Eleições na Guatemala: esquerda segue na briga; direita leva Congresso
Governo não emplaca nome no segundo turno, mas cai atirando e ganha 22 cadeiras no Congresso, forçando alianças; pela Presidência, esquerda medirá forças com direita menos radical em agosto
Os primeiros resultados das eleições gerais da Guatemala, no último domingo (25), surpreenderam eleitores e institutos de pesquisa e deixaram em aberto o futuro do país. A votação para presidente teve novidades e velhos conhecidos: fiel à maioria das projeções, a conservadora Sandra Torres (15,7%) chega ao segundo turno pela terceira vez, contrastando com o estreante Bernardo Arévalo (11,8%), o surpreendente segundo colocado que tentará ser eleito por uma plataforma de centro-esquerda criada apenas alguns anos atrás. O partido governista Vamos não segue na briga pela faixa presidencial, mas o cenário é diferente para o Congresso, onde essa mesma direita, considerada mais radical, deve dominar a partir do próximo ano.
Como já contado repetidamente por este GIRO, inclusive na edição anterior a esta, há uma sanha autoritária entre as instituições guatemaltecas que passa pela influência do governo de Alejandro Giammattei – que, ao lado de aliados no Ministério Público, promove há anos uma intensa caça a juízes, procuradores, opositores e, de forma notável, à imprensa crítica a sua gestão. O nome encarregado de manter o controle total do Executivo nas mãos da situação era Manuel Conde, candidato pelo Vamos. Ele foi o terceiro mais votado (7,8%) no último final de semana e saiu da briga logo de cara, uma derrota relativamente esperada.
Mas a perspectiva é outra quando se trata dos resultados das eleições legislativas. Na renovação das 160 cadeiras do Congresso (unicameral), o Vamos de Giammattei foi massacrante: ampliou sua representação em 22 cadeiras, somando um total de 39 representantes a partir do próximo ano. A legenda será a principal força da Casa, desbancando justamente a Unidade Nacional de Esperança (UNE), de Sandra Torres – outrora maior partido do Congresso, agora a legenda terá a segunda maior representação (28). No total, a UNE perdeu 23 assentos. Já o Movimento Semilla, jovem agremiação de Bernardo Arévalo, vive sua primavera eleitoral: além de mandar um presidenciável para o segundo turno só cinco anos após seu registro oficial, o partido somou 16 deputados aos que já tinha, tornando-se a terceira maior bancada no Congresso, com 23 parlamentares.
Vários cenários possíveis se desenham a partir daí. Em caso de vitória, o recém-promovido Semilla não terá vida fácil: ainda que Arévalo tenha ele próprio uma carreira parlamentar mais longa – além de ser um respeitado ex-diplomata –, seu jovem partido seria forçado a costurar alianças não apenas com a UNE, mas, também, com essa mesma direita governista que se distancia – e muito – dos princípios partidários mais à esquerda. Porém, nada incomum para uma ideologia que sobrevive em um país tomado pelo conservadorismo, o que se comprova pela trajetória do pai do próprio Arévalo, o ex-presidente Juan José Arévalo (1945-1951). Responsável por uma agenda progressista, com destaque para a implementação do salário mínimo e do confronto aos latifundiários, Arévalo pai iniciou um ciclo de improváveis mudanças sociais no país que ganharam sequência com seu sucessor, Jacobo Árbenz. A onda progressista, porém, foi contida após um golpe de Estado em 1954, encomendado (como tantos no século 20) pelos EUA. É por este motivo que o candidato do Semilla nasceu não na Guatemala, mas no Uruguai, durante o exílio da família.
