Aborto: Equador e Guatemala resistem a avanços na região
Supremo da Colômbia deu luz verde a despenalização até 24ª semana em fevereiro, enquanto Constituinte do Chile votou pela inclusão do direito no rascunho da Carta Magna nesta semana
Fevereiro e março estão sendo meses especialmente movimentados no debate dos direitos reprodutivos na América Latina. Ao longo das últimas semanas, a América latina viu Chile, Colômbia e Equador avançarem na regulamentação da interrupção legal da gravidez, dando um passo importante em uma das regiões mais restritivas do mundo quando o assunto é aborto. Mas, como seria de imaginar, o avanço em um continente onde a religião ainda dita decisões políticas também vem encontrando resistências. E não só nas palavras do brasileiro Jair Bolsonaro, que reagiu à notícia da despenalização colombiana dizendo que sempre lutaria para “proteger a vida [do feto]” (uma posição particularmente irônica vinda de um político que, no passado, defendeu que a interrupção da gravidez deveria ser uma decisão do casal): tentativas de manter a dureza da lei em países onde o direito ao aborto ainda é limitado – ou inexistente – continuam a povoar o noticiário.
Foi o caso da Guatemala, que no último dia 8, em pleno Dia Internacional da Mulher, havia aprovado a chamada “Lei de Proteção à Vida e à Família”, um dispositivo que aumentava as penas para o aborto, proibia o casamento igualitário e suspendia o ensino sobre diversidade sexual nas escolas. Um texto tão retrógrado que o próprio presidente Alejandro Giammattei, um dos ultraconservadores na região, pediu que os congressistas reconsiderassem. O mandatário sugeriu que vetaria as novas regras, considerando que estavam em violação “à Constituição e às convenções internacionais assinadas pela Guatemala”. Sem apoio do oficialismo e pressionados por organizações de defesa das mulheres e dos direitos humanos, os legisladores acabaram arquivando a proposta nesta semana, mas em relação à interrupção voluntária da gravidez o alívio das ativistas foi mínimo: o país continua sendo um dos latino-americanos onde o aborto não é autorizado nem nos três casos que tipicamente liberam a prática na região (risco à vida da mãe, má-formação fetal e gravidez resultante de estupro), ao lado de El Salvador, Haiti, Honduras, Nicarágua e República Dominicana.
No Equador, que em 2021 viu sua Corte Suprema considerar inconstitucional a proibição do aborto para vítimas de estupro, a regulamentação veio na metade de fevereiro, com prazos relativamente curtos: a interrupção só passaria a ser autorizada até a 12ª semana de gestação para a maioria das mulheres, e excepcionalmente até a 18ª no caso daquelas menores de idade, moradoras de áreas rurais e indígenas. Mesmo esses limites vistos como conservadores, porém, não foram suficientes para o presidente Guillermo Lasso, que vetou parcialmente o texto nesta semana. Alegando que a legislação contraria o princípio de igualdade perante a lei, Lasso – que repetidas vezes disse ser pessoalmente contra o aborto, mas que não interferiria em um assunto de Estado – pediu que o Congresso “unifique” o prazo para todas as mulheres. E, evidentemente, optou pelo período mais curto, tentando estabelecer a fronteira máxima em 12 semanas. A diferença de tempo do texto original levava em conta a maior dificuldade de encontrar serviços de saúde e de denúncia fora das áreas urbanas do país.
As reações recentes em Equador e Guatemala contrastam com o avanço dos últimos tempos em outras partes da região. Na Colômbia, após meses de entraves, o Supremo aprovou – em uma votação dividida, por 5 a 4 – a despenalização do aborto em qualquer situação até a 24ª semana de gestação, pavimentando o caminho para que o país se junte à ainda seleta lista de países onde a interrupção voluntária é autorizada no sul do mundo. Na América Latina, até então, apenas Argentina, Cuba, Uruguai e alguns estados do México concediam o direito. A decisão da Corte Constitucional colombiana depende que o Congresso e o Executivo do país implementem uma “política pública integral” sobre o tema, o que deve ainda causar dificuldades em situações específicas (afinal, nunca faltam iniciativas para barrar os abortos mesmo quando permitidos em lei).
