Equador terá eleição sob estado de exceção após assassinato
Engolido por onda de violência desde a pandemia, país viu cenário recrudescer após assassinato de presidenciável Fernando Villavicencio; governo põe país em estado de exceção, mas garante eleições
Antes de virar o tema de abertura desta edição, as eleições equatorianas, previstas para o próximo domingo (20), seriam descritas por este GIRO da seguinte forma: “mais do que instigados pela votação em si, eleitores irão às urnas assolados pelo medo”. O resumo, porém, passou a ser insuficiente a partir da quarta-feira (9), quando o jornalista e ex-parlamentar Fernando Villavicencio, um dos oito candidatos à Presidência este mês, foi morto a tiros na saída de um comício em Quito, capital do país. Tudo aconteceu muito rápido: pouco após os disparos fatais, realizados por um sicário que também acabou morto em circunstâncias ainda mal explicadas, o presidente Guillermo Lasso decretou 60 dias de estado de exceção, estabeleceu luto nacional e, por fim, afastando rumores inevitáveis, bradou: “as eleições não serão suspensas”.
A partir desta semana, é essa a pergunta que segue no ar em terras equatorianas: se o país terá, de fato, clima ou condições para abrir a votação daqui a exatos oito dias, a contar da data de publicação desta newsletter. Inicialmente, o presidente chegou até a restringir o direito à liberdade de reunião como parte do decreto de exceção, mas depois voltou atrás, entendendo que a medida inviabilizaria a realização de novos eventos de campanha. Após o anúncio de Lasso, o Ministério da Defesa garantiu que as Forças Armadas estarão “em estado de alerta” para garantir a realização do processo, numa tentativa de tranquilizar a população – que não terá escolha senão sair de casa, já que, no Equador, o voto é obrigatório para cidadãos com menos de 65 anos. Mesmo assim, não é possível garantir que o país esteja livre de novos crimes na corrida eleitoral: só este ano, um total de seis políticos equatorianos foram assassinados, incluindo o prefeito da cidade portuária de Manta, Agustín Intriago – segundo um assessor de campanha de Villavicencio, as duas mortes teriam sido ordenadas “pelos mesmos grupos narcos”. Na quinta (10), um dia depois do atentado contra o presidenciável, a candidata ao Congresso Estefany Puente – que concorre pela coalizão Claro Que Se Puede, que lançou Yaku Pérez à Presidência – foi alvo de um ataque a tiros contra seu carro de campanha e saiu ferida. Não havia informações sobre possíveis autores até o fechamento desta edição.
Enquanto autoridades seguem bancando o pleito, outras dúvidas cercam os dias posteriores ao crime: primeiro, qual será o destino da chapa até então liderada por Villavicencio – segundo as regras, o posto não poderá ser assumido por sua vice, a ambientalista Andrea González, o que obrigaria os líderes do movimento Construye e Gente Buena, caso queiram se manter na disputa, a submeter um novo nome (obrigatoriamente do próprio partido) às autoridades eleitorais. O impedimento de González de chegar à titularidade se dá por uma peculiaridade legal: no Equador, as candidaturas são “irrenunciáveis”, o que significa que uma pessoa precisa concorrer até o fim ao mesmo cargo pelo qual postulou inicialmente (no caso dela, ao cargo de vice-presidenta).
Antigos integrantes do Tribunal Supremo Eleitoral (TSE) ouvidos pela imprensa local, no entanto, não descartam a possibilidade de que novas inscrições (ainda que feitas de forma legal diante da morte do candidato) acabem impugnadas a pedido de outras chapas ou não sejam confirmadas pela Justiça em tempo hábil. Para esses casos, a lei não estabelece um prazo mínimo para a candidatura ser apresentada ou confirmada, e resta confiar que impere o bom senso, já que uma chapa sem um nome para a Presidência, em tese, estaria impedida de ter a votação validada, mesmo que um candidato fosse homologado depois. O impasse seguia sem resolução até o fechamento desta edição.