A dinâmica deve ser outra, porém, caso Torres vença as eleições em sua terceira tentativa. Primeiro, é necessário separar o joio do trigo: empresária, Sandra Torres – que chegou a ser presa em 2019 por corrupção – abraçou uma franca guinada à direita conservadora, no que se especula ser uma tentativa de se descolar da essência (alegadamente) social-democrata da legenda que já foi de seu antigo companheiro, o finado ex-presidente Álvaro Colom (2008-2012). Mas seja partido, seja Torres, fato é que uma aliança entre um eventual governo da UNE e a bancada (agora expandida) do Vamos não seria lá uma novidade: a despeito de qualquer desavença pública e incompatibilidade ideológica, os deputados da UNE passaram os últimos quatro anos votando ao lado do governo Giammattei, numa espécie de pacto tramado nos corredores. E isso acontece apesar das críticas que a própria Torres faz a Giammattei, a quem inclusive acusou de comprar votos no último final de semana. Só mesmo um cenário de nova dobradinha UNE-Vamos abriria caminho para a viabilização de pautas sensíveis: a aprovação de leis de urgência nacional e de reformas constitucionais, por exemplo, exige maioria qualificada – ou seja, 107 dos 160 deputados, força com a qual nem mesmo os três principais partidos contam juntos. Negociações em um legislativo fragmentado e pouco fiel, então, são esperadas, segundo analistas.
Caso contrário, a coisa pode pegar fogo – literalmente: até mesmo o autoritário Giammattei passou por maus lençóis em 2020, quando uma votação a portas fechadas do orçamento federal do ano seguinte causou revolta na população, que, furiosa, incendiou o Congresso na capital durante dias de tensão. Em um contexto de embates entre instituições, quem conseguir manter essa bomba-relógio sob controle sai em grande vantagem. Arévalo e Torres agora viajam pelo país para intensificar a campanha. Até o fechamento desta edição, pesquisas não davam vantagem a nenhum dos dois candidatos no segundo turno marcado para 20/8.
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🇨🇴 Ex-negociador de paz com as FARC sobrevive a ataque com míssil na Ucrânia – Um ataque russo a um restaurante na cidade ucraniana de Kramatorsk deixou três vítimas fatais na terça-feira (27) – e, num surpreendente deslocamento geográfico, também feriu cidadãos colombianos bem conhecidos por aqui. Entre os sobreviventes do bombardeio, estão o ex-comissário de paz Sergio Jaramillo (que negociou o cessar-fogo com as FARC) e o escritor Héctor Abad Faciolince (autor, entre outros, de A ausência que seremos). Ambos, juntos com a jornalista Catalina Gómez, também colombiana, estavam com uma escritora ucraniana no momento em que um míssil de cruzeiro atingiu o restaurante Ria Pizza, conhecido ponto de encontro de repórteres e militares desde o início da guerra. “Estamos bem e sofremos apenas ferimentos leves”, disseram Jaramillo e Abad em um comunicado assinado conjuntamente. Os colombianos estão no país em guerra, segundo o texto, para “expressar a solidariedade da América Latina ao povo da Ucrânia frente à bárbara e ilegal invasão russa”. Via AFP.
🇸🇻 Bukele confirma tentativa de reeleição apesar de proibição constitucional – Sem surpresas, mas agora com confirmação oficial: o partido governista Nuevas Ideas anunciou, na segunda (26), a inscrição do presidente Nayib Bukele como pré-candidato à reeleição no ano que vem. Com a popularidade sempre alta em função da queda drástica na criminalidade após o início de sua “guerra às gangues”, todas as pesquisas indicam uma vitória tranquila do mandatário até aqui. E o movimento até poderia ser encarado como uma formalidade, não fosse um importante detalhe: juristas, opositores e observadores internacionais acusam Bukele de tentar uma manobra inconstitucional para se manter no poder. De fato, a Constituição em vigor no país desde 1983 afirma que não é liberada a candidatura de quem ocupou a Presidência por mais de seis meses “no período imediato anterior”. O problema é que, em 2021, o Congresso de maioria governista destituiu os integrantes do Supremo que decidem sobre questões constitucionais e, em seu lugar, colocou nomes simpáticos a Bukele – estes agora endossaram uma interpretação questionada que abriria margem para o presidente tentar, sim, seguir no cargo. A oposição está de mãos atadas: o tema até pode ser disputado nos tribunais, mas, em última instância, a decisão seria dos mesmos magistrados que já liberaram o caminho para Bukele seguir no poder. Em El País.
