🇦🇷 Governo Milei desmantela investigações de crimes da ditadura
Venezuela fecha embaixada no Equador em apoio ao México | Equatorianos votam referendo de segurança em meio a apagão | Chile e Bolívia confrontam Argentina por rumores envolvendo Hezbollah
⚠️ Antes de começar, reforçamos o lembrete: a partir de 4 de maio, o GIRO LATINO passará a ter um paywall (entenda tudo aqui). Antecipe-se, assine já e não perca seu resumo semanal da América Latina!
A presidenta da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Legislativa de Buenos Aires, deputada Victoria Montenegro, apresentou na última semana o que se tornou, só este mês, a segunda denúncia internacional contra o ministro de Segurança do governo de Javier Milei, Luis Petri. Ele é questionado judicialmente por demissões que apontam para o desmantelamento de órgãos responsáveis por investigar crimes da última Ditadura Militar (1976-1983) do país.
Montenegro, que já havia levado o caso às Nações Unidas no início de abril, formalizou um novo pedido ante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), mais uma vez destacando uma leva de desligamentos, consumada no final de março, que esvaziou completamente os postos das chamadas Equipes de Levantamento e Análise (ERyA). Criado em 2010 sob a gestão de Cristina Kirchner (2007-2015), o órgão atuava dentro do Ministério da Defesa vasculhando os papéis ocultos das Forças Armadas, buscando detalhes inéditos em crimes de lesa-humanidade.
Além de contribuir com o fortalecimento de denúncias na Justiça, o trabalho das ERyA foi fundamental para amalgamar a memória e o repúdio nacionais, tidos por anos como questões de Estado, ante os horrores dos anos de repressão – foi por meio do esforço desse grupo que muitos detalhes sobre sequestros, abusos sexuais, torturas e até sobre os infames “voos da morte” vieram à tona pela primeira vez, em pelo menos 170 longos relatórios.
“Expressamos a nossa preocupação e procuramos ajuda internacional diante dos atropelos do governo em questões relacionadas à verdade e à justiça. É importante ressaltar que a Argentina assumiu compromissos em nível internacional”, disse a deputada em entrevista ao Página 12.
Repetindo os discursos negacionistas do novo governo, Petri se referiu recentemente ao escritório desmantelado como “grupo que perseguia militares”, questionando o profissionalismo dos funcionários responsáveis, mas sem apresentar evidências.
Antes consenso para a sociedade e o sistema político argentinos, o repúdio coletivo aos tempos do regime passou por um forte revisionismo da extrema direita desde a eleição de Milei no ano passado.
Ainda que o país siga (até agora) punindo repressores, a exemplo de uma recente condenação de 10 ex-policiais à prisão perpétua por violações cometidas nos anos da ditadura, grupos de direita cada vez mais radicais têm vendido uma cruel reinterpretação dos fatos, minimizando os abusos do passado e tentando encerrar a luta por reparação – um problema que afeta países como o Brasil, visto como uma nação que pouco fez e faz para colocar antigos repressores na cadeia.
Prova maior do que se tornou o ‘assunto ditadura’ na Argentina atual foi vista em 24 de março, no primeiro aniversário do golpe militar sob a gestão Milei. Sem qualquer surpresa, a Casa Rosada, sede do governo, divulgou nas redes sociais um vídeo de 13 minutos que questionava os fatos históricos dos anos de repressão – sugerindo, por exemplo, que o número total de vítimas (entre mortos, torturados e desaparecidos) não seria de 30 mil argentinos durante os sete anos sob comando militar, uma cifra consolidada há décadas. A mensagem enfureceu os familiares das vítimas, organizações de defesa dos direitos humanos e diferentes setores políticos, além de gerar protestos, como contou o GIRO na edição #225.
Os sinais da ameaça representada por Milei às conquistas sociais e de memória vêm desde os tempos de campanha, quando o libertário chegou a chamar de “terroristas” as Mães da Praça de Maio – associação que até hoje procura familiares sequestrados pela ditadura. Mais adiante, o então candidato avisou que cortaria o número de ministérios pela metade – incluindo os de Educação e Cultura. Como se não bastasse, ainda escolheu como vice-presidenta Victoria Villarruel, ferrenha negacionista da ditadura – de família militar, Villarruel já demonstrou até intenções de propor projetos para indultar repressores atualmente presos, a quem se refere como “presos políticos”.