Para além das questões meramente eleitorais, o país quer saber: quem mandou matar Fernando Villavicencio? Ainda não há uma resposta oficial: ao menos seis suspeitos (todos de nacionalidade colombiana, segundo as autoridades) foram detidos, mas vários indícios apontam possíveis caminhos de investigação. O próprio candidato chegou a dizer em mais de uma oportunidade que recebeu ameaças de morte enviadas supostamente por integrantes do grupo criminoso Los Choneros, considerado o braço equatoriano do temido e poderoso cartel mexicano de Sinaloa – de forma geral, o avanço do narcotráfico mexicano é visto como um dos fatores determinantes para o aumento vertiginoso da violência no Equador nos últimos anos. No começo do mês, um dos coordenadores de Villavicencio relatou que também foi alvo de ataques virtuais – “já sei que você é da segurança, de hoje você não passa… estou te vigiando”, dizia a mensagem, supostamente enviada por um chonero de um número indonésio.
Sem surpresas, o caso também respingou na política: Verónica Sarauz, viúva do presidenciável morto, acusou (sem apresentar evidências) o grupo político correísta – ligado ao ex-presidente Rafael Correa (2007-2017) – e também uma ex-senadora denunciada pelo candidato de estarem por trás do crime. Villavicencio chegou a ser aliado de Correa no passado, mas logo se tornou mais conhecido por ser defensor da bandeira anticorrupção do que por um alinhamento ideológico com o então presidente. E, com o tempo, ele mudou de lado e se tornou um notório anticorreísta – em 2014, após ser condenado por injúrias contra Correa, chegou a fugir para a Floresta Amazônica para escapar da sentença, refugiando-se em uma aldeia indígena até ser perdoado em 2017 pelo então presidente Lenín Moreno, que rompeu com Correa após ter atuado como seu vice durante vários anos.
Enquanto todas essas lacunas seguem abertas, equatorianos vão, apreensivos, contando os dias até o primeiro turno das eleições antecipadas – que, vale lembrar, são por si só fruto de uma outra crise, como contado em maio pelo GIRO. Nas pesquisas mais recentes, quem segue na frente como favorita para ir ao segundo turno ainda é a ex-parlamentar Luisa González, candidata correísta. Já a disputa pelo segundo lugar segue aberta, com novos números positivos em agosto para o empresário conservador da área de segurança Jan Topić – que, com campanha totalmente centrada no combate à criminalidade, pode até se ver beneficiado pelo atentado da última quarta-feira, como costuma acontecer com políticos conservadores no continente. Se tudo der certo, este primeiro capítulo eleitoral deve se encerrar em alguns dias; a violência que sequestrou o país, porém, vai precisar de mais do que algumas decisões para sair de cena. Até porque um provável segundo turno acrescenta quase dois meses de – arriscadas – campanhas ao calendário equatoriano: a nova rodada de votação ocorreria só em 15/10.
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🇦🇷 Primárias argentinas: morte de menina de 11 anos domina pauta eleitoral às vésperas da votação – Na mesma quarta-feira (9) em que o Equador viu um candidato presidencial ser assassinado em via pública, a Argentina chorou o brutal latrocínio de uma menina de apenas 11 anos em Lanús, na província de Buenos Aires. Por volta das 7h30 (hora local), dois assaltantes abordaram Morena Domínguez, que depois foi agredida e arrastada pela rua próxima à escola dela. Câmeras de segurança registraram o momento da agressão e a fuga dos motochorros. Dois suspeitos foram detidos. A cena comoveu o país – e também os pré-candidatos punteros nas pesquisas, que suspenderam suas campanhas a poucos dias das primárias, mais conhecidas como PASO, que ocorrem neste domingo (13). A primeira a tentar capitalizar com o crime hediondo foi Patricia Bullrich, ex-ministra de Segurança Pública e pré-candidata pela coalizão de direita Juntos por el Cambio (JxC): “transformaram a Argentina em um país inabitável”, escreveu nas redes sociais. Bullrich havia marcado o evento final da campanha justamente em Lanús, na quinta-feira (10), mas antecipou o encerramento. Horacio Rodríguez Larreta, rival direto dela na coalizão, seguiu o mesmo caminho. Já Sergio Massa, atual ministro de Economia e principal nome do peronismo pelo Unión por la Patria, gravou uma mensagem direcionada à família e citou outros casos de violência ocorridos ao longo do dia. Massa também aproveitou a oportunidade para tentar capitalizar politicamente com o caso: “em 2009, mataram um garoto perto da minha casa. Fiquei marcado para sempre e decidi que Tigre, minha cidade, seria a mais segura da Argentina”, contou o ministro antes de listar seus feitos na segurança pública enquanto prefeito do município. Seu rival direto nas primárias, o sindicalista Juan Grabois, também comentou a morte da menina e pediu um basta à violência e à “indiferença” com a vida dos outros. No Página 12.