Quem também tenta trilhar caminho semelhante é o Chile: nesta terça-feira (15), a Convenção Constitucional aprovou a inclusão do direito à interrupção voluntária no rascunho da nova Carta Magna. Em novembro, uma proposta para a despenalização do aborto até a 14ª semana foi rejeitada no Congresso, mantendo a autorização apenas para os três cenários habitualmente permitidos. A garantia do direito, no entanto, ainda depende da aprovação da futura Constituição em plebiscito, e os detalhes – como o limite máximo para o aborto ser realizado – precisariam ser definidos em uma legislação específica a ser aprovada posteriormente. O possível reconhecimento constitucional representaria uma virada relativamente rápida em um país onde, até 2017, permanecia uma proibição total às interrupções de gravidez. No Chile, como em outros lugares da América Latina, a restrição coloca em risco a vida de milhares de mulheres – estima-se que, entre o final da ditadura e o afrouxamento da lei há cinco anos, cerca de 70 mil abortos clandestinos eram realizados anualmente no país andino.
O longo caminho a trilhar em países mais ricos como Chile e Colômbia revela uma dificuldade silenciosa no avanço dos direitos reprodutivos: frente a uma cultura predominantemente conservadora e atrelada a valores religiosos, um PIB pujante não necessariamente credencia um país a ser mais avançado nesse debate. Independentemente da situação socioeconômica de cada país, o continente como um todo ainda é bastante atrasado no tema. Com exceção ao Uruguai, o mais laico entre os latinos, muitos países que se vangloriam por maior desenvolvimento relativo ainda patinam para dar acesso seguro e legal a uma questão de saúde pública que segue sendo encarada como moral e ideológica.
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DESTAQUES
🇨🇴 Esquerda ganha espaço na Colômbia – A esquerda colombiana tem motivos para celebrar. Nas eleições legislativas do último domingo (13), os progressistas do país tiveram o melhor resultado da história. A apuração segue e os números ainda não são definitivos, mas, com 97% dos votos contabilizados, a coalizão de centro-esquerda Pacto Histórico já conseguiu se tornar a mais votada do Senado, com 19 dos 108 assentos, além de outros dois eleitos pela representação indígena que também pertencem à coligação. No Congresso, foram 25 cadeiras de 188, mesmo número dos conservadores, mas ainda abaixo das 32 dos liberais – de todo modo, o melhor desfecho desde 2006. O maior dos triunfos, porém, ficou para a votação interpartidária que escolheria o concorrente à Presidência em cada uma das três coalizões. Favorito na corrida pela Casa de Nariño, Gustavo Petro – que promete anunciar seu (ou sua) vice de chapa na próxima semana – arrasou: foram 4,5 milhões de votos, 80% do que receberam os nomes do Pacto Histórico e bem mais do que receberam os dois vencedores das outras chapas. O país, agora, caminha para o primeiro turno das presidenciais, em 29/5. Em El País.
🇭🇳 Autorizada extradição de ex-presidente – Sem surpresas, um juiz da capital Tegucigalpa autorizou na quarta-feira (16) a extradição do ex-presidente Juan Orlando Hernández (2014-2022), que deixou o cargo no último 27/1. JOH, como também é conhecido, foi detido em fevereiro, apenas três semanas depois de entregar o poder, a pedido dos EUA, que o acusam de envolvimento com o narcotráfico. Preso desde então, o último mandatário hondurenho agora tem luz verde para ser enviado para o julgamento no país ao norte, onde enfrentará a possibilidade de condenação perpétua – pena já recebida em 2021 por seu irmão, o ex-deputado Tony Hernández, por acusações semelhantes. A defesa de JOH promete recorrer, o que deve adiar a extradição propriamente dita, mas juristas do país apontam que a decisão desta semana deve ser mantida. Na Prensa.