Seguindo a cartilha de qualquer governante direitista, Milei chegou ao poder sob a promessa de endurecer e ampliar sua agenda de segurança em busca de popularidade. Mas o policiamento ostensivo e a beligerância interna não parecem ser suficientes para saciar os ímpetos do extremista: na quinta-feira (18), Luis Petri, o mesmo ministro desinteressado em punir repressores, mostrou todo seu entusiasmo ao entregar ao secretário-geral adjunto da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), Mircea Geoana, uma carta manifestando o pedido formal da Argentina de se tornar um parceiro global da entidade (entenda).
O anúncio, outro nítido aceno à agenda militar ocidental, também dá indícios de que, enquanto a Casa Rosada for comandada por Milei e seus aliados, essas serão as prioridades – e, se depender da vontade nova gestão, os capítulos sobre a violência do Estado serão deturpados ou cairão no esquecimento.
Un sonido:
DESTAQUES
🌎Em solidariedade ao México, Venezuela fecha embaixada no Equador; Noboa diz “não se arrepender” de invasão criticada mundialmente – Como antecipado pela última edição do GIRO, a inconsequente operação policial equatoriana que irrompeu na embaixada do México em Quito no início de abril fez surgir uma crise diplomática com poucos precedentes na história – isolando o governo de Daniel Noboa na esfera internacional e desatando uma densa crise política interna (leia e entenda tudo). Mas tão grave foi o episódio que seus efeitos ainda são sentidos. Na terça-feira (16), quem deu um passo adiante no repúdio ao governo Noboa foi o presidente venezuelano Nicolás Maduro, anunciando o fechamento da embaixada de seu país no Equador em represália à operação de dias atrás. Segundo declarou o presidente durante um encontro virtual da Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), além da máxima representação venezuelana em Quito, também serão desativados um consulado na capital e outro na cidade costeira de Guayaquil. O líder chavista disse que tomou as decisões ante um “ato aberrante de prepotência” de seu homólogo equatoriano e criticou Noboa por “não dar as caras” na cúpula – na ausência do presidente, quem representou o Equador foi a também criticada chanceler Gabriela Sommerfeld. No mesmo dia, o presidente mexicano Andrés Manuel López Obrador compartilhou um vídeo agrupando declarações de vários de seus aliados latino-americanos em repúdio à postura equatoriana – ainda que as decisões mais enfáticas venham de Maduro, a gravação mostrou falas duras dos presidentes de Bolívia, Brasil, Colômbia, Cuba, Guatemala e Honduras. Apesar da pressão que se viu ao longo do mês, em uma entrevista divulgada na segunda-feira (15), Daniel Noboa descreveu sua ordem de invasão como uma “decisão difícil de ser tomada”, mas foi enfático: “não me arrependo”, garantiu, uma vez mais atacando seus pares mexicanos.