🇭🇳 Honduras: massacre em presídio põe país em rota de “bukelização” – Poucos dias após um massacre que deixou 46 detentas mortas em uma penitenciária feminina em 20/6, o governo hondurenho deu início a uma nova intervenção militar no sistema prisional nesta semana, com o objetivo de desmantelar as quadrilhas criminosas que controlam as prisões do país. O uso das Forças Armadas para “controlar” a crise penitenciária em Honduras não é inédita, mas, desta vez, parece ter se radicalizado – levando a denúncias imediatas de violações de direitos humanos e procedimentos que lembram aqueles adotados pelo vizinho El Salvador, onde o presidente Nayib Bukele deu carta branca para os agentes penitenciários manterem os detentos sob condições degradantes que incluem até mesmo a privação de alimentação. Segundo o secretário de Defesa, José Manuel Zelaya Rosales (que tem os mesmos nomes e sobrenomes do ex-presidente Manuel Zelaya, marido da atual mandatária Xiomara Castro, mas é sobrinho do casal presidencial), o objetivo da operação “Fé e Esperança” é que as penitenciárias hondurenhas “deixem de ser escolas do crime”. Conforme as informações preliminares das investigações, a chacina a sangue frio ocorrida na segunda quinzena de junho teria como pano de fundo o conflito entre facções ligadas às pandillas rivais Barrio 18 e Mara Salvatrucha, que disputam o controle do crime nas ruas e da vida de detentos e detentas atrás das grades. Na BBC.
🇲🇽 México: ‘frente ampla’ da oposição define estratégia para escolher presidenciável – Com a difícil missão de fazer frente ao favoritismo do Morena, partido do presidente Andrés Manuel López Obrador, a coalizão “Va Por México”, que aglutina as principais legendas da oposição, anunciou na segunda-feira (27) o receituário para definir o candidato oficial da já chamada “frente ampla” nas presidenciais de 2024. Segundo os dirigentes de PRI, PAN e PRD, o processo será dividido em três etapas: primeiro, o registro, que exigirá dos aspirantes colher assinaturas de um mínimo de 150 mil pessoas – sejam filiados ou cidadãos sem vínculo com os partidos – respaldando suas respectivas pré-candidaturas; depois, os que passarem da primeira etapa participarão de debates para apresentar propostas; por último, o comitê da coalizão escolherá os três melhores para uma nova rodada de debates, dessa vez em nível nacional, processo que será seguido por pesquisas de opinião e de intenção de voto, cujos resultados (ponderados, dando peso igual às duas consultas) serão conhecidos em 3/9. E não foi sem provocação: Alejandro Alito Moreno, presidente do outrora hegemônico PRI (que tem perdido terreno para o ascendente Morena mesmo antes do pleito nacional), disse que o método escolhido pelo bloco opositor “é prático, realizável, potente e diferente do que faz o governo”. Em El País.
🇻🇪 Tribunal de Haia retoma processo por violações na Venezuela; chavismo denuncia ‘fins políticos’ – Sete meses depois, o Tribunal Penal Internacional (TPI) autorizou na terça (27) a reabertura da investigação por crimes contra a humanidade no país caribenho, considerando “insuficientes” ou ainda “sem impacto concreto em processos potencialmente relevantes” as medidas tomadas pelo governo de Nicolás Maduro frente às denúncias. Após alerta do Tribunal de Haia, a Venezuela pediu que as investigações – incluindo as que ligam forças de segurança do chavismo a delitos de uso de força excessiva e tortura durante as manifestações de 2017 – fossem adiadas, argumentando que seu próprio sistema judicial seria capaz de destrinchar a questão internamente. Agentes de segurança envolvidos nas mortes causadas pela repressão aos protestos até foram condenados, mas a oposição e as próprias entidades internacionais entendem que tudo foi feito dessa forma para afastar os holofotes do TPI. Em nota, a chancelaria venezuelana se pronunciou em “desacordo” com a reabertura do processo, sugerindo supostos “fins políticos internacionais” alinhados à agenda dos EUA para uma “mudança de regime” em Caracas. Via AP.