🇧🇴 Busca por megatraficante foragido na Bolívia já tem 44 investigados, atinge igrejas e até clube de futebol – As autoridades bolivianas passaram a semana fechando o cerco contra as pessoas envolvidas com o megatraficante uruguaio Sebastián Marset, cujos negócios parecem ter firmado raízes profundas em diferentes setores do país do Altiplano. Com direito a visitas de vice-ministros de Estado da Bolívia para obter informações no próprio Uruguai, no Paraguai e no Brasil, La Paz foi capaz de desbaratar um esquema que se envolveu com empresas, igrejas evangélicas e até clubes de futebol – jogadores uruguaios e o presidente do clube Blooming, de Santa Cruz de la Sierra, foram detidos nos últimos dias, como parte das buscas para chegar ao paradeiro de Marset (até o fechamento desta edição, ele seguia foragido, após uma grande operação em 29/7 tentar sem sucesso capturá-lo em solo cruceño – desde então, quatro veículos que teriam sido utilizados pelo narco em sua fuga já foram encontrados abandonados em diferentes pontos de Santa Cruz). Marset, que também é procurado pela Interpol e pela agência antidrogas estadunidense, a DEA, já usou identidade falsa brasileira – sob o nome Gabriel de Souza Beumer – e poderia estar envolvido no assassinato do promotor paraguaio Marcelo Pecci, uma trama internacional que segue com várias pontas soltas. Até sexta (11), segundo o ministro de Governo boliviano Eduardo del Castillo, as autoridades do país já haviam realizado operações de busca e apreensão em 52 imóveis vinculados a Marset, com ao menos 44 pessoas investigadas por suposto envolvimento com a organização criminosa. Em El País.
⚽ Colômbia entre as oito melhores do mundo na Copa feminina – A história seguiu sendo feita: na terça (8), a Colômbia superou a Jamaica pelo placar de 1 a 0 e avançou para as quartas-de-final da Copa do Mundo de futebol feminino, confirmando a melhor campanha de sua história e levando adiante a última bandeira da América Latina na competição que é jogada na Austrália e Nova Zelândia – todas as outras seleções da vizinhança, incluindo o Brasil, caíram ainda na fase de grupos do torneio. Com a disputa afunilando, o próximo desafio das colombianas é também o mais difícil até agora: neste sábado, a partir das 7:30 da manhã em Brasília, a equipe cafetera medirá forças com a Inglaterra, atual campeã europeia e favorita nas casas de aposta para conquistar o título mundial. Na fase anterior, esperança: precisando contornar uma expulsão, as inglesas sofreram mais do que o esperado e superaram a Nigéria apenas nos pênaltis, após um empate por 0 a 0 com a bola rolando. A tarefa é complicada, mas, em qualquer cenário, a Colômbia já colocou seu nome na história: o país, que só tinha uma vitória em Copas antes deste ano, já ganhou três partidas no atual torneio, e vai superar o 12º lugar geral obtido em 2015, seu recorde até agora. No GE.