🇪🇨 Imerso em múltiplas crises, Equador reabre urnas para votação que pode endurecer leis de segurança – Enquanto a crise envolvendo a invasão da embaixada mexicana em Quito ainda ressoa – e uma intensa onda de apagões leva o governo a decretar emergência no setor elétrico (entenda) –, equatorianos também voltarão às urnas no domingo (21), pouco mais de seis meses após votarem para presidente em eleições antecipadas. Dessa vez, os mais de 13,6 milhões de eleitores habilitados deverão responder a 11 perguntas, sendo cinco delas em caráter de referendo (já que propõem mudanças em artigos específicos da Constituição) e outras seis no formato de consulta pública, apenas para guiar possíveis mudanças em leis já existentes. No total, 10 perguntas são de autoria do governo Noboa. Outra, redigida ainda nos anos do direitista Guillermo Lasso (2021-2023), chegou a ser aprovada previamente pela Assembleia Nacional em dezembro e trata da presença de militares nas ruas para apoiar a polícia no enfrentamento à alta criminalidade (o país viveu em 2023 o ano mais violento de sua história, com uma taxa de homicídios que cresceu mais de 500% em menos de uma década em função do aumento do crime organizado). Eleitores também vão manifestar opiniões sobre questões relacionadas a process os de extradição, endurecimento de penas para crimes de terrorismo e tráfico de drogas e controle de armamentos, entre outras coisas. O resultado do referendo é visto como crucial para as ambições políticas de Noboa, que já vislumbra uma briga pela reeleição nas eleições de 2025. Antes tentando vender uma imagem centrista, o endinheirado e mais jovem presidente da história do país tem embarcado – num misto de sobrevivência política e oportunismo – em discursos cada vez mais conservadores e de mano dura na segurança pública: além de colocar o tema no centro de sua jovem gestão, ele já se espelha no infame modelo do salvadorenho Nayib Bukele, com direito a projetos de mega-prisões de segurança máxima à moda de Bukele (inclusive usando o mesmo desenho e consultando as mesmas empresas) e uso das redes sociais para propagandear imagens de presos aglomerados. Com popularidade alta em seus primeiros 100 dias de governo, Noboa tem tudo para tornar essa estratégia o eixo de sua próxima campanha eleitoral, que não vai tardar – seu atual mandato, afinal, é tão curto porque só cumpre o restante do que seria o período original de Lasso.
🇧🇴 🇨🇱 Bolívia e Chile se unem contra denúncias (sem prova) da Argentina sobre presença do Hezbollah na região – A afinidade entre os governos de Bolívia e Chile e a gestão de Javier Milei já era zero. Mas tudo piorou após a ministra argentina da Segurança, Patricia Bullrich, denunciar (sem apresentar provas) na segunda-feira (15) a suposta presença do grupo libanês Hezbollah em várias regiões da América do Sul – mas como foco, precisamente, em locais próximos à fronteira entre o país transandino e as outras duas nações citadas. Em função do complicado histórico de relações entre a Argentina e o Irã, país que conta com o apoio do Hezbollah, Bullrich chegou a emitir um decreto de “alerta máximo” na divisa com a Bolívia, aumentando o rigor na checagem de documentos e passaportes. As manifestações argentinas desceram quadrado entre os vizinhos andinos, causando duras reações por parte de ambos. Dias depois, o chileno Gabriel Boric prometeu uma nota de protesto às falas de Bullrich, pedindo que a autoridade evite dar declarações alarmistas “sem provar absolutamente nada” e garantindo que o Chile “não protege nenhum grupo terrorista”. Já os bolivianos disseram por meio de sua chancelaria que as acusações da ministra “carecem de evidências” e são “equivocadas”. Dando um passo adiante, a chancelaria em La Paz também disse convidar “países latino-americanos irmãos a não cair em provocações que só buscam afetar relações de irmandade” na região. Pouco depois, a Argentina voltou atrás parcialmente. Bullrich telefonou para a ministra chilena do Interior, Carolina Tohá, transmitindo desculpas, negando as próprias alegações e dizendo que suas primeiras declarações foram dadas “no âmbito de uma análise da situação regional, dentro das funções de seu cargo”, seja lá o que isso signifique. Por fim, Boric aceitou as desculpas e deu o assunto como encerrado. Até o fechamento desta edição, porém, Buenos Aires não havia estendido a retratação a seus vizinhos do altiplano, levando a diplomacia boliviana a exigir um pronunciamento da mesma natureza.