🇵🇪 Fujimori será solto – O ex-ditador Alberto Fujimori, 83, vai sair da cadeia. A notícia veio após o Tribunal Constitucional do país julgar um pedido de habeas corpus para que ele fosse retirado do cárcere por “razões humanitárias”, considerando a idade e a saúde debilitada – em 2017, ele já havia sido indultado pelo então presidente Pedro Pablo Kuczynski (2016-2018), mas depois voltou à cadeia diante da rejeição do pedido por parte da Justiça. Presidente do país durante a década de 1990, Fujimori cumpre pena por crimes contra a humanidade e corrupção e também já sentou no banco dos réus por casos de limpeza étnica durante seus anos de poder (saiba mais nesta edição). A expectativa é de que o autocrata deixe a cadeia na próxima semana. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) se manifestou sobre o caso na sexta-feira (18), dizendo-se “preocupada” com a decisão e entendendo que a restituição do indulto “afeta os direitos das vítimas de crime de lesa-humanidade, afeta o seu acesso à justiça e lesa a sua dignidade”. No República.
🇵🇾 Caminhoneiros fecham estradas contra alta dos combustíveis – O país passou a semana com bloqueios de estradas promovidos por transportistas, descontentes com o que consideram medidas insuficientes do governo para conter a alta dos combustíveis, que já passou por seis reajustes em um ano. A Petróleos Paraguayos (Petropar), estatal do setor, reduziu o valor do litro do diesel em 500 guaranis (R$ 0,36) desde o início da paralisação. Na quinta-feira (17), no que era o quarto dia de protestos afetando mais de 30 pontos ao redor do país – especialmente nas rodovias que conectam a capital Assunção à Argentina e ao Brasil –, o governo acenou com a possibilidade de intervenção e uso de força para liberar o caminho. Finalmente, no dia seguinte, foi anunciado um novo acordo para dissolver as manifestações, prometendo dobrar a redução – chegando a mil guaranis de desconto no diesel – a partir da próxima semana. Via EFE.
🇻🇪 Venezuela cria calendário fixo de reforço na vacina anticovid – Em decisão pioneira na região, a Venezuela agora tem um calendário fixo para a vacinação contra a covid-19: até segunda ordem, novas doses de reforço serão obrigatórias a cada quatro meses. Segundo Nicolás Maduro, a nova política só muda quando houver medicamentos capazes de garantir que uma infecção menos grave ou quando “se produza uma vacina que dê ao corpo imunidade por muito tempo”. Na América Latina, cada vez mais países já avançam com a aplicação da quarta dose na população mais idosa e em imunocomprometidos, mas ainda não há definições de um calendário fixo para a renovação periódica da vacina, como ocorre, por exemplo, com a gripe. Via Agência Brasil.
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MAIS NOTÍCIAS
REGIÃO 🌎
Os ecos da guerra na Europa seguem chegando à porção latino-americana do mundo. Na fronteira entre EUA e México, as autoridades estão permitindo a entrada (e a garantia de não deportação por um ano) de ucranianos fugidos do conflito, sob a justifica oficial de que estariam lá por razões “humanitárias” – o que gera um longo debate sobre migração, já que aos latinos que cruzam a fronteira não é dada a mesma facilidade. Para além do fluxo de pessoas vindas do Leste Europeu, a crise de lá também segue mexendo com o xadrez econômico da região, como conta esta reportagem da BBC.
A América Latina é uma das regiões que viu nas restrições da pandemia um ganho indireto para a diminuição nos números da dengue. Segundo um estudo da revista científica The Lancet, as medidas restritivas foram responsáveis por evitar em torno de 720 mil infecções em 2020. Os pesquisadores analisaram dados de 23 países sobre a incidência mensal de dengue a partir de relatórios semanais da OMS, informações climáticas e variáveis populacionais. No Poder.
ARGENTINA 🇦🇷
A alta dos preços dos combustíveis no Brasil voltou a tornar atrativa a viagem para o outro lado da fronteira, onde os subsídios maiores ainda contêm a subida do valor na bomba. A procura na última semana é tanta que os postos do lado hermano se viram obrigados a impor limites à compra por brasileiros – em várias cidades da divisa é possível encontrar o litro de gasolina por um valor equivalente a R$ 3 quando pago em espécie, enquanto do lado brasileiro o preço já supera os R$ 10 em alguns locais. N’O Globo.