🇨🇴 EUA condenam narco colombiano a 45 anos de prisão – Fim da linha: na terça (8), um tribunal dos Estados Unidos condenou a 45 anos de prisão o narcotraficante e ex-chefe do grupo paramilitar Clã do Golfo Dairo Antonio Úsuga, conhecido pelo codinome “Otoniel”. A decisão foi confirmada alguns meses após o narco admitir, em janeiro, ter contrabandeado toneladas de cocaína, entre outros crimes relacionados. As penas serão cumpridas de forma simultânea. Além de concordar em pagar mais de US$ 200 milhões como parte de seu acordo judicial, Úsuga fez uma espécie de “mea culpa” diante da justiça – pediu desculpas “à Colômbia, aos EUA e às vítimas” pelos crimes que cometeu. Nascido em um contexto de violência, Otoniel ganhou notoriedade até atingir o alto escalão das organizações armadas, mais tarde se juntando ao Clã do Golfo – que é apontado como detentor de uma das maiores fatias do narcotráfico colombiano. Considerado o rosto mais procurado de seu país até sua prisão em 2021 – à época comparada pelo então presidente Iván Duque (2018-2022) à queda do famoso Pablo Escobar, antigo líder do cartel de Medellín – ele acabou extraditado aos EUA em maio de 2022, gerando uma onda de violência que deixou vários mortos. Após conhecer sua sentença, Otoniel enviou uma curiosa carta ao presidente Gustavo Petro – que não havia comentado o assunto até o fechamento desta edição.
🇭🇹 Haiti: após rumores de intervenção, semana tem protesto e fim de sequestro de enfermeira – Enquanto o Haiti aguarda a confirmação da chegada da comitiva queniana para avaliar a situação do país rumo a uma eventual intervenção internacional (leia mais), a semana começou com uma manifestação na capital Porto Príncipe, cobrando mais segurança. Milhares de pessoas marcharam na segunda-feira (7), grande parte com os rostos cobertos para não revelar a própria identidade, pedindo uma resposta das autoridades e exaltando ações violentas de autodefesa – muitos gritavam “Bwa Kale” (saiba mais em Una expresión), uma referência direta a episódios registrados mais cedo em 2023, quando grupos populares se reuniram para linchar supostos criminosos sob o olhar conivente da polícia. Sem solução imediata para os problemas de fundo, a boa notícia dos últimos dias foi a liberação – sem ferimentos e em boas condições de saúde – de uma enfermeira estadunidense e da filha dela, que estavam no país como parte de uma missão humanitária e haviam sido sequestradas no final de julho. Via AP.
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ARGENTINA 🇦🇷
Começou como represália pela repetição de gestos racistas feitos por torcedores argentinos contra brasileiros, mas acabou virando um problema por si mesmo – e agora até punições criminais podem entrar em cena. Zombando da situação econômica dos vizinhos, fãs de futebol brasileiros começaram a rasgar cédulas de pesos nas arquibancadas dos estádios da Argentina, como forma de provocação pelo baixo valor da moeda hermana em tempos de inflação acelerada. Nesta quinta (10), a Agência de Prevenção da Violência no Esporte (Aprevide) de Buenos Aires anunciou que vai começar a pedir a prisão de quem fizer isso: segundo a entidade, a ação configura uma violação nos termos da lei que rege o comportamento em eventos esportivos, já que poderia incitar a violência e “prejudicar o normal desenvolvimento” da partida, causando “perturbações à ordem pública”. A pena prevista é de cinco a 20 dias de prisão e suspensão de frequentar até 10 jogos no país. Sobre os rotineiros atos racistas das próprias torcidas argentinas, que também poderiam ser considerados contrários à norma, porém, a Aprevide não se manifestou. No GE.
CHILE 🇨🇱
Cena inusitada em frente ao palácio de La Moneda, na manhã de quinta-feira (10): o presidente Gabriel Boric em pessoa saiu de seu escritório e pegou um megafone para conversar com um grupo de manifestantes que protestava diante da sede do governo no centro de Santiago. O reclame da vez vinha de um grupo que luta pela moradia, apontando o déficit habitacional que afeta o país e, nos últimos anos, fez disparar o número de ocupações e casas improvisadas nos arrabaldes das grandes cidades. Boric ressaltou a importância do “povo organizado exigindo seus direitos” e reafirmou que seu governo vai cumprir a promessa de entregar 260 mil moradias até o final de seu mandato, em março de 2026. A intervenção do presidente acabou caindo nas graças dos surpresos manifestantes e terminou em selfies, dando um breve respiro em meio a mais uma crise atravessada pela gestão de esquerda – que estava às voltas com uma acusação constitucional que tentava derrubar o ministro de Desenvolvimento Social, Giorgio Jackson, um dos nomes fortes do gabinete de Boric e há tempos no alvo da ultradireita ligada a José Antonio Kast (o presidenciável derrotado pelo próprio Boric em 2021). Jackson balançava exatamente por contratos firmados para a construção de moradias, que a oposição acusava terem indícios de corrupção com conhecimento do ministro, enquanto o governo alegava que a medida era uma “cortina de fumaça” e que os adversários políticos “improvisam seus argumentos” – apesar das defesas, porém, Jackson não quis enfrentar o desgaste de uma possível destituição e entregou o cargo na noite de sexta. Em El País.