🇭🇹 Conselho de Transição finalmente é nomeado, mas permanecem questões sobre quem vai liderá-lo – Foi publicado na quarta-feira (17) o decreto nomeando o Conselho Presidencial de Transição (CPT), órgão que vai governar na prática o Haiti e comandar a realização de eleições, que o país não celebra desde 2016 – o pleito não tem data concreta para acontecer, embora a expectativa seja de que o país chegue a fevereiro de 2026 com um presidente eleito e em condições de assumir. A nomeação do CPT foi longamente adiada, com vários grupos políticos em desacordo sobre sua composição, mesmo com o país permanecendo acéfalo nesse período: impedido de retornar ao Haiti após uma viagem para a África no final de fevereiro (quando tentava destravar o envio de uma missão policial queniana para ajudar com a segurança em Porto Príncipe), o primeiro-ministro Ariel Henry já havia anunciado sua renúncia em 12/3, mas oficialmente seguia no cargo até que o CPT fosse instalado – mesmo tendo passado todo esse período “preso” em Porto Rico. Apesar do decreto, observadores apontam que pode haver novas protelações até o Conselho efetivamente funcionar: o grupo ainda precisa eleger um presidente para guiar seus próprios trabalhos, e há temor de que as mesmas discordâncias que marcaram a montagem do CPT possam aparecer na escolha do líder – que poderia se tornar o homem mais poderoso do país em um contexto de falta de comando claro. O órgão começa com nove membros, sete dos quais têm direito a voto. Os nomes para se familiarizar daqui em diante: os sete votantes são Fritz Alphonse Jean (ex-presidente do Banco Central), Smith Augustin (ex-embaixador na República Dominicana), Edgard Leblanc (ex-presidente do Senado), Louis Gerald Gilles (ex-senador), Leslie Voltaire (ex-diplomata), Emmanuel Vertilaire (jurista) e Laurent Saint-Cyr (empresário que já integrou anteriormente o Alto Conselho de Transição, um órgão com funções semelhantes criado por Ariel Henry no início de 2023, mas que acabou fracassando). Já os integrantes sem voto no CPT são Regine Abraham, que já trabalhou no Banco Mundial e no Ministério do Meio Ambiente haitiano, e Frinel Joseph, um pastor evangélico. Via Reuters.
🇻🇪 EUA retomam sanções à economia venezuelana após hiato de seis meses – Como prometido, o governo dos EUA anunciou na quarta-feira (17) a reinstalação de sanções contra o setor energético venezuelano, meio ano após suspender provisoriamente as medidas como forma de pressionar o governo de Nicolás Maduro a cumprir um calendário eleitoral específico. Quando anunciado, o alívio provisório nas pressões, segundo a Casa Branca, visava garantir a participação de candidaturas da oposição, forçando a realização de eleições “livres e transparentes”, dizia o documento. Vale lembrar que tudo aconteceu próximo à assinatura de um acordo entre governo e oposição da Venezuela, firmado no final de outubro, em Barbados, e que previa a participação de observadores internacionais e uma espécie de trégua na política interna. À época, o processo foi exaltado pelos dois lados da mesa, contando com a intermediação de aliados regionais de Maduro. Mas o clima de paz não durou: pouco depois, uma sequência de crises eleitorais e políticas (entenda tudo no GIRO #225) reacendeu inimizades entre chavismo e oposição, tornando esperada a decisão estadunidense de, agora, retomar as sanções. Venezuelanos vão às urnas em 28/7. Mais detalhes sobre o que voltou a valer, no Efecto Cocuyo.
Atención:
MAIS NOTÍCIAS
COLÔMBIA 🇨🇴
Mais que amigos, hermanos: em nova mostra de afinidade política, os presidentes Lula, do Brasil, e Gustavo Petro, da Colômbia, reuniram-se em Bogotá a partir da terça (16), para uma série de compromissos. No dia seguinte à chegada de Lula, os dois líderes compareceram à Feira Internacional do Livro de Bogotá, um dos principais eventos culturais do país, e também trataram da assinatura de acordos bilaterais de cooperação. Segundo anteciparam funcionários do Itamaraty, Petro e Lula também inseriram na ata das conversas temas de interesse regional, como a recente invasão da embaixada mexicana no Equador (condenada por ambos), os rumos do Mercosul (bloco que o Brasil integra ao lado Argentina, Paraguai e Uruguai, e com o qual os colombianos se relacionam na condição de Estado associado), e assuntos relacionados à floresta amazônica e às eleições venezuelanas de 28/7 – os dois presidentes defenderam o diálogo e criticaram as sanções impostas pelos EUA à economia do país caribenho. É a segunda visita oficial de Lula ao país andino em seu mandato atual. No Opera Mundi.