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REGIÃO 🌎
Uma bolada de US$ 250 milhões é o que o Banco Europeu de Investimento (BEI) e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) acordaram injetar no Equador e no Peru, como parte de um projeto que ligará as redes elétricas dos dois países andinos. Com extensão prevista de 280 quilômetros, sendo a maior parte em território equatoriano, o empreendimento está previsto para iniciar obras em outubro de 2024 – com funcionamento esperado para 2026 – e ainda está na fase inicial de registros. Segundo as duas partes envolvidas, a infraestrutura pode ser crucial para evitar o corte do abastecimento de energia em “momentos extremos” como em episódios de terremoto ou inundações. No Terra.
ARGENTINA 🇦🇷
Mais que amigos, friends! Pela quarta vez em seis meses de mandato de Lula, o presidente argentino Alberto Fernández veio ao Brasil para se encontrar com seu homólogo, na segunda-feira (26) – tecnicamente, já é a quinta vez que se reúnem oficialmente desde o início do ano. Em pauta, desta vez, há discussões “estratégicas” incluindo obras de infraestrutura, defesa e energia, além de alternativas para conceder crédito à Argentina, que segue atolada na crise econômica. Entre os pontos mais importantes falados na semana, está o financiamento do BNDES para a construção do gasoduto Néstor Kirchner, que conectaria a Patagônia ao Brasil, em um projeto que tenta reduzir a dependência do gás boliviano – cujo abastecimento transfronteiriço vêm se exaurindo nos últimos anos. Na BBC.
BOLÍVIA 🇧🇴
O protagonismo é do Brasil, mas a Bolívia também é destaque negativo: o país andino foi o terceiro do mundo que mais perdeu florestas em 2022, em um pódio liderado pelos brasileiros e que ainda tem a República Democrática do Congo em segundo lugar. O levantamento é do Instituto de Recursos Mundiais (WRI, na sigla em inglês), que aponta que os bolivianos viram a destruição de cerca de 3,86 mil km² de “florestas primárias”, compostas por vegetação nativa e madura. Ao lado do Brasil, os dois sul-americanos representaram metade de toda a área florestal perdida no planeta no ano passado, afirma a WRI. Incêndios e desmatamento para expandir plantações de soja e pastagens são apontadas como os maiores culpados pela devastação que, na Bolívia, é concentrada nos departamentos de Beni e Santa Cruz. Via AFP.
CHILE 🇨🇱
El Niño já se faz sentir: entre a sexta-feira passada (23) e o início desta semana, várias regiões do Chile foram afetadas pelas piores inundações vistas no país em 30 anos, com transbordamentos de rios e pelo menos duas mortes. Segundo o Serviço Nacional de Prevenção e Resposta a Desastres (Senapred), em um balanço divulgado quando as precipitações deram uma trégua na terça (27), as chuvas também haviam deixado mais de 12 mil pessoas isoladas, além de 1,6 mil desabrigados. As buscas seguiam ainda para localizar desaparecidos, embora, até o fechamento desta edição, nenhuma outra morte tenha sido confirmada. Na Folha.
COLÔMBIA 🇨🇴
Reconhecimento merecido, mas com uma nota triste: o governo colombiano condecorou, na segunda-feira (26), militares, indígenas e outros funcionários envolvidos na operação de resgate das quatro crianças que sobreviveram por 40 dias na selva amazônica até serem encontradas. No mesmo ato, porém, autoridades admitiram ser “improvável” que o perrito Wilson seja localizado, tantos dias após o fim das buscas originais: o pastor belga, farejador, havia sido empregado nas buscas e foi considerado fundamental para encontrar as crianças, com quem chegou a interagir – mas acabou fugindo quando o resgate definitivo alcançou o local. Na cosmovisão de alguns dos indígenas que ajudaram nas buscas, aliás, Wilson teria ficado “como uma oferenda aos espíritos” que estiveram com as crianças naquele período. No lugar de Wilson, a mãe do cão recebeu uma homenagem no evento desta semana. Via AFP.