COSTA RICA 🇨🇷
Para não depender da boa vontade alheia: na quinta (10), começou a operar um novo serviço de balsas conectando a Costa Rica a El Salvador, com a promessa de baratear – e encurtar – as travessias de veículos entre os dois países, que não são limítrofes. Por terra, é preciso passar por Honduras e Nicarágua, o que também gera problemas se um deles decide fechar as fronteiras por algum motivo: foi o que ocorreu, por exemplo, quando o governo nicaraguense impôs normas rígidas durante a pandemia, basicamente cortando qualquer contato terrestre entre a Costa Rica e países ao norte dela do mapa. O novo trajeto por mar tem quase 700 km e, segundo os responsáveis, não tem o objetivo de excluir a Nicarágua, mas oferecer uma alternativa. “Os dois sistemas vão coexistir”, garantiu uma representante do setor de exportações salvadorenho. Na BBC.
CUBA 🇨🇺
A buena ola de relações não para: a pedido do presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, seu assessor especial de Assuntos Internacionais, Celso Amorim, viajará à capital de Cuba na próxima terça (15), numa viagem de uma semana que servirá para intensificar a retomada diplomática entre os dois países, após quatro anos de silêncio sob Jair Bolsonaro (2019-2022). Dessa vez, há a expectativa de que Amorim se encontre com o presidente Miguel Díaz-Canel, ainda que a reunião não esteja confirmada. Mais cedo este ano, Lula também designou um novo embaixador em Havana, reatando os “laços rompidos” com a ilha. N’O Globo.
O calor escaldante vivido no verão do Hemisfério Norte também foi sentido em Cuba: de acordo com o Instituto Meteorológico do país, julho teve os registros mais altos de temperatura na ilha desde 1951. O calor recorde afetou não apenas o território cubano, mas os mares ao redor, com a média do mês ficando em 29,1 °C, e picos muito acima disso. Uma das preocupações é a dificuldade do sistema elétrico, já conhecido por seus apagões em épocas quentes em função da dificuldade de renovar a infraestrutura, em lidar com uma situação inédita no contexto pós-Revolução. Via Reuters.
EL SALVADOR 🇸🇻
Momento raro: um representante do governo de Nayib Bukele aceitou conceder uma entrevista ao jornal El Faro, veículo investigativo que se notabilizou por denúncias contra o popularíssimo – e cada vez mais autoritário – presidente. Desta vez, quem falou foi Andrés Guzmán, um jurista colombiano que desde o fim de maio ocupa o cargo de “comissário presidencial” para os Direitos Humanos e a Liberdade de Expressão em El Salvador. Acusado por muitos de ser um fantoche a serviço dos desmandos de Bukele, Guzmán chegou a defender em eventos internacionais de direitos humanos que não existiria tortura em solo salvadorenho. Agora, na entrevista veiculada segunda-feira (7), ele admite que fez a afirmação sem ter visitado qualquer presídio ou falado com detentos, e nem mesmo solicitado documentos ao Ministério Público sobre possíveis mortes em custódia do Estado. É apenas a segunda vez que um membro da gestão de Bukele conversa com El Faro – a outra ocorreu ainda no início do governo, em 2019.