COSTA RICA 🇨🇷
Números preocupantes para um país que, até pouco tempo atrás, era destaque mundial por passar vários dias consecutivos com produção de energia totalmente renovável. Nesse início de 2024, um cenário totalmente distinto: agora, cerca de 17,5% da eletricidade consumida na Costa Rica vem de usinas movidas a combustíveis fósseis como o diesel e o bunker (geralmente, usado em navios), um número muito mais alto do que parece ao primeiro olhar – até o ano passado, essa média ficava em 0,5%. Diante da demanda crescente de energia, especialistas costa-riquenhos questionam a demora da autoridade do setor elétrico do país em incorporar novas usinas hidrelétricas, solares e eólicas ao sistema nacional (hoje, há duas hidrelétricas fora de operação), o que poderia ser mais um reflexo do afastamento da “agenda verde” que o país tem vivenciado desde o começo do governo de Rodrigo Chaves. No Nación.
CUBA 🇨🇺
Na terça (16), Cuba retomou conversas com autoridades dos EUA sobre a questão migratória, em uma reunião realizada em Washington. Mas não houve avanços concretos: Havana colocou sobre a mesa a necessidade de alívio das sanções, argumentando que o impacto econômico é o que acaba levando milhares de cidadãos a abandonarem a ilha todos os anos, mas os estadunidenses – como de costume – não cederam. A delegação cubana aproveitou o encontro, ainda, para cobrar que o país seja retirado da lista de “patrocinadores do terrorismo” criada pelos EUA, e afirmou que a discussão foi “franca”, apesar dos poucos avanços. Foi a terceira vez que uma reunião de alto escalão entre representantes dos dois governos ocorreu desde o fim do mandato de Donald Trump (2017-2021), que barrou qualquer diálogo e reverteu uma série de flexibilizações nas relações bilaterais feitas durante os dias de Barack Obama (2009-2017). No Opera Mundi.
EL SALVADOR 🇸🇻
Com a autopromoção de sempre, o presidente Nayib Bukele participou na segunda-feira (15) da inauguração de um novo e imenso prédio que servirá de base para os mais novos escritórios do Google no país centro-americano. Recortando a paisagem de San Salvador, o faraônico edifício espelhado, que poderia facilmente ser visto na paulistana Faria Lima, dá sequência a acordos firmados entre o governo e a big tech no final de 2023. Na época, as partes concordaram em criar um plano para promover a digitalização de áreas-chave sob a alçada de Bukele, o que inclui a modernização de processos governamentais, da área da saúde e da educação, entre outros. Na mesma semana, outro fato que diz muito sobre a El Salvador de Bukele: jogador da Seleção Salvadorenha de futebol e do Club Deportivo Águila, Marcelo “El Chiky” Díaz, precisou fazer um apelo público pelas redes sociais na terça (16) para que o governo liberasse seu pai da cadeia. Garantindo que o pai foi preso por engano, reflexo da saga governista de prender quem estiver pela frente (alguns até já morreram sob custódia mesmo sem ter qualquer ligação com gangues), Díaz teve o pedido atendido e usou o mesmo X (antigo Twitter) para agradecer e manifestar “solidariedade a todas as famílias que estão passando por situações semelhantes”. Em ElSalvador.com.
GUATEMALA 🇬🇹
O genocídio de indígenas maias na Guatemala, ocorrido no final do século 20, ainda é uma ferida aberta num país onde quase metade dos habitantes se identifica como integrante de alguma etnia originária. Décadas depois do que ficou conhecido como o “Holocausto Silencioso”, quando comunidades guatemaltecas foram sistematicamente dizimadas por forças militares da ultradireita durante a Guerra Civil (1960-1996), entidades indígenas e vítimas da repressão do Estado seguem na luta por reparação – tudo enquanto confrontam intenções golpistas do presente. Esses dilemas e discussões são tema de uma nova e ampla reportagem dos editores deste GIRO para a Agência Pública.