Desta vez, felizmente, foi apenas excesso de precaução: a autoridade geológica colombiana anunciou, na terça (27), o rebaixamento dos níveis de risco de uma erupção para o vulcão Nevado del Ruiz, após 89 dias sinalizando um “alerta laranja” – que motivou até mesmo a evacuação de algumas áreas, de forma preventiva. O objetivo do governo era evitar a repetição do desastre de 1985, quando uma erupção com alertas ignorados por autoridades da época destruiu comunidades inteiras e matou mais de 25 mil pessoas. Agora, segundo os especialistas, os indícios são de que a atividade geológica voltou a se reduzir, tornando a área menos suscetível a uma erupção violenta. No El Colombiano.
COSTA RICA 🇨🇷
A população costa-riquenha está mais velha – possivelmente, em quantidades até maiores do que as estimativas oficiais do Instituto Nacional de Estatísticas e Censos (INEC). Um recente estudo da Universidade da Costa Rica (UCR), com dados de 2022, indicou que 13,63% dos habitantes do país já teriam 65 anos ou mais, o equivalente a 710 mil pessoas – 200 mil acima das projeções do INEC. O aumento da expectativa de vida, possibilitado por um robusto sistema de saúde pública, veio acompanhado de uma queda nas taxas de natalidade, hoje uma das mais baixas nas Américas. A pesquisa da UCR enfatiza a importância de conscientizar o país sobre aprender a lidar com uma população cada vez menos jovem, com consequências socioeconômicas ainda pouco comuns no contexto latino-americano. No Tico Times.
CUBA 🇨🇺
Interrompidas durante o governo de Jair Bolsonaro (2019-2022), as doações de medicamentos feitas pelo Brasil ao governo cubano, que vive às voltas com a escassez de itens essenciais, voltaram a acontecer. Segundo informações obtidas pela Folha, cerca de 12 mil ampolas de antibiótico foram destinadas à ilha no primeiro trimestre deste ano, parte de uma remessa de 90 milhões de unidades que já venceriam no meio do ano e que estavam entre os itens do SUS disponíveis para doação internacional. O Brasil também enviou remédios em suas doações humanitárias para vários outros países, incluindo os latino-americanos Chile, Haiti e Paraguai.
Ainda não é o ideal, mas já melhorou bastante. Esse é o diagnóstico feito por autoridades e profissionais do setor turístico da ilha, tão crucial para uma economia que convive há décadas com sanções internacionais e, mais recentemente, com a dramática mistura de bloqueio econômico e restrições ligadas ao coronavírus. Números são fáceis de comparar já que, em 2018, ainda como consequência de uma rara aproximação entre os EUA e Havana nos anos de Barack Obama (2009-2017), os ingressos ligados ao turismo atingiram cifras recordes, acima da casa dos US$ 3 bilhões. E não tem sido fácil se recuperar desde então: com um recrudescimento total de relações no subsequente governo de Donald Trump (entenda como isso afetou Cuba durante os anos de pandemia), tudo caminha devagar – embora as metas de receber 3,5 milhões de turistas no ano passado tenha sido atingida, disse o ministro do Turismo, Juan Carlos García, em maio. Paciente, o setor turístico cubano também aguarda os impactos de novas rotas ligando a ilha aos turistas russos – em um contexto de aproximação entre os dois países – e da massiva entrada de visitantes canadenses, atualmente a principal origem de viajantes que querem passear pelas ramblas de Havana, como conta a reportagem da AFP.
EQUADOR 🇪🇨
Há um ano, nesta sexta-feira (30), uma série de protestos convocados pela Confederação das Nacionalidades Indígenas do Equador (Conaie) contra o presidente Guillermo Lasso culminaram com a assinatura de um compromisso após uma mesa de diálogo. A entidade concordou em se retirar das ruas conforme a gestão de Lasso cumprisse com 218 exigências nos meses seguintes. Em outubro, porém, a Conaie voltou a abrir caminho para novas mobilizações – embora menos intensas – considerando que o presidente não vinha avançando nas pautas. Lasso se defendeu, fechou 2022 falando em “96% de cumprimento” no que havia sido acordado, e voltou a ser refutado pela Conaie no início deste ano. Agora, grande parte dessa briga ficou em segundo plano: desde que Lasso dissolveu o Congresso e convocou eleições antecipadas para agosto, o foco das disputas políticas passou a ser garantir um bom desempenho nas urnas – especialmente para o braço institucional da Conaie, o movimento Pachakutik, que alcançou a maior representação legislativa de sua história e agora luta para não ver seus assentos diminuírem. Em El Universo.