GUATEMALA 🇬🇹
Primeiro, foram vários partidos que, valendo-se de acusações de fraude, conseguiram adiar a oficialização dos resultados do primeiro turno e gerar uma recontagem nacional; depois, quem resolveu colocar lenha na fogueira eleitoral foi o sempre polêmico Ministério Público, que chegou a suspender o partido Semilla, que disputa o segundo turno (decisão depois revertida); durante a semana, porém, virou bagunça: na terça (8), quem resolveu apresentar uma ação diante da Corte Constitucional (CC) do país foi um grupo de cidadãos, que, na qualidade de eleitores comuns, apontam irregularidades de violações legais nas eleições como um todo. Alegando problemas em centros de votações, nas atas e na apuração, entre outras supostas “inconsistências”, os tais cidadãos dizem que esse cenário demonstra a “nulidade absoluta” da jornada eleitoral. Mas, deve ficar por isso mesmo: se nem o temido MP conseguiu tirar novos candidatos do jogo, é improvável que um grupo de eleitores pouco conhecidos consiga alguma mudança de fato. Guatemaltecos vão às urnas no dia 20, sem debates entre os dois candidatos e ainda sentindo a ressaca da crise eleitoral, como explicado pelo GIRO. Na Prensa Libre.
HONDURAS 🇭🇳
“Não há condição para um golpe de Estado em Honduras”. Ouvindo assim, até parece que há uma crise em andamento. Mas, num país escaldado, e onde recentemente até um museu da memória foi inaugurado na capital para relembrar o terror da crise que forçou a destituição do ex-presidente Manuel Zelaya – marido da atual presidenta Xiomara Castro – em 2009, nunca se sabe. As falas também não vieram de qualquer um: quem deu a declaração chamativa, na terça (9), foi o secretário da Presidência, Rodolfo Pastor de María, em resposta a uma série de rumores a respeito de um suposto golpe à espreita. Tudo começou em abril, quando um deputado da oposição sugeriu que “alguns setores conservadores e radicais” tanto “da esquerda quanto da direita” estariam interessados em derrubar Xiomara e instalar uma Assembleia Nacional Constituinte (ANC), órgão suprapoderoso capaz de redigir uma nova Constituição e dar um novo ordenamento jurídico ao país (na Venezuela, a criação de uma ANC em 2017 foi vista como um pretexto para esvaziar as funções do Congresso, à época dominado pela oposição ao chavismo; o órgão excepcional encerrou atividades em 2020, sem jamais ter proposto uma nova Carta Magna). De volta a Honduras, Pastor de María negou os boatos, mas completou dizendo que, ainda que o clima de golpe não exista, “isso não quer dizer que não existam setores interessados” em passar essa percepção. Na Prensa.
Una expresión:
Bwa Kale – Expressão em créole haitiano que remete ao ato de “arrancar a casca” de uma árvore e se tornou o nome informal de um “movimento” de autodefesa violenta em regiões dominadas por gangues em Porto Príncipe: moradores de regiões afetadas pelo crime organizado começaram, nos últimos meses, a se reunir para “reagir” linchando supostos criminosos, aproveitando-se da passividade das autoridades – críticos apontam que, no fim das contas, os bwa kale correm o risco de simplesmente se tornar outro tipo de gangue em meio à violência descontrolada no país. A ideia por trás do nome Bwa Kale é simbólica, mas também traz uma certa literalidade, fazendo menção aos pedaços de pau afiados que são utilizados em ações do tipo, juntamente com armas “convencionais”.
MÉXICO 🇲🇽
Sonho para argentinos e venezuelanos, carta fora do baralho para o México: durante conferência de imprensa realizada na terça (8), o presidente Andrés Manuel López Obrador descartou as possibilidade de ingresso nos Brics, bloco econômico que reúne as economias de Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Afastando rumores, AMLO reforçou que, no momento, o foco de sua gestão está em aprimorar as relações com os vizinhos EUA. “Claro, comemoramos que outros países entrem no grupo. No entanto, por razões de proximidade, geopolítica, continuaremos fortalecendo a aliança com a América do Norte e com todas as Américas”, completou. O mandatário declarou que, em maio, o México passou a China e se tornou o primeiro parceiro comercial da maior potência norte-americana. No total, Canadá e EUA são destino de 85% das exportações mexicanas. Via EFE.