Dale un vistazo:
📖Em agosto nos vemos (2024) – Mais novo romance do renomado escritor colombiano Gabriel García Márquez, morto em 2014, a obra póstuma conta a história da Ana Magdalena Bach, uma mulher que, perto de seus 50 anos, descobre um pouco mais sobre si toda vez que viaja anualmente a uma pequena ilha caribenha para colocar flores no túmulo da mãe. Dividida entre as frustrações e dilemas pessoais da vida que leva no restante do ano e a euforia do desejo, dos amores fugazes, dos anseios e decepções sexuais de suas passagens breves pela ilhota, a personagem narra os próprios passos num misto de culpa e esperança. A mais recente obra de Gabo, vale lembrar, foi publicada em 2024 contra as vontades do próprio escritor – e gera certa polêmica por isso. Em dado momento, ele chegou a sugerir que os rascunhos originais não prestavam e que “deveriam ser destruídos”. Mesmo assim, anos depois, os filhos do autor insistiram em levar a obra adiante, garantindo que os manuscritos eram mais completos do que se imaginava – e que uma demência senil, da qual o pai padeceu por anos, pode ter comprometido a interpretação de García Márquez sobre o próprio trabalho. A versão física em português é de tradução de Eric Nepomuceno e pode ser adquirida aqui.
HONDURAS 🇭🇳
A renúncia de Salvador Nasralla, o principal dos três “vice-presidentes” do país, foi anunciada por ele no último dia 10, mas o caso segue quente no coração da política hondurenha. Isso porque o Congresso do país pretende analisar a situação apenas na próxima terça-feira (23). Pelo X (antes Twitter), a conta oficial do legislativo informou na quarta (17) que, após uma reunião do presidente da Casa, Luis Redondo, com integrantes do partido de Nasralla, o Partido Salvador de Honduras (PSH), a renúncia seguirá “sob análise jurídica legislativa, para proceder o mais rápido possível e de acordo com a Constituição e as leis”. Apesar de ter anunciado um rompimento total com o governo da presidenta Xiomara Castro em agosto do ano passado (entenda a trama e saiba mais sobre o polêmico “vice” no GIRO #195), a nova decisão de Nasralla – que, para ser aprovada, precisa do voto de pelo menos 65 dos 128 deputados – atende um pedido da própria mandatária: em março, ela pediu que todos os integrantes de seu governo interessados em concorrer a cargos públicos nas eleições de 2025 renunciassem agora em abril. E assim fez Nasralla, anunciando à época sua saída, mas não sua “luta ao lado do povo hondurenho para recuperar Honduras da corrupção e da pobreza em que está mergulhada”. Em La Prensa.
MÉXICO 🇲🇽
Nos últimos anos, o governo mexicano tem investido – e alcançado relativo sucesso – em uma estratégia pouco típica em busca de formas mais criativas de enfrentar o narcotráfico: processar a indústria armamentista que, indiretamente, ajuda a engrossar o arsenal dos cartéis. As demandas judiciais contra fabricantes sediados nos Estados Unidos focam tanto no próprio tráfico de armas, que cruzam a fronteira com facilidade – estima-se que meio milhão delas entrem no México ilegalmente a cada ano – quanto no impacto que isso gera para o violento mercado de entorpecentes no lado mexicano. A matéria da Agência Pública explica com mais detalhes como o México vem questionando a estratégia dos fabricantes de armas de lavar as mãos quanto às consequências de seus produtos.
NICARÁGUA 🇳🇮
Há seis anos na quinta-feira (18), uma série de protestos contra o governo de Daniel Ortega (no cargo desde 2007) acabou sendo o marco fundador de uma escalada repressiva que o país jamais havia visto desde o triunfo da Revolução Sandinista, em 1979. Hoje, com vários ex-companheiros de armas denunciando o que passaram a definir como orteguismo (em contraposição ao sandinismo histórico) e inclusive tendo que se exilar, as manifestações são apenas uma vaga memória, com o presidente tendo se consolidado no poder ainda mais – em 2021, após a Justiça barrar vários pré-candidatos com alegações variadas, Ortega conquistou um novo mandato concorrendo sem oposição real. No sexto aniversário do que define como “Rebelião de Abril”, o portal opositor Confidencial (que também passou a operar do exílio) traz um balanço ouvindo pessoas que se envolveram no levante de 2018.