HAITI 🇭🇹
As investigações em torno do assassinato do presidente Jovenel Moïse, crime que completa dois anos neste mês de julho, continuam se arrastando – e, na segunda-feira (26), voltaram a envolver uma figura do alto escalão do antigo governo. Desta vez, o convidado a depor foi o ex-primeiro-ministro Joseph Jouthe, que deixou o cargo três meses antes do magnicídio e não chegou a se envolver nas disputas de poder após a morte de Moïse: na imediata sequência do crime, houve uma breve queda de braço entre Claude Joseph, sucessor de Jouthe, e Ariel Henry, que havia sido nomeado para o cargo na antevéspera do assassinato – depois, com apoio internacional, Henry acabou permanecendo como premiê e, na prática, segue até hoje com o poder supremo de um país que não vai às urnas desde 2016 e não conta mais com representantes eleitos cumprindo mandato em nível federal. À Justiça, Jouthe – que, a princípio, não é suspeito na morte do presidente, ao contrário do próprio Henry – falou grosso: “se eu [ainda] fosse primeiro-ministro, teriam que passar por cima de meu cadáver para matar o presidente”. No Nouvelliste.
Una expresión:
Mate con sal – Faz parte de uma linguagem não dita, dos códigos em torno do mate que os gauchos aprendem ao longo da vida, no Uruguai, na Argentina e no sul do Brasil. Segundo a tradição, servir o mate com sal era uma forma de dizer às visitas que fossem embora e – em casos extremos – não dessem mais as caras. Por outro lado, o mate doce (longe de ser uma preferência dos mais tradicionalistas, que preferem a franqueza da bebida amarga) era uma indicação de amizade; em situações de cortejo romântico, servir um mate extremamente doce, como no caso daquele “temperado” com mel, podia ser até uma indicação de amor correspondido. O tema do mate con sal, contudo, tem complicado os uruguaios de Montevidéu em meio à atual crise hídrica: como a água de torneira está salobra, muitos sem dinheiro para comprar o líquido engarrafado diariamente estão precisando deixar o hábito nacional de lado – ou se submeter a uma infusão de gosto desagradável que, na cultura popular, indica que alguém não é bem-vindo.
MÉXICO 🇲🇽
Não é só assunto europeu: na América Latina, também tem gente morrendo de calor. Autoridades mexicanas confirmaram que a onda de temperaturas extremas vividas pelo país logo antes do início de verão – no Hemisfério Norte – é responsável por pelo menos 112 óbitos ao redor do país, segundo o último informe da Secretaria de Saúde nacional – que só contabiliza dados até o dia 18/6. A informação, divulgada durante a semana, veio para desmentir as bravatas do presidente Andrés Manuel López Obrador, que acusava a imprensa de estar exagerando a dimensão dos perigos do calor recorde, chegando a afirmar que não havia nenhum falecido pelas temperaturas excessivas no México. Em El País.
NICARÁGUA 🇳🇮
Diante de uma guerra entre o governo de Daniel Ortega e representantes religiosos acusados de contravenção – conflito que até o presidente Lula prometeu ajudar a resolver – a Nicarágua viu novos alertas a respeito da crise: na quarta (28), a Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) exigiu que o poder em Manágua “liberte imediatamente” o bispo de Matagalpa, Rolando Álvarez, condenado em fevereiro a 26 anos de prisão por “danos à integridade nacional”, uma entre tantas as acusações consideradas arbitrárias contra vozes críticas a Ortega. A Corte IDH também pediu que o governo adote as medidas necessárias para proteger “a vida, saúde e integridade” do clérigo, que mais cedo este ano se recusou a deixar o país rumo ao exílio ao lado de mais de 200 opositores, muitos dos quais acabariam expatriados por decisão dos orteguistas. Na DW.