Sem entraves internos: o Senado também aprovou, nesta quinta-feira (17), o acordo de renegociação da dívida do país com o Fundo Monetário Internacional (FMI), estabelecendo um prazo mais extenso para o pagamento de US$ 45 bilhões herdados de um empréstimo tomado no governo Mauricio Macri (2014-2019). Como havia ocorrido na Câmara na semana passada, também não houve muitas dificuldades nos números entre os senadores, com 56 votos favoráveis e 13 contra, além de três abstenções. Agora, só falta a assinatura do próprio FMI, que já havia indicado a concordância com os termos. A Argentina, que precisaria saldar o grosso da conta entre 2022 e 2023 – com US$ 2,8 bilhões já tendo que ser pagos na próxima semana, caso o acordo não saísse –, agora ganha uma nova linha do tempo para os pagamentos, que só começarão a acontecer em 2026, e têm até 2034 para serem concluídos. Via Reuters.
BOLÍVIA 🇧🇴
Um dos últimos líderes do golpe boliviano de 2019 a não parar na cadeia ou fugir do país, muito graças à imunidade alcançada por ter se tornado governador de Santa Cruz, o conservador Luis Fernando Camacho esteve em São Paulo durante a semana, buscando investimentos privados. Nome destacado na imprensa e na direita brasileira quando da derrubada de Evo Morales, Camacho desta vez teve sua passagem pelo Brasil tratada com quase total indiferença pelos veículos daqui. A viagem também serviu para deixar à mostra as fraturas internas no governo cruceño, já que, antes de sair da Bolívia, Camacho assinou um decreto deixando uma série de atribuições ao seu secretário de Gestão, Miguel Navarro, enquanto o vice-governador Mario Aguilera ficou de mãos vazias e admitiu “problemas de comunicação” com o mandatário. Em El Deber.
Gabriel Boric recebeu a faixa presidencial no Chile no último dia 11 e já acenou para os vizinhos bolivianos, de olho em retomar as relações diplomáticas abaladas desde a década de 1970. “Temos muitos elementos de integração que podemos trabalhar [com a Bolívia]”, disse, durante seu primeiro encontro com a imprensa estrangeira. Desde 1978, os dois países mantêm relações em nível consular, sem embaixadas. A briga remonta ao final do século 19, quando chilenos e bolivianos fizeram a Guerra do Pacífico, que terminaria com vitória chilena, mais de 30 mil mortos e sem consensos envolvendo um trecho de terra que daria à Bolívia acesso ao oceano. O caso até hoje gera debates e parou por diversas oportunidades nas altas cortes de Haia. Na Biobío.
CHILE 🇨🇱
Sebastián Piñera mal deixou a Presidência do Chile – no último dia 11 – e a direita já começa a ventilar a possibilidade de uma nova candidatura no próximo ciclo eleitoral. Em entrevista à CNN Chile, Mario Desbordes, ex-presidente da Renovação Nacional, da base aliada da antiga administração, indicou que o agora ex-presidente teria a ambição de lançar outra vez uma candidatura no pleito de 2025. No Chile não há reeleição, e Piñera (que já cumpriu dois mandatos não-consecutivos, entre 2010 e 2014 e entre 2018 e 2022) não chegaria a concorrer com o recém-empossado Gabriel Boric. A ideia, porém, ainda é vista com reservas: o último mandatário deixou La Moneda com a maior rejeição desde a redemocratização do país, e o próprio Desbordes indicou que a aspiração de Piñera, embora “legítima”, não conta com seu apoio. Também pesa a idade: se Boric acaba de tomar posse como o mais novo mandatário da história do Chile, aos 36 anos, Piñera brigaria para voltar ao governo aos 76. Em El Mostrador.
COLÔMBIA 🇨🇴
“Para o mau humor, faça amor consigo mesmo”, é o que diz a campanha da Prefeitura de Medellín em publicações nas redes sociais ilustradas com a imagem de uma mulher se masturbando. “O orgasmo libera endorfinas, serotonina e ocitocina: hormônios da felicidade que podem transformar um dia ruim em um para não esquecer. Dedique-se a este momento íntimo!”, diz a legenda de uma das publicações. A postagem, que chamou atenção por tocar em um assunto encarado como tabu, dividiu opiniões nas redes entre pessoas que elogiaram a campanha, e leitores comentando que o país deveria se preocupar com outros problemas. Na DW.