PANAMÁ 🇵🇦
A exatos 15 dias neste sábado (20) de realizar suas tão aguardadas eleições presidenciais, o país do istmo vive a expectativa da votação em meio a uma série de ziquiziras. Segundo as pesquisas mais recentes, a liderança nas intenções de voto segue com o Realizando Metas e Alianza, pacto político que, até pouco tempo atrás, cristalizava-se no poderoso e popular ex-presidente Ricardo Martinelli (2009-2014). Mas, por decisão de tribunais eleitorais, guiada por uma antiga condenação por corrupção que pesa contra o influente empresário, Martinelli foi impedido de concorrer – refugiando-se na embaixada da Nicarágua em seu país pouco depois, para evitar a prisão. Os rumos do seu projeto político, porém, são incertos: ainda que o ex-vice de chapa José Raúl Mulino tenha mantido o favoritismo do binômio após ser ‘promovido’ a presidenciável pela Justiça Eleitoral, panamenhos ainda aguardam uma decisão final da Corte Suprema de Justiça (CSJ), que pouco tempo atrás impugnou essa dança de cadeiras. No limite, caso a CSJ entenda que Mulino não pode se postular, o caso pode escalar para uma crise constitucional sem precedentes na história política panamenha, de acordo com especialistas. Na quarta (17), seis dos oito candidatos presidenciais participaram do último debate antes da votação. Entre os ausentes estava justamente Mulino, em função de sua incerta situação, e José Gabriel Carrizo, atual vice-presidente e candidato governista – quem condicionou a própria participação à presença de Mulino. Frente ao cenário nebuloso envolvendo Mulino, o atual presidente Laurentino Cortizo declarou em coletiva de imprensa que “como panamenho, acredito que todos os candidatos devam participar”.
PARAGUAI 🇵🇾
“Caso nepobabies”: uma investigação sobre nepotismo no alto escalão da política paraguaia vem ganhando as manchetes dos jornais, embora sem resultados práticos muito perceptíveis em termos de demissões de parentes de políticos com cargos bem remunerados. “Essa gente não para, os abusos seguem e isso se deve a uma falta de resultados”, reclamou na sexta-feira (19) uma das advogadas envolvidas em levar as denúncias ao conhecimento do Ministério Público, de quem cobra uma resposta mais rápida. Em um dos casos mais chamativos, descobriu-se que a filha de um deputado cartista ocupa um posto com salário de 21 milhões de guaranis (quase R$ 15 mil) na embaixada paraguaia no Reino Unido, mesmo sem contar com qualquer título universitário exigido de uma pessoa comum para realizar a função. No ABC Color.
Una palabra:
Luca – Em países onde é normal que os produtos do cotidiano custem um valor nominal de milhares de pesos, como a Argentina e o Chile, é comum ouvir que algo foi comprado por uma quantidade determinada de lucas. Custou três mil pesos? Me costó tres lucas. E assim por diante. A etimologia das “lucas” é um tanto apócrifa, mas a versão mais popular remete ao final do período colonial: isso porque a moeda equivalente a uma onça de ouro vinha com a efígie do rei espanhol Carlos IV (que liderou o país de 1788 a 1808) utilizando uma daquelas perucas tão em voga entre os aristocratas do período. Peruca, em espanhol, é peluca – e a moeda, que tinha um valor respeitável, ficou conhecida como pelucona. Com o tempo, as independências e as inflações, a palavra teria sido cortada para luca, e se convencionou a utilizá-la para se referir aos múltiplos de mil pesos (ou da outra denominação da vez).
PERU 🇵🇪
“Protejam a terra de vocês e não deixem que seja roubada”, disse o papa Francisco, no sábado (13), a respeito de uma antiga reivindicação de comunidades campesinas em San Juan Bautista de Catacaos, na região nortenha de Piura. A treta data de uma década atrás e envolve uma série de abusos judiciais e territoriais impostos aos habitantes da pequena cidade por empresas ligadas ao poderoso grupo católico Sodalício de Vida Cristã (SVC), fundado no Peru em 1971. Segundo os moradores de lá, em sua maioria fazendeiros de origem indígena, ações judiciais movidas por essas companhias, caso acatadas pela Justiça local, podem desalojar até 200 famílias que vivem ali e dependem dessa terra ancestral por várias gerações. As táticas utilizadas, garantem, são perversas – e contam com exaustivas pressões legais e tentativas de achar brechas em contratos de propriedades para avançar sobre o território. A comunidade também denuncia ser vítima de sicariato, com registros de invasão de homens armados contratados por empresários locais. Não há um prazo para o caso ser resolvido na justiça. O histórico de escândalos envolvendo o tal grupo católico é longo e vai muito além de San Juan Bautista: em 2023, o Vaticano enviou ao Peru uma comissão responsável por dar sequência a antigas investigações envolvendo uma densa trama de abuso sexual de menores, que tem o fundador do SVC, o peruano Luis Fernando Figari, no centro de tudo – após procuradores arquivarem o processo contra Figari em 2017, alegando que os crimes haviam prescrito, ele se refugiou em Roma e foi proibido pela Santa Sé de voltar a seu país e de aparecer em público. O Sodalício também é investigado por crimes de lavagem de dinheiro e evasão fiscal.