PANAMÁ 🇵🇦
Não é bem uma novidade que a Operação Lava Jato ainda respingue na política panamenha, mas novos desdobramentos dela voltaram a colocar a investigação no centro do debate local: na segunda (26), a Justiça do país começou a julgar por suposta lavagem de dinheiro, no âmbito da operação, Jürguen Mossack e Ramón Fonseca, fundadores do escritório de advocacia Mossack Fonseca. Nomes conhecidos durante uma série de revelações de escândalos em anos passados no caso conhecido como “Panama Papers”, os dois, agora, são julgados em um caso não relacionado aos papers: ambos teriam comandado uma “organização criminosa” que “ocultou ativos ligados à Lava Jato”, segundo o Ministério Público panamenho. Os dois sócios, que já foram presos preventivamente no âmbito desse imbróglio, negaram todas as “ridículas” denúncias. Via AFP.
PARAGUAI 🇵🇾
Sem estar muito para peixe, o Rio Paraná virou palco de uma briga entre autoridades paraguaias e argentinas. Tudo começou no último final de semana, quando navios da Marinha do Paraguai interceptaram uma embarcação de pescadores provenientes da província argentina de Corrientes, nas margens do Paraná, alegando que estavam navegando em território proibido. A partir daí, virou uma disputa diplomática: de um lado, autoridades argentinas denunciaram que a “autuação” foi fruto de uma “operação ilegal” por parte dos paraguaios e que o caso “gravíssimo” configurou, inclusive, “violação de fronteiras”, segundo Juan Pablo Valdés, prefeito de Ituzaingó. Para Valdés, autoridades paraguaias já teriam o costume de “sequestrar” turistas do lado argentino com uma certa frequência. A fisgada pegou mal do outro lado da fronteira. Negando tudo por meio de seus máximos representantes do setor, o Paraguai alegou que “não houve qualquer violação de soberania” e que a tal operação criticada foi, na verdade, uma “entrada circunstancial em águas argentinas” para resgatar um militar paraguaio que teria sido justamente “sequestrado” pela polêmica embarcação que originou toda a dor de cabeça. “Seria uma covardia da nossa parte deixar nossa gente em poder de três civis argentinos que estavam violando a legislação paraguaia”, disse o contra-almirante paraguaio Lucio Benítez. A zona de divisa entre os dois países é conhecida por diversas disputas dessa natureza, com relatos de brigas entre pescadores de ambos lados, abusos de autoridade e até mesmo pagamento de propina a militares em troca de permissão para pescar em zonas proibidas. No ABC Color.
PERU 🇵🇪
Nada feito: a Justiça do Peru, por meio de uma decisão da Corte Suprema, declarou improcedente na quarta-feira (28) um pedido de recurso interposto pela defesa do ex-presidente Pedro Castillo (2021-2022), que pedia a anulação de uma denúncia do Ministério Público. Preso desde dezembro passado após dissolver o Congresso e ser imediatamente destituído, Castillo, que se diz um “preso político”, também é alvo do MP por supostos crimes de corrupção – ele é acusado de liderar, durante seu curto mandato, uma rede que obteve dinheiro em troca de licitações fraudulentas de obras públicas; este é justamente o caso analisado durante a semana. Dessa forma, o antigo mandatário seguirá sendo alvo de investigação por esses delitos, que não têm relação com a crise que o derrubou e o levou à cadeia no final do ano passado. Em resposta à nova derrota judicial, Castillo disse no dia seguinte que “rejeita categoricamente” as acusações. Em El Diario.
PORTO RICO 🇵🇷
Se tem protesto em Porto Rico, há questões de energia no meio. E não foi diferente nesta quarta (28), quando centenas de pessoas de diversos setores econômicos marcharam contra uma proposta de aumento nas tarifas de eletricidade, já consideradas altíssimas num território há anos afetado por apagões e má distribuição elétrica. Ainda que em tempos recentes o foco de jornadas similares tenha sido a sempre problemática gestora privada LUMA Energy (entenda o porquê), dessa vez, porém, a multidão entoou cantos pelas ruas de San Juan em direção à residência do governador Pedro Pierluisi. E o alerta foi direto: para a maioria da população, novos aumentos poderiam elevar os custos de vida na ilha a um patamar insustentável. “Quanto mais altos os custos de energia, menos dinheiro uma família tem para sobreviver – e nem todo mundo tem dinheiro para instalar um sistema solar”, disse uma manifestante. O aumento sugerido do valor residencial de quilowatt-hora é parte do sempre almejado plano de reestruturação da dívida da insolvente economia porto-riquenha – a população, porém, diz que não quer pagar por um problema pelo qual não é culpada. Via AP.
REPÚBLICA DOMINICANA 🇩🇴
Feito histórico para o esporte do país: na quarta (28) à noite, o arremessador Domingo Germán se tornou o primeiro dominicano a fazer o chamado “jogo perfeito” na Major League Baseball (MLB), liga estadunidense que é considerada a melhor do mundo no beisebol, modalidade favorita na República Dominicana. Um jogo perfeito ocorre quando um mesmo arremessador atua durante a partida inteira e a equipe adversária sequer consegue ocupar uma das “bases” do jogo. Para ter uma ideia da raridade: em 154 anos de MLB e com mais de 235 mil jogos disputados até hoje, foi apenas a 24ª vez que isso ocorreu. Germán, que atua no New York Yankees e cometeu o feito em uma vitória por 11 a 0 sobre o Oakland Athletics, é o primeiro de seu país a atingir a marca, e o terceiro latino-americano: antes dele, vieram o nicaraguense Dennis Martínez, em 1991, e o venezuelano Félix Hernández, em 2012 – no que, até esta semana, era a última ocorrência de uma partida assim. No Listin Diario.
URUGUAI 🇺🇾
Os anos de Jair Bolsonaro (2019-2022) provavelmente deixaram o leitor mal acostumado, mas o Uruguai sempre mostra que é possível, sim, reunir lideranças que pensam diferente numa mesma sala. E não poderia haver causa mais nobre para isso: no marco dos 50 anos do golpe de Estado na terça (27), o presidente Luis Lacalle Pou deu uma declaração conjunta ao lado dos ex-mandatários Julio María Sanguinetti (1985-1990 e 1995-2000), o primeiro eleito após os anos de ditadura, Luis Alberto Lacalle Herrera (1990-1995) e Pepe Mujica (2010-2015), mantido preso pelo regime durante 12 anos, para dizer: “nunca mais”. Em um discurso uníssono contra a repressão e os anos sem democracia, os líderes cobraram da sociedade civil e da classe política uma permanente voz crítica ao passado obscuro do país. Por fim, dando nova amostra do zelo uruguaio pelo respeito a esses preceitos, Lacalle Pou disse, também citando finados ex-mandatários, ter “plena certeza de que o próximo presidente da República, seja de que partido for, também estaria sentado aqui junto conosco”. Em El País.
VENEZUELA 🇻🇪
Em nova demonstração de apoio à causa russa no conflito que segue ativo no Leste Europeu, o governo do presidente Nicolás Maduro condenou no sábado (24) a “ameaça terrorista” representada pelo Grupo Wagner contra o presidente Vladimir Putin e a Rússia. Grupo paramilitar privado, o Wagner, liderado por Yevgueni Prigozhin e que vinha lutando ao lado das linhas do Exército russo até então, é acusado por Moscou de levantar uma insurreição armada na última semana, levando a rumores de que a tensão, no limite, poderia escalar para uma guerra civil. O grupo só recuou, pelo menos por enquanto, após negociações mediadas pelo governo de Belarus, aliado da Rússia. Em comunicado, Caracas expressou seu “absoluto respaldo” a Putin, reforçando o posicionamento oficial do chavismo desde o início do conflito, em 2022. A postura venezuelana é relevante já que, segundo ONGs internacionais da área de segurança, a Venezuela é o único país latino-americano onde o Grupo Wagner manteria ativo algum tipo de atividade ou influência. Na Semana.
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