Dale un vistazo:
📺 El doctor del fútbol – Supersticioso, tramposo, estudioso e maradoniano, Carlos Salvador Bilardo marcou uma época dentro e fora dos gramados do futebol argentino. Ídolo do Estudiantes de La Plata campeão mundial em 1968 – com um futebol violento que horrorizou os ingleses derrotados na final –, Bilardo formou-se em medicina (daí o doctor) e depois se converteu em treinador, sendo o comandante da mais recente Copa do Mundo vencida pela Argentina, em 1986. Muito próximo de Diego Maradona, o craque daquele time, Bilardo hoje tem 84 anos e sofre com uma doença degenerativa, e jamais foi informado da morte do amigo, ocorrida em novembro de 2020. Sua história, especialmente o aspecto humano além do esporte, agora ganhou uma série documental – Bilardo, el doctor del fútbol, dirigida por Ariel Rotter – disponível desde o final de fevereiro na plataforma HBO Max.
COSTA RICA 🇨🇷
“Um passo importante na implementação do plano abrangente do presidente Biden para gerenciar de forma colaborativa a migração em nosso hemisfério”. Assim definiu o Secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, o acordo entre o país ao norte e a Costa Rica, estabelecido para tentar resolver as questões de migrantes indocumentados selado na última quarta (16). Para o governo em San José, o acordo entre as duas nações tem como objetivo fortalecer a fiscalização fronteiriça, além de combater problemas como o tráfico de pessoas e de fornecer mais assistência para a integração de migrantes e refugiados. Na Prensa Latina.
O Congresso do país está em discussões avançadas para “importar” um feriado típico estadunidense – tudo para tentar impulsionar o turismo, uma das principais indústrias do país, ávida por se recuperar após o baque da pandemia. A ideia é que a última quinta-feira de novembro passe a ser considerada, também na nação centro-americana, o “Dia de Ação de Graças”, coincidindo com a data da comemoração nos EUA. Segundo os impulsores do projeto, a versão tica do “Thanksgiving” seria uma maneira de incentivar que os viajantes do norte viessem passar a festa – que costuma reunir famílias às vésperas do inverno boreal – “em um clima mais cálido”. Em La República.
CUBA 🇨🇺
Mais de 100 manifestantes contrários ao governo foram condenados em Havana, informou o país na última quarta-feira (16). Os protestos, que foram um dos maiores desde a revolução de Fidel Castro em 1959, aconteceram em julho do ano passado, quando a população reclamava da escassez de alimentos, medicamentos e eletricidade em um momento no qual os casos de covid-19 haviam disparado no país. Para os manifestantes, foram aplicadas penas entre 4 e 30 anos. De acordo com a Suprema Corte, os manifestantes estavam “tentando subverter violentamente a ordem constitucional”. Entidades internacionais de direitos humanos acusam o governo da ilha de arbitrariedades no trato aos opositores. Via Reuters.
EL SALVADOR 🇸🇻
Sob a justificativa de tentar driblar a inflação no país, foi suspensa a cobrança de dois impostos relacionados a combustíveis pelos próximos três meses, com expectativa de reduzir o preço de um galão (3,8 litros) de gasolina em 26 centavos de dólar. O governo de Nayib Bukele apresentou algumas medidas para “aliviar” os efeitos da inflação, que em 2021 foi superior aos recordes dos últimos 20 anos, segundo a imprensa local. Também foi aprovada a Lei Especial Temporária de Combate à Inflação no Preço dos Produtos Básicos, que isenta os alimentos do imposto de importação. Na Prensa Libre.
“O que aconteceria se fizéssemos exatamente o mesmo que a União Europeia e censurássemos a mídia que ‘desinforma a população’?” Foi essa a questão que o autoproclamado CEO de El Salvador, o presidente Bukele, lançou em suas redes sociais na última semana. O líder, que constantemente utiliza as redes sociais para se dirigir à população, já havia publicado outras questões a respeito da atuação midiática no país. “Dizem que o jornalismo audita o Governo? Mas quem audita o ‘jornalismo’?”, escreveu. As postagens do presidente foram divulgadas poucas horas depois que um representante do Estado salvadorenho negou perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) que El Salvador esteja perseguindo a imprensa. Na Prensa Libre.
EQUADOR 🇪🇨
A aproximação entre o governo Guillermo Lasso e a China (leia mais no GIRO #118), que envolveu a renegociação da dívida do país sul-americano e a abertura de portas para um futuro tratado de livre-comércio – atualmente, apenas Chile, Costa Rica e Peru mantêm TLCs com Pequim –, segue dando o que falar. O Diálogo Chino ouviu especialistas para mapear o que está em jogo e quais as possíveis oportunidades que aparecem no horizonte equatoriano após as conversas de fevereiro. Segundo Lasso, um acordo formal pode ser assinado já em outubro, na cidade de Guayaquil, importante centro econômico do país.
GUATEMALA 🇬🇹
Para conter os avanços da mineração no país, um projeto de lei pretende adiar por 10 anos as licenças em andamento na Guatemala, além de não renovar as que estão atualmente em execução. A medida também propõe suspender a atual exploração mineira para licenças com mais de 5 km² de extensão. A ação é liderada por um grupo de oposição do governo, o Movimiento Semilla, que alega que a atividade provoca alta contaminação do meio ambiente e gera relativamente poucos recursos ao país, já que é explorada majoritariamente por empresas estrangeiras. Há anos, movimentos sociais encabeçados pela população originária vêm se enfrentando com as mineradoras. O sucesso da iniciativa do Semilla, porém, precisa de muito apoio além da própria sigla, já que o grupo conta com apenas seis dos 160 assentos no Congresso. Via EFE.
HAITI 🇭🇹
“Estamos vivendo uma situação catastrófica em que ninguém está protegido”. A frase é de um dos vários médicos que pararam por pelo menos três dias em uma greve geral por conta do aumento de casos de sequestro e pela falta de insumos destinados ao setor de saúde. Somaram-se ao paro profissionais de transporte, também afetados pela onda de violência e insegurança em vários pontos do país. A situação no país é de crise em todos as esferas: desde o assassinato do presidente Jovenel Moïse, em julho passado, o país já desestruturado entrou em uma espiral de dramas socioeconômicos – incluindo um exôdo crescente de civis rumo aos EUA. E, para piorar, segue governado por um primeiro-ministro que vive sob graves acusações de ter participado do magnicídio (saiba mais no GIRO #118). Enquanto o caos literalmente toma conta das ruas, o premiê Ariel Henry, apontado como conspirador na morte do presidente, agora diz ser ele mesmo alguém que corre risco de “morrer em sua missão”. No Diario Libre.
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HONDURAS 🇭🇳
A ex-primeira-dama Rosa Elena Bonilla, esposa do ex-presidente Porfirio Lobo (2010-2014), foi condenada por corrupção pela segunda vez nesta quinta-feira (17). Ela já havia sido condenada a 58 anos de cadeia em 2019 por desviar fundos públicos para uso pessoal poucos dias antes do fim do mandato de Lobo, mas a sentença original foi anulada após a Suprema Corte entender que o devido processo legal não havia sido seguido. Além de Bonilla, o secretário privado dela na época, Saúl Escobar, também foi considerado culpado. A divulgação da pena só deve acontecer no próximo dia 28. Enquanto isso, a atual presidenta, Xiomara Castro, mantém o discurso de endurecer a cruzada anticorrupção e enviou uma carta à ONU pedindo apoio para a instalação de uma comissão internacional contra a impunidade no país. Via AP.
MÉXICO 🇲🇽
“O grande golpe da década”. Assim o governo mexicano classifica a detenção de Juan El Huevo Gerardo Treviño Chávez, megatraficante e suposto líder do cartel do Noroeste. Estadunidense, Treviño estava entre os criminosos mais procurados pelo país de origem e foi deportado no início da semana. Ele deve ser processado pelos crimes de conspiração para o tráfico de drogas e lavagem de dinheiro. Segundo o chanceler Marcelo Ebrard, trata-se de umas das “mais importantes detenções” dos últimos anos. Na BBC.
Os EUA autorizaram a saída de alguns funcionários do consulado do país na cidade fronteiriça mexicana de Nuevo Laredo, após membros de um cartel atirarem contra a sede dessa representação diplomática. Segundo o Departamento de Estado em Washington, a autorização foi dada por “motivos de segurança”. Também foi aconselhado que cidadãos estadunidenses não viajem a Tamaulipas, estado onde há uma crescente atuação de grupos armados do narcotráfico. Acredita-se que o ataque a tiros seja justamente uma retaliação à prisão de El Huevo. Via AP.
NICARÁGUA 🇳🇮
Um líder de uma comunidade indígena foi morto e teve o corpo mutilado, disseram durante a semana ativistas e grupos comunitários. Segundo o ambientalista Amaru Ruiz, diretor da Fundação Del Río, Salomón López Smith estava desaparecido havia uma semana e teve o corpo encontrado em uma área remota em Pansunwás, território de Matumbak. O homem de 52 anos era líder da comunidade indígena Mayangna, que vem sendo alvo de ataques e invasões. “Seu corpo apresentava sinais de tortura, o que indica que foi um assassinato realizado com selvageria e com ódio”, disse Ruiz. López Smith foi o primeiro líder indígena morto em 2022 – nos últimos dois anos, foram pelo menos 28. Via AP.
PANAMÁ 🇵🇦
Três barcos de bandeira panamenha foram atingidos por mísseis russos no Mar Negro desde o início da invasão à Ucrânia, informou a Autoridade Marítima do país centro-americano nesta semana – sem precisar as datas dos ataques. Um dos barcos, inclusive, acabou sendo afundado, embora sem vítimas fatais. Apesar de oficialmente representarem o país, os barcos muitas vezes não são de empresas do Panamá, tendo apenas o registro na nação do famoso Canal em função de vantagens burocráticas e tributárias. Via Reuters.
PARAGUAI 🇵🇾
Um homem de Atyrá, a 60 km da capital Assunção, foi condenado a um ano de prisão por abuso sexual… de uma galinha. Na quinta (17), a sentença de Roberto Marandari, 39 anos, foi conhecida, dando um desfecho ao chamado “caso Cococha”, em referência ao nome do animal. A decisão é considerada histórica, por ser o primeiro caso de um abuso de um ovíparo no país a atingir uma instância judicial. Cococha, que sobreviveu à violência ocorrida em março de 2021, foi entregue para adoção. No Última Hora.
PERU 🇵🇪
Filme repetido: o Congresso aprovou no início da semana o debate que pode levar adiante uma moção de vacância (algo similar ao impeachment brasileiro) contra o presidente Pedro Castillo. Alvo de uma ação dessas pela segunda vez, o mandatário pode ser processado pela controversa e nebulosa “incapacidade moral” – dispositivo legal subjetivo que justamente torna tão simples a destituição de chefes de Estado por lá. A expectativa é de que o legislativo, dominado pela oposição, delibere sobre o caso no próximo dia 28/3. Na primeira tentativa de derrubar Castillo, em dezembro, não houve votos suficientes. Para remover o presidente, serão necessários 87 dos 130 votos do Congresso; nesta semana, o aceite à moção contou com 76 apoios. No Gestión.
Um deslizamento de terra em uma encosta de morro em Retamas, no norte do país, deixou soterradas pelo menos 12 casas – após informes iniciais que chegaram a indicar um número de 80 residências – na terça-feira (15) pela manhã. Em cenas que lembram a tragédia na brasileira Petrópolis, em fevereiro, gravações mostraram a violenta descida da terra após dias de chuvas intensas. Autoridades da defesa civil já vinham alertando sobre os perigos da área há anos, sem que soluções fossem buscadas. Com informações que permaneciam desencontradas, as autoridades já haviam confirmado três mortes e falavam em cinco desaparecidos até o fechamento desta edição. Na RPP.