PORTO RICO 🇵🇷
A campanha eleitoral em Porto Rico ganhou um novo crítico mordaz nos últimos dias – o rapper Bad Bunny, que voltou seus canhões contra os candidatos da situação, o atual governador Pedro Pierluisi e sua oponente nas primárias internas, Jenniffer González. Definindo como uma “piada” a disputa entre os dois, o Conejo Malo comparou a corrida eleitoral ao filme The Campaign (2012), uma comédia em que dois candidatos rivais ao Congresso dos EUA tentam inúmeros truques e trapaças para derrotar o adversário. O porto-riquenho Bad Bunny, que chegou a ser o artista mais escutado do mundo no Spotify (acabou o ano superado por Taylor Swift), não é novato em opiniões políticas nas redes sociais – e até já produziu um clipe-documentário para denunciar a gentrificação urbana e os apagões no país; em 2019, ele esteve nos protestos que levaram à renúncia do então governador Ricardo Rosselló (2017-2019), e no ano seguinte incentivou que os jovens fossem às urnas, no pleito que acabou elegendo Pierluisi. Apesar das críticas aos políticos do atual governo, o músico – cujo nome real é Benito Antonio Martínez Ocasio – não endossou os opositores. No Metro Puerto Rico.
REPÚBLICA DOMINICANA 🇩🇴
Negligência médica em pauta: a Justiça do país está fechando o cerco contra planos e profissionais de saúde, com uma escalada de condenações por más práticas no atendimento a pacientes. Nesta semana, uma pena especialmente salgada chamou a atenção, quando um centro clínico foi obrigado a indenizar a família de uma paciente em 15 milhões de pesos (R$ 1,33 milhão). Outras condenações similares, embora com valores menores, também foram anunciadas desde o início de abril – em um dos casos, a pena confirmada pela Suprema Corte dominicana indenizou um paciente em 10 milhões de pesos (R$ 890 mil) por ter de amputar uma perna após contrair uma infecção bacteriana no hospital. Enquanto médicos protestam contra o que já definiram como uma “festa de condenações”, a lupa sobre os serviços de saúde parece ter um motivo de fundo: mais cedo no ano, autoridades sanitárias estadunidenses chamaram atenção para as mortes de cidadãos daquele país que buscam atendimento médico na República Dominicana (geralmente atrás de procedimentos estéticos baratos), lançando dúvida sobre os padrões de segurança empregados nas cirurgias. No Listín Diario.
URUGUAI 🇺🇾
O presidente Luis Lacalle Pou participou pessoalmente da inauguração de uma nova linha de trem no país, na terça-feira (16). À primeira vista, em um continente onde o transporte ferroviário parece viver um longo declínio há um século, pode soar um evento pitoresco, mas desta vez era mesmo uma via férrea com um grande interesse econômico: trata-se do Ferrocarril Central, nome dado a uma linha com 265 km de extensão que conecta a cidade de Centenario (vizinha à planta de celulose de Paso de los Toros) ao porto de Montevidéu, que vai escoar a produção. A linha, idealizada em 2019, já estava em operação “não oficial” desde o começo de abril, mas foi só depois que o presidente cortou a fita que o primeiro comboio completo saiu da estação – 26 vagões com mais de 1,6 mil tonelada de pasta de celulose. Ao todo, US$ 40 milhões foram investidos na ferrovia, que se gaba de ser a primeira a conectar o interior do país diretamente ao porto da capital após um hiato de três décadas. No Ámbito.