Giro 200: sua newsletter sobre América Latina chega à 200ª edição
Um pouco de (guerra às) drogas, um pouco de salada (de notícias): o resumo semanal do GIRO LATINO traz tudo o que você precisa saber sobre o noticiário caótico da região

“E se a gente consolidar isso aí em uma newsletter?”. Há quase quatro anos, foi mais ou menos assim que a coisa começou. Antes de virar o GIRO como você conhece hoje, nosso boletim semanal era um sonho distante do nosso fundador Lucas Berti, que compartilhava as notícias da América Latina em fios no agora quase finado Twitter (ou X, se preferir). Com a bendición divina do Maurício Brum, nasceu a newsletter para ampliar e consolidar esse trabalho; com o reforço do Juan Ortiz, avançamos na produção multimídia e de conteúdos especiais para nosso novo site; e, com a passagem da Karla Burgoa, mergulhamos ainda mais na cultura e nos costumes da região. Nossa equipe é pequena, pero no mucho: nesses poucos anos, milhares de corações latinos se uniram à nossa causa como assinantes da newsletter, seguidores das nossas redes sociais ou apoiadores diretos do nosso trabalho.
E a Pachamama ouviu: coincidência ou não, o GIRO veio ao mundo durante um dos ciclos mais insanos do continente em anos recentes: só naquela reta final de 2019, a Bolívia sofreu um golpe de Estado, Chile e Equador entraram em suas maiores convulsões sociais no milênio e o Peru dissolveu o Congresso pela primeira vez desde 1992.
Até agora, o noticiário não nos deu trégua. Não importa mais se é segunda-feira, quarta-feira, feriado ou manhã de domingo na América Latina: tem sempre alguma crise à espreita. Só neste ano, explicamos a “morte cruzada” que dissolveu o Congresso no Equador, a morte literal que tirou um dos presidenciáveis equatorianos da disputa, e até conversamos com um dos candidatos dessas eleições. Na Colômbia, o filho do presidente foi preso em meio a um dos escândalos mais bizarros da história recente do país, também explicado em detalhes neste espaço. E nada está tão mal que não possa ficar guatepeor – já que, mesmo com uma vitória surpreendente da esquerda na Guatemala, há planos para matar o presidente eleito ou melar a posse.
Mas, neste continente de pobres corazones, há também espaço para outro tipo de histórias: compartilhamos nossa experiência no show de Fito Páez, lenda do rock argentino, e conversamos com a banda peruana Los Mirlos, precursores da cumbia psicodélica amazônica.
Nossas parcerias com outros sites também renderam matérias e entrevistas que aprofundaram alguns dos assuntos tratados na newsletter: falamos com um historiador sobre as contradições da “nova onda rosa” latino-americana, trouxemos a voz de uma ex-líder sandinista nicaraguense agora perseguida pelo governo; e explicamos como Equador e Bolívia têm partidos políticos indígenas tão fortes.
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E, para quem gosta de números, vão aí algumas curiosidades dessas primeiras 200 edições. Até hoje, o país que mais vezes foi o foco de nossas manchetes foi… o Equador, que também havia sido o destaque da primeira edição de todas, lá em 12 de outubro de 2019. Ao todo, foram 18 vezes com os equatorianos ganhando o maior espaço da newsletter. Logo em seguida, o Peru, com todas as suas crises, ganhou os principais holofotes em 16 vezes, seguido por Chile, Colômbia e Haiti, com 14 cada. Em último lugar, está o Panamá, foco do texto de abertura apenas uma vez, na edição #140 — mas cujas crises internas não escapam do nosso radar. É claro: muitas vezes, as questões abordadas pelo GIRO afetam muito mais que uma nação só – e, por isso, a maioria das manchetes (39) foi dedicada a temas regionais.
Ao todo, publicamos ainda 295 verbetes entre nombres, palabras e expresiones, incluindo os dois que você encontrará nesta edição. E, para surpresa de ninguém, citamos mais vezes aqueles presidentes que já estavam no poder (ou o assumiram) a partir de 2019, primeiro ano da newsletter: o top-5 é composto pelo salvadorenho Nayib Bukele (citado nominalmente em 166 edições, incluindo esta), pelo venezuelano Nicolás Maduro (160), pelo nicaraguense Daniel Ortega (156), pelo mexicano Andrés Manuel López Obrador (148) e pelo argentino Alberto Fernández (136). No extremo oposto, o dominicano Danilo Medina, que deixou o cargo antes que o GIRO completasse seu primeiro ano – e antes do agravamento das crises do vizinho Haiti, que colocaram Hispaniola no foco. Ele foi o presidente menos citado entre os que governaram no período em que somos publicados, aparecendo em apenas quatro edições antes desta. Confira esse curioso levantamento em forma de mapa, na seção Un Dibujo.
Un sonido:
DESTAQUES
🇦🇷 Museu da Memória em Buenos Aires entra em lista de Patrimônio Mundial da Unesco – A partir de terça (19), o Museu da Memória em Buenos Aires, localizado na antiga sede da Escola Superior de Mecânica da Armada (ESMA), convertida em um infame centro de tortura durante a ditadura militar (1976-1983), passou a ser classificado como Patrimônio Mundial da Unesco. A inclusão foi anunciada pela entidade por considerar o espaço um local de “valor notável para a humanidade” por seu papel de preservação da história recente do país platino como “o símbolo mais proeminente do terrorismo estatal” – e por onde passaram pelo menos um sexto dos mais de 30 mil mortos e desaparecidos durante o regime. A classificação foi celebrada pelo presidente Alberto Fernández, que defendeu a manutenção da memória “para que as más experiências não se repitam”. Também vem em boa hora: como citado recentemente pelo GIRO, a atual candidata à vice-presidência ao lado do extremista (e favorito) Javier Milei, Victoria Villarruel, encabeça um movimento que, quase de forma inédita, busca relativizar a verdade histórica no país a respeito dos anos de repressão. No Página 12.
🇬🇹 Guatemala