Una palabra:
Zancadilla – é como, com apenas uma palavra, é possível se dizer que alguém embaralhou as pernas com a de outra pessoa até perder o equilíbrio (o que, no Brasil, é conhecido como “trançar as pernas”). Mas as definições não são apenas literais: seu significado conotativo e mais comum, segundo muitos dicionários, aponta para uma estratégia ou movimento que tira alguém de um posto ou cargo de forma deliberada – o popular “puxar o tapete”. Para o presidente peruano Pedro Castillo, às vésperas de mais uma votação que pode lhe tirar a faixa presidencial (saiba mais na seção do país), o processo movido pelos parlamentares não passa de uma zancadilla.
PORTO RICO 🇵🇷
Um pé fora da lama. Essas são as raras notícias positivas vindas da ilha, que anunciou formalmente sua saída da situação de falência durante a semana. A declaração veio após o território insular completar o maior processo de reestruturação da dívida pública da história dos EUA – o que, durante os últimos anos, gerou uma grave situação de insolvência pelo não pagamento de um débito de US$ 70 bilhões. Agora, San Juan deve liquidar cerca de US$ 1 bilhão em demandas apresentadas por residentes e empresas locais e emitirá mais de US$ 10 bilhões em títulos. O governo também deve restaurar até US$ 1,3 bilhão retirados de um sistema público de pensões. “Um sucesso significativo”, disse Natalie Jaresko, diretora executiva do conselho de controle federal que supervisiona as finanças de Porto Rico. Via AP.
REPÚBLICA DOMINICANA 🇩🇴
A presidente da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), Julissa Mantilla, sugeriu às autoridades dominicanas a criação de uma mesa para discutir a situação jurídica dos descendentes de imigrantes haitianos no país. A mesa serviria “não para resolver” os problemas insulares, mas, sim, “para propor possibilidades”. “A comissão quer ouvir, conhecer e contribuir”, disse Mantilla. Na audiência, os descendentes de haitianos denunciaram que são visíveis as “obstruções” por parte do Estado nos processos judiciais que dizem respeito a milhares de pessoas destituídas da nacionalidade dominicana em virtude de uma sentença judicial de 2013. A ideia de resolver esse impasse vem na contramão da tendência de separação da ilha de Hispaniola – que abriga os dois países caribenhos –, o que inclui a construção de um muro entre as duas nações. No Hola.
URUGUAI 🇺🇾
Carestia até vai, mas se afetar o churrasco começa a ser questão de Estado no paisito: mais um latino-americano em busca de maneiras de conter a pressão inflacionária que se intensificou desde a invasão à Ucrânia, o Uruguai pretende conceder isenção fiscal a um produto sui generis da dieta local – o tradicional asado de tira. O presidente Luis Lacalle Pou anunciou, na sexta (18), que enviará ao Congresso um projeto de lei que suspenderá a cobrança do IVA, o imposto único sobre bens de consumo, para alguns dos cortes bovinos preferidos nas parrillas da Banda Oriental. A medida, tomada em acordo com produtores e comerciantes, deve valer inicialmente por um mês. No Montevideo Portal.
VENEZUELA 🇻🇪
Quem é vivo sempre aparece. Ainda mais desprestigiado após os EUA ensaiarem uma reaproximação com Nicolás Maduro (leia no último GIRO) buscando uma alternativa ao petróleo russo, o autoproclamado presidente Juan Guaidó pediu que as petroleiras internacionais “não troquem um ditador por outro”, deixando a Rússia para fazer negócios na Venezuela. Dentro dos EUA, a decisão de admitir Maduro como um interlocutor válido segue gerando interrogações, e outra vez o Departamento de Estado precisou se manifestar dizendo que segue reconhecendo Guaidó como “presidente interino” do país e que as conversas em Miraflores pressionaram o governo bolivariano para que haja diálogo com a oposição.
Problemas para a economia venezuelana, oportunidade para a vizinha Roraima. Por conta da crise caribenha, o estado brasileiro que faz divisa com a Venezuela viu um aumento vertiginoso de suas exportações desde o início do século. As vendas para o exterior passaram de US$ 2,5 milhões em 2000 para US$ 336 milhões em 2021 – das quais mais de US$ 244 milhões para Caracas. Com isso, Roraima é, atualmente, o estado cujas exportações mais crescem no Brasil. No Valor.
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