, vai liderar a chapa oficialista que concorrerá à Presidência representando a Unión por la Patria (UP), coalizão governista rebatizada durante o mês. Ao lado de Massa, considerado figura-chave na claudicante gestão econômica de Fernández, será lançado como vice-presidente o atual chefe de Gabinete, Agustín Rossi, outro nome prestigiado dentro da alta cúpula do Executivo. “Por responsabilidade institucional, política e social, decidimos formar uma lista de unidade que nos representará nas próximas eleições”, disse a UP nas redes sociais. O grupo político fez questão de citar Wado de Pedro, ministro do Interior, e Daniel Scioli, embaixador no Brasil, por “apostarem na unidade do peronismo, colocando o coletivo antes do individual” – os dois nomes pretendiam sair como pré-candidatos e falavam de suas respectivas candidaturas únicas apenas algumas horas antes do anúncio inesperado da noite de sexta. O caso envolvendo De Pedro é ainda mais impactante, já que o ministro havia sido recém-definido como o pré-candidato da ala kirchnerista do peronismo – que, como em vários momentos de crise interna nos últimos anos, acabou vencendo quedas de braços travadas dentro do governo e poderia despontar como favorito entre as nominações prévias. Com isso, a decisão quanto à liderança que tentará manter o peronismo no poder não mais vai precisar passar – apenas no que diz respeito à chapa presidencial – pelo crivo das Primárias, Abertas, Simultâneas e Obrigatórias, as tradicionais PASO, marcadas para 13/8. Passadas as primárias, os argentinos vão às urnas para de fato eleger o presidente, além de renovar Câmara, Senado e alguns outros votos provinciais, em 22/10. No Clarín e Página 12.
🇭🇳 Honduras: chacina em prisão feminina deixa 46 mortas e traz nova face ao drama carcerário no país – Tragédia colossal: inaugurando uma crise de segurança que parece estar apenas começando sob o governo de Xiomara Castro, um motim sem precedentes dentro de uma penitenciária feminina próxima à capital, Tegucigalpa, deixou pelo menos 46 detentas mortas, muitas delas queimadas vivas ou atacadas com golpe de machadinha. Não muito diferente das revoltas prisionais sangrentas que abalaram o Equador em anos de pandemia e da disputa que se vê há anos em El Salvador, o episódio que se iniciou na terça-feira (20) é fruto de um embate entre gangues, no caso as centro-americanas MS-13 e Barrio 18, dominantes dentro e fora das cadeias – a ficha criminal de muitas das vítimas, no entanto, sugere que algumas podem ter acabado morrendo no fogo cruzado, sem sequer estar envolvidas com as células criminosas. As circunstâncias da matança também levantam questões: segundo longa reportagem do La Prensa, há relatos de que a violência aconteceu com auxílio de guardas da prisão, que teriam “aberto os portões” no momento dos ataques, contam sobreviventes. Há também um forte indício de que tudo havia sido planejado há meses, levantando um debate geral sobre a administração das prisões e o contexto de superlotação em um país onde inimigos ferozes são separados por algumas paredes – e onde a lista de banhos de sangue nesses locais é longa. Episódio mais violento desde o início do atual governo, a rebelião ligou todos os alertas do poder público: declarando “emergência”, a vice-ministra de Segurança, Julissa Villanueva, autorizou “intervenção imediata” de militares e prometeu soluções enérgicas. Na quarta (21), após uma série de reuniões extraordinárias, Xiomara anunciou mudanças gerais na cúpula de segurança, deu ordens para que o Exército auxilie a Polícia Nacional e ampliou a duração e a abrangência do polêmico decreto de estado de exceção, vigente desde o último ano. As decisões aumentam a rigidez após uma série de outras medidas anunciadas em maio, como o bloqueio de celulares dentro dos presídios. Enlutado, o país também vê no horizonte uma chance de repetir o infame plano de “guerra às gangues” liderada pelo presidente Nayib Bukele, cujo modus operandi demolidor contra o crime organizado, a despeito de violações aos direitos humanos, parece cada vez mais encontrar na vizinha Honduras um terreno fértil.
🇳🇮 Lula promete interceder por bispos presos na Nicarágua – O presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva manifestou, na quinta (22), a intenção de conversar diretamente com seu homólogo nicaraguense Daniel Ortega para pedir a liberação de bispos católicos presos após entrarem na oposição ativa ao governo do país centro-americano. A fala de Lula veio em uma coletiva após um encontro com o papa Francisco, no Vaticano, em que o líder brasileiro afirmou que “não há motivos” para a perseguição sofrida pelo clero, mas admitiu que “não é fácil” ajudar nesse caso. Lula tem sido criticado pela reticência pessoal em se opor de forma mais enfática à escalada autoritária de Ortega, um aliado histórico do petista, embora seu governo venha tentando abranger os interesses de setores de oposição ao velho líder sandinista – bem antes das declarações desta semana, ainda em março, o Brasil se ofereceu para acolher dissidentes nicaraguenses que tiveram a nacionalidade retirada à força e manifestou preocupação com “relatos de sérias violações de direitos humanos” na Nicarágua. No G1.
🇵🇷 Porto Rico: autoridades vão à ONU por ‘emancipação’ — Mais de 60 entidades e representantes do governo de Porto Rico foram à ONU, na quinta (22), para defender – pela 41ª vez na história – o direito à livre determinação da ilha, pedindo que o governo dos Estados Unidos abra caminho para os porto-riquenhos determinarem seu futuro político. O Comitê de Descolonização da ONU aprovou por consenso uma nova resolução, praticamente idêntica às de anos anteriores, insistindo que a atual condição de estado livre associado à qual Porto Rico está submetido é “um ato de clara dominação colonial”. Embora repetida, a pressão simbólica agora encontra eco na prática: há um projeto em curso no Congresso em Washington para convocar um inédito plebiscito vinculante em que os porto-riquenhos poderiam por fim votar se querem manter a situação atual, tornar-se o 51º estado dos EUA ou se tornarem independentes. Apesar disso, sabe-se que os republicanos (contrários à medida) têm votos suficientes para barrar a lei e adiar outra vez a autodeterminação da ilha. Em 2020, numa votação sem caráter vinculante, eleitores porto-riquenhos indicaram preferência por se tornar um estado com plenos direitos dentro dos EUA. Em El Nuevo Día.
🇺🇾 Uruguai decreta emergência hídrica e Montevidéu terá água não potável nas torneiras – Os uruguaios já estavam tendo que beber água “salgada” em função da estiagem, após o governo rebaixar extraordinariamente o limites aceitáveis para consumo de sódio e outros componentes, e agora a situação piorou ainda mais: desde segunda-feira (19), a região metropolitana da capital Montevidéu está em estado de “emergência hídrica” para tentar driblar a escassez. Além de simplificar trâmites para bancar serviços e obras que ajudem a contornar a crise, a emergência deve reduzir ainda mais os padrões de qualidade da água disponível nas torneiras do país – e o próprio presidente Luis Lacalle Pou admite que, embora o fornecimento para uso cotidiano “esteja garantido”, é possível que o líquido disponibilizado não seja mais potável. De forma simultânea, o governo uruguaio também passou uma isenção de impostos para a água engarrafada, numa tentativa de aliviar o preço para a população obrigada a recorrer cada vez mais ao produto. Na CNN
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REGIÃO 🌎
Os governos de diferentes países da América Latina assinaram uma declaração conjunta pedindo a Joe Biden, presidente dos EUA, que apoie a Argentina na tentativa de refinanciar seu empréstimo de US$ 45 bilhões junto ao Fundo Monetário Internacional (FMI). A carta, divulgada na quinta (22), é assinada majoritariamente por países sob lideranças à esquerda, casos de Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia e México, além do Paraguai – que, embora não esteja do mesmo lado no espectro político, tem interesses diretos na viabilidade da economia do vizinho. Os argentinos vêm há tempos tentando rever as metas de pagamentos impostas pelo FMI, citando os impactos da pior seca do século sobre a última safra. Na carta, os países latinos enfatizam que “não é viável nem desejável” que o Fundo ignore a “mudança de circunstâncias”, mergulhando a Argentina em uma “crise desnecessária”. Via Estadão.
ARGENTINA 🇦🇷
A província de Jujuy, no norte da Argentina, está em convulsão social. No último dia 15, foi aprovada uma reforma constitucional na província que mexeu no direito à terra dos povos indígenas, no conceito de propriedade privada e proibiu bloqueios em estradas. Horas depois da mudança no texto legal, começaram os primeiros protestos e confrontos com a polícia. Alguns manifestantes adentraram na Assembleia Legislativa estadual e atearam fogo a uma sala. Desde então, ao menos 96 pessoas ficaram feridas, sendo 66 agentes de segurança, de acordo com informações do governo provincial — alguns jornais, porém, já falam em 170 feridos e 70 detidos. Em resposta, o governador Gerardo Morales revogou duas alterações em artigos relativos aos direitos indígenas e à propriedade privada. Mas manteve a restrição às manifestações em vias públicas: “são proibidos bloqueios de estradas, bem como qualquer perturbação ao direito de livre circulação de pessoas e a ocupação indevida de prédios públicos na província”, diz um dos artigos remanescentes. Os manifestantes seguem com as mobilizações. Segundo eles, a reforma constitucional ainda abre caminho para a mineração do lítio e a poluição da água. No Página 12.
BOLÍVIA 🇧🇴
Um governo “empenhado em nos dividir”, disse o ex-presidente Evo Morales (2006-2019) no domingo (18) a respeito de… Luis Arce, atual mandatário e seu antigo mentor econômico durante quase todo seu tempo de mandato. Mais um capítulo do longo livro de crises dentro do cada vez mais fraturado Movimento ao Socialismo (MAS), o partido governista, as falas de Evo foram direcionadas especificamente a Arce: segundo o ex-presidente, seu sucessor estaria caminhando para uma aproximação com setores conservadores ao entregar “mordomias para líderes de grupos renovadores”. O choque de visões dentro da legenda mais forte da Bolívia é antiga e também respinga nas representações do MAS no Congresso. No final do ano passado, Arce chegou a cobrar uma “reflexão interna” para evitar rusgas dentro do partido – mas, como se vê, as intrigas não devem acabar tão cedo. No Opera Mundi.
CHILE 🇨🇱
Aos 77 anos, morreu nesta terça (20) o antigo chofer e secretário pessoal do poeta Pablo Neruda, Manuel Araya Osorio, que na década passada se tornou figura central na reabertura das investigações sobre a morte do Nobel de Literatura: foi Araya quem veio a público, em 2011, afirmar que Neruda não teria morrido de câncer de próstata, mas envenenado no hospital após receber a inoculação de uma bactéria. A hipótese do assassinato do comunista Neruda pela nascente ditadura chilena – ele morreu apenas 12 dias após Augusto Pinochet tomar o poder – voltou a ganhar força no início de 2023, quando um grupo de especialistas entregou à Justiça um novo relatório reforçando a possibilidade de envenenamento. No entanto, apesar do tom definitivo adotado à época por alguns envolvidos no caso, o processo continua e ainda não há uma conclusão sobre as circunstâncias da morte do escritor. Nos meses entre a nova revelação e a morte, Araya chegou a dizer que era “a pessoa mais feliz” por finalmente ver sua versão ganhando crédito diante dos tribunais. Ele sofreu um AVC no último dia 12 e não resistiu às sequelas. No Infobae.
COLÔMBIA 🇨🇴
Uma derrota para os marihuaneros colombianos. A cannabis de uso recreativo não será legalizada na Colômbia — ao menos não por enquanto. Um projeto de emenda constitucional sobre o tema foi barrado por 47 votos a favor e 43 contrários no Senado, na terça-feira (20) — para passar com maioria qualificada, ainda seriam necessários mais sete votos. A senadora governista María José Pizarro, defensora da reforma, disse que a decisão “favorece a criminalidade e uma política proibicionista que fracassou completamente”. A mudança no texto tentava legalizar o mercado da maconha especificamente para fins recreativos — o consumo já é descriminalizado, mas a venda só é permitida para fins medicinais. Na CNN.
COSTA RICA 🇨🇷
Novo conflito na vida do presidente Rodrigo Chaves, agora contra as universidades do país, que convocaram manifestações durante a semana cobrando a manutenção do orçamento para a educação. Segundo entidades que foram às ruas, “o FEES (Fundo Especial para a Educação Superior) foi afetado pela inflação e nos últimos anos perdeu um valor real de 7,8% sobre as quantias recebidas”. Mesmo com as perdas alegadas, os manifestantes cobram um aumento de apenas 1%, que Chaves teria acordado com as entidades e depois deixado para o Congresso decidir, gerando revolta. Minimizando o tamanho das manifestações, o presidente também ironizou a demanda de reitores, sindicatos e estudantes, dizendo que tudo o que buscavam seria defender privilégios para que o alto escalão das universidades “coma filé e tome whisky como no Vaticano”. Em La República.
CUBA 🇨🇺
Em momento de franca aproximação diplomática, política e comercial (saiba mais no GIRO #184), os governos de Cuba e Rússia estreitaram um pouco mais os laços: na terça (20), representantes da ilha que estiveram em Moscou para uma nova rodada de negociações confirmaram acordos na área comercial, bem como a retomada da rota aérea entre os dois países, interrompida em função da guerra desatada pelos próprios russos no ano passado. Mas, se avanços bilaterais entre os dois históricos aliados não eram necessariamente uma novidade, um novo elemento se destacou no jogo geopolítico: a informação de que cubanos estariam sendo recrutados para lutar pelo Exército russo. Denunciado pela ONG Prisoners Defenders – notória crítica do governo cubano – como um mero envio de “mercenários”, a prática pode ser, segundo reportam veículos russos, uma troca feita entre Moscou e cidadãos cubanos, que receberiam quantias mensais em dinheiro e poderiam ganhar a cidadania russa em troca de se juntar às Forças Armadas do país euroasiático. Na AP e Infobae.
EL SALVADOR 🇸🇻
Os réus detidos pela tragédia no Estádio Cuscatlán, na capital San Salvador, serão alvo de uma nova acusação: na segunda (19), o Ministério Público do país anunciou que os cinco homens implicados no caso serão processados por “violação das regras de segurança em modalidade agravada”, o que garante que eles sigam presos de forma preventiva. No início de junho, eles haviam tentado um acordo financeiro com as famílias das vítimas para arquivar um primeiro caso e houve até uma ordem de soltura em favor dos cinco, mas o MP imediatamente recorreu para garantir que seguissem detidos – e, agora, abre caminho para que eles tenham novas contas a prestar à Justiça. Entre os presos, estão três dirigentes do clube de futebol Alianza, o mandante na partida, e dois administradores do estádio. Em 20/5, superlotação e problemas no manejo dos portões de acesso ao recinto provocaram a morte de nove pessoas em um clássico entre o Alianza e o Deportivo FAS (inicialmente, divulgou-se um número de 12 vítimas, mais tarde corrigido pelas autoridades). Via AFP.
EQUADOR 🇪🇨
Pelo menos está quase acabando: o presidente Guillermo Lasso, que dissolveu o Congresso e abreviou o próprio mandato com a convocação de eleições extraordinárias para 20/8, tem a pior avaliação de gestão na América Latina, entre 13 países avaliados pela CID Gallup. Na pesquisa, que ouviu 1,2 mil pessoas em cada país e foi divulgada na terça (20), Lasso conta com apenas 15% de aprovação, ficando atrás inclusive de nomes amplamente criticados como o venezuelano Nicolás Maduro (19%), o guatemalteco Alejandro Giammattei (22%) e a peruana Dina Boluarte (25%). No lado oposto do espectro, o levantamento voltou a confirmar a avassaladora popularidade do salvadorenho Nayib Bukele (90%), o primeiro colocado, e do mexicano Andrés Manuel López Obrador (75%). A pesquisa ouviu eleitores de Argentina, Colômbia, Costa Rica, El Salvador, Equador, Guatemala, Honduras, México, Nicarágua, Panamá, Peru, República Dominicana e Venezuela.
Dale un vistazo:
🤿 Mexicano conta como era a arriscada viagem ao Titanic – O mundo passou a semana acompanhando, entre chocado e incrédulo, a trágica jornada do grupo de ricaços que entrou no submarino da OceanGate em busca de uma vista exclusiva dos destroços do Titanic, a 4 mil metros de profundidade no Atlântico Norte. Após perder contato e ficar desaparecido por alguns dias, na quinta (22) a Guarda Costeira dos EUA confirmou ter encontrado destroços da expedição turística, com indícios de que o submersível teria implodido em função da pressão das águas profundas, provavelmente matando todos a bordo de forma instantânea. Enquanto as buscas prosseguiam, diversos registros apareceram, mostrando o pouco caso feito pela empresa em relação às normas de segurança e dando ao episódio uma sensação de crônica de uma tragédia anunciada. Em meio à profusão de conteúdos, fez sucesso também o relato do youtuber mexicano Alan Estrada, que registrou em detalhes e com vídeos como foi estar na “lata de sardinhas” em que os passageiros pagavam caro para arriscar a própria vida. Para Estrada, “[todos] tinham plena consciência dos riscos”. A parte em que ele mostra como foi mergulhar rumo ao Titanic, com relato em espanhol, pode ser vista no vídeo acima ou clicando aqui.
HAITI 🇭🇹
“O Haiti é esquecido de muitas formas”, alertou a diretora executiva do Programa Mundial de Alimentos (PMA) da ONU, Cindy McCain, durante uma visita à capital Porto Príncipe na terça (20). “É urgente que prestemos atenção”, reforçou. O PMA é um de dois braços da ONU, ao lado da Unicef, que voltaram a pedir olhares do mundo sobre a crise da nação caribenha, que vem atingindo níveis sem precedentes mesmo para os já atribulados padrões locais. As entidades afirmam que o Haiti hoje tem o segundo maior índice per capita de insegurança alimentar em níveis de emergência, com quase 5 milhões de pessoas sem garantia de que terão comida na mesa todos os dias – entre as crianças, mais de 115 mil com menos de cinco anos devem sofrer com desnutrição em 2023, um aumento de 30% em relação ao ano passado. “As necessidades humanitárias são maiores hoje do que após o devastador terremoto de 2010, mas com muito menos recursos para responder”, resumiu a diretora executiva da Unicef, Catherine Russell. As duas enviadas se encontraram com o premiê Ariel Henry e discutiram estratégias para driblar a crise alimentar, especialmente na infância, como o oferecimento de refeições para estudantes na escola. Via AP.
MÉXICO 🇲🇽
Um dos episódios mais infames no longo histórico de violência e desaparecimentos num país infelizmente acostumado a esses dois dramas, o caso do sumiço e massacre dos 43 estudantes de Ayotzinapa ganhou um novo capítulo: na quinta (22), oito militares foram detidos por suposto envolvimento na trama que ganhou fama nacional em 2014. A informação foi confirmada pelo subsecretário de Direitos Humanos Alejandro Encinas e dá conta de que os oficiais do Batalhão de Infantaria de Iguala, cidade onde parte do crime ocorreu, foram acusados de desaparecimento forçado e crime organizado. Como explicado pelo GIRO, no ano passado os holofotes se voltaram para militares da ativa, com pelo menos três nomes, incluindo um general, presos no âmbito do caso dos “43”. No entanto, várias acusações passaram a ser misteriosamente retiradas, gerando críticas por parte de entidades e do próprio subsecretário Encinas. Agora, com as novas implicações desta semana, já são 17 ordens de prisão reabilitadas, aumentando as pressões por reparação e Justiça. Na ADN.
PANAMÁ 🇵🇦
Uma megaoperação contra o narcotráfico prendeu 35 pessoas, na quinta-feira (22), incluindo 10 funcionários públicos panamenhos. Eles são acusados de ter participação no envio de drogas do país para a Europa e os EUA, dentro de contêineres, além de lavagem de dinheiro. A procuradoria antidrogas vem fechando o cerco sobre a colaboração local com os narcos, com o país – que é um entreposto entre a Colômbia, maior produtora de cocaína, e os EUA, seus maiores consumidores – registrando recordes no tráfico nos últimos anos: só em 2022, foram 138 toneladas de diferentes drogas apreendidas no Panamá. Via AFP.
PARAGUAI 🇵🇾
Caso bizarro e ainda mal explicado: um cidadão alemão usando um colete à prova de balas tentou invadir a embaixada dos EUA em Assunção, na noite de terça (20), e acabou preso pela polícia paraguaia. O homem, identificado como Philipp Kolberg, disse que temia pela própria vida e que estava em busca de asilo – no veículo, as autoridades também encontraram armas, munições, computadores, celulares, um drone e 21,7 milhões de guaranis (R$ 14,2 mil) em espécie, cuja origem ainda não foi determinada. A versão de Kolberg é que ele estaria tendo problemas com um austríaco após fazer uma série de denúncias em Villarrica, a 150 km da capital. A polícia diz que segue investigando o caso e desconfiando da história, já que o imigrante europeu também estaria “sob efeito” de alguma substância entorpecente quando tentou ingressar na embaixada. No Última Hora.
Una palabra:
Porro – Também chamado de bareto ou canuto, é o nome popular do cigarro de maconha em várias partes da América Latina. No Brasil, seria equivalente ao “baseado”. Mas o porro tem outros significados para além da Cannabis sativa: pode ser um sinônimo de alho-poró (conhecido como puerro) ou até um ritmo musical afro-colombiano típico dos departamentos de Córdoba, Sucre e Bolívar, com uma mistura de instrumentos de sopro e percussão. Se o porro for mal bolado, ainda pode ser chamado de empanada – devido ao formato da comida típica que, por sinal, ajuda a matar a larica.
PERU 🇵🇪
O ex-presidente Pedro Castillo (2021-2022) já está preso desde o ano passado após tentar (sem sucesso) fechar o Congresso. Agora, desde quarta (21), quem se juntou a ele foi sua ex-chefe de Gabinete, Betssy Chávez, acusada de conspirar para dar um golpe de Estado, delito similar ao que foi imputado a Castillo. A antiga funcionária – apenas uma entre várias à frente do Gabinete, já que o ex-mandatário vivia às voltas com o sistema político por ser recorrentemente forçado a reformular sua equipe de ministros – foi ‘encontrada’ pela polícia em sua cidade natal, Tacna, após iniciar uma transmissão no TikTok. Nas redes sociais, no entanto, garantiu que não vê problemas em passar um tempo atrás das grades, mantendo um discurso grandiloquente que ela mesma fez em março – já na mira da Justiça, ela disse à época que “não tem medo” já que pessoas como “Nelson Mandela, o presidente mais bem-sucedido e influente da África do Sul”, o ex-presidente uruguaio Pepe Mujica (2010-2015), “líder mundial da esquerda” e “até mesmo [o colombiano Gustavo] Petro” já estiveram no xilindró. Em El País.
É do Peru! Melhor restaurante da América Latina há algum tempo, o Central, em Lima, agora também é o melhor do mundo. O famoso estabelecimento ganhou o título supremo da gastronomia mundial na terça (20), em cerimônia promovida na Espanha pelo “World’s 50 Best Restaurants”, que também tem suas versões regionais. Com a atualização, um total de 12 restaurantes latino-americanos agora figuram entre os melhores do mundo, sendo quatro peruanos, três mexicanos, dois colombianos, um chileno, um argentino e o brasileiro Casa do Porco. Conhecido por oferecer uma experiência sensorial que passeia pelo variado bioma peruano e suas diferentes altitudes – dos frutos do fundo do Pacífico aos tubérculos andinos cheios de cor – o Central é também bastante ‘salgado’: um de nossos editores até tentou conhecer o local em março deste ano, mas desistiu pelos preços – e acabou indo no Mayta, 47º da lista global, que não deixou a desejar. Confira toda a nova lista no site do prêmio.
REPÚBLICA DOMINICANA 🇩🇴
O Canadá vai ampliar seus efetivos nas embaixadas de Porto Príncipe, no Haiti, e em Santo Domingo, na República Dominicana, assumindo a coordenação dos esforços para tentar aliviar a crise haitiana. O anúncio foi feito em conjunto na quarta (21) pelos governos canadense e dominicano, poucos dias após os dois países entrarem em desacordo sobre a forma como o envolvimento da nação norte-americana se daria: o Canadá chegou a falar em abrir um escritório próprio em solo dominicano para liderar a assistência ao Haiti, melindrando os caribenhos, que disseram nunca ter discutido um plano do tipo. A utilização da estrutura diplomática já existente virou a solução pactuada para resolver a breve crise, em um cenário em que o Canadá vem sendo pressionado há alguns anos pelos Estados Unidos para assumir protagonismo em Hispaniola. Via Reuters.
VENEZUELA 🇻🇪
Veto a exportações brasileiras para a Venezuela? Os grupos de WhatsApp até tentaram, mas o rumor foi devidamente desmentido pelo portal Aos Fatos na terça (21), após vários vídeos sugerirem que cargas vindas do Brasil haviam sido barradas na entrada do país vizinho. Na postagem viral, dizia a legenda que os governos de Luiz Inácio Lula da Silva e de seu homólogo, Nicolás Maduro, haviam imposto restrições ao comércio entre os dois países para “prejudicar a nação” brasileira. Em nota ao portal de checagem, o governo Lula, por meio do Itamaraty, informou que já agia para destravar as exportações que seriam fruto de bloqueios ocasionais – mas sem explicação. A questão veio à tona alguns dias após o governador de Roraima, Antonio Denarium, anunciar que conversou com Lula para resolver um assunto incômodo: segundo o político, empresários relatam problemas para levar produtos alimentícios ao lado venezuelano da fronteira desde janeiro, um golpe significativo na economia de um estado cujas exportações para o vizinho caribenho representam 80% do comércio. Segundo Denarium, Lula prometeu conversar com Maduro, com quem tem boa relação, para resolver o impasse.
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