NICARÁGUA 🇳🇮
Vai ter Censo: assim decidiu o governo de Daniel Ortega na quarta (9), confirmando por meio de um decreto a realização de um recenseamento demográfico em todo o território nacional a partir de 2024. O plano, que será de responsabilidade do Instituto Nacional de Informação de Desenvolvimento (Inide), chama a atenção pelo hiato: já são 18 anos sem Censo, o que torna a contagem anunciada a primeira sob a atual gestão Ortega, que voltou ao poder – após governar o país no período posterior à Revolução Sandinista – em 2007. O governo fez um apelo para que todos os setores “colaborem com as autoridades” quando o pessoal do Inide passar a percorrer o país para iniciar a atualização estatística. Além de uma recontagem populacional, a entidade vai medir dados habitacionais e agropecuários. O assunto parece simples – mas não é: na Bolívia, polêmicas envolvendo o Censo geraram protestos. No Confidencial.
PANAMÁ 🇵🇦
Como era de se esperar, o cada vez mais descontrolado número de travessias pelo trecho selvático de Darién, corredor que conecta a América do Sul à porção central do continente, espirrou na diplomacia: irritado, o governo panamenho, que controla a maior parte do perigoso tapón por onde milhares de migrantes passam todos os dias, criticou a falta de ação por parte da Colômbia, cujo território também contempla uma parte da região problemática. Em uma conferência de imprensa realizada durante a semana, a diretora do Serviço de Imigração do país do istmo, Samira Gozaine, disse que Bogotá “não está ajudando” o país vizinho a conter os fluxo de pessoas cruzando os dois países, uma situação particularmente preocupante em 2023 – em apenas sete meses, o total de travessias registradas em 2022 já foi superado, sendo que o ano passado já havia representado um recorde histórico. De acordo com o Panamá, a postura dos colombianos também se afasta do que havia sido definido pelo acordo de cooperação firmado em abril pelos dois governos latino-americanos e os EUA (principal destino dos que atravessam Darién). Via AP.
PARAGUAI 🇵🇾
O clima entre os EUA e o governista Partido Colorado, sigla do presidente eleito Santiago Peña – que toma posse na próxima terça (15) – pode não ser dos melhores em função das sanções impostas ao líder do partido e ex-presidente Horacio Cartes (2013-2018), além do atual vice-presidente Hugo Velázquez. Mas, para tentar acalmar os ânimos, o futuro mandatário se reuniu durante a semana com o atual embaixador do país norte-americano em Assunção, Marc Ostfield – ele próprio o responsável por comunicar, em janeiro, uma série de restrições contra Cartes, listado por Washington entre figuras “significativamente corruptas”. “Santi” Peña foi acompanhado por seu futuro chanceler, Rubén Ramírez Lezcano, num encontro que, segundo os envolvidos, tratou apenas da agenda bilateral entre os dois países, passando por temas como segurança, comércio e o enfrentamento ao narcotráfico. Difícil imaginar, porém, que o nome de Cartes não tenha sido mencionado uma única vez, como alegam as autoridades – o bilionário ex-presidente, afinal, cumpre todos esses requisitos, estando na mira da Justiça por acusações de contrabando e lavagem de dinheiro, inclusive para o tráfico de drogas. No ABC Color.
Com luzinhas coloridas e tudo, a Ponte da Integração, novo monumento ligando o Brasil ao Paraguai, fez seu primeiro teste de iluminação na terça (8), aumentando a expectativa dos dois lados para a (várias vezes adiada) inauguração – ainda que o evento não tenha sido divulgado de forma oficial, apenas agradando os curiosos com fotos nas redes sociais. De toda forma, falta pouco: a parte estrutural da construção já está finalizada, restando, apenas, a viabilização da vias de acesso, impasse que ainda não permite a liberação da ponte para o trânsito entre a brasileira Foz do Iguaçu e a paraguaia Presidente Franco. Não há data exata para o início da funcionalidade. No Portal da Cidade.
PERU 🇵🇪
Climão? Se depender do Brasil, não: na segunda (7), às vésperas de um encontro de lideranças latino-americanas para a Cúpula da Amazônia, o presidente Lula recebeu sua homóloga peruana Dina Boluarte. Em outros tempos apenas uma formalidade, o encontro da semana marca um posicionamento silencioso por parte do governo braslieiro já que, criticada por várias lideranças à esquerda (como o chileno Gabriel Boric, o colombiano Gustavo Petro e, de forma ainda mais enérgica, o mexicano Andrés Manuel López Obrador) pela repressão aos protestos em seu país, Boluarte deu indícios de que se tornaria pária regional. Mas, não para Lula – pragmático, o petista fez questão de não tocar nesses assuntos delicados, resumindo a questão ao tema ambiental: “Conversamos sobre a cooperação entre nossos países. Assuntos que iremos aprofundar com os outros seis países da conferência que compartilham a floresta”, disse o brasileiro. No Metrópoles.
PORTO RICO 🇵🇷
Conhecida pela badalação, a cena noturna do coração de Porto Rico está com os dias contados – ou, de forma mais otimista, pelo menos diante de uma poda considerável. Isso porque, na terça (8), o prefeito da capital San Juan, Miguel Romero, assinou uma nova medida que passa a limitar os horários para a comercialização de álcool – a partir de novembro, estabelecimentos só poderão vender bebida até a primeira hora da madrugada, apatifando as festanças de rua que, sobretudo na parte histórica da cidade, costumam ir noite adentro, com bares e restaurantes abertos até cinco horas da matina. A medida foi obviamente mal recebida pelo setor turístico, uma das principais formas de ingresso da ilha, que vive um péssimo momento econômico – comerciantes também questionam o “privilégio” dado à rede hoteleira, que não será afetada pela restrição. Mesmo assim, Romero se disse “moralmente convencido” de que a decisão era a ideal diante de casos recentes de turistas mortos nesses centros movimentados. Como o assunto é Latino, o resumo da (redução da) festa, lá no meu AP.
REPÚBLICA DOMINICANA 🇩🇴
“Tráfico de haitianos” é como os dominicanos vêm definindo um esquema de migração irregular vindo do país vizinho, que contaria com auxílio de policiais do lado hispanohablante da fronteira. O mais novo caso veio à tona no domingo (6), quando 13 migrantes vindos do Haiti acabaram morrendo em um acidente de trânsito pouco após ingressar na República Dominicana. Segundo as investigações, os responsáveis pelo transporte teriam “comprado” a proteção para garantir que os haitianos ingressassem no país sem documento, subornando as autoridades policiais envolvidas no esquema. Moradores da área onde ocorreu a tragédia também afirmaram que, diariamente, circulam “três ou quatro” veículos fazendo um traslado similar. Sem mais detalhes até o fechamento desta edição, a informação era que o comando da polícia de Villa Vásquez, na província fronteiriça nortenha de Monte Cristi, teria sido transferido para o sul do país após os acontecimentos do fim de semana. No Listin Diario.
URUGUAI 🇺🇾
A estiagem uruguaia, que segue afetando o abastecimento de água potável em Montevidéu apesar de um relativo alívio nos últimos meses, foi parar nas páginas do New York Times na quinta-feira (10). Citando o Uruguai como um exemplo na mitigação das mudanças climáticas e o primeiro país do mundo a tornar a água um direito fundamental, o tradicional jornal estadunidense se debruça sobre uma questão sombria em uma época em que o mundo se preocupa com um clima cada vez mais revolto: o que fez um país que “não deveria” sofrer com esse problema acabar enfrentando uma das mais severas crises de abastecimento da região – e as limitações de agir sozinho em um contexto que exige ações globais.
VENEZUELA 🇻🇪
Diante de pressões por parte do Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) do país e de acusações de “abuso de poder” supostamente cometido por parte de seus dirigentes, a Cruz Vermelha Venezuelana (CVV) informou na segunda-feira (7) que fará parte de um “conselho de reestruturação” que cuidará de reformular uma série de processos internos da entidade, a fim de criar mecanismos de transparência e uma “profunda auditoria interna”, entre outras melhorias. Em nota, a organização disse que tomou a decisão após consultas com agentes de dentro e fora do país, e que tudo será acompanhado pela representação internacional da própria Cruz Vermelha. A decisão, porém, é vista com maus olhos por parte da oposição e de ONGs, que dizem que as intervenções, fruto de investidas do governo, criam um “precedente perigoso”. A CVV promete mudanças em até 12 meses. Na CNN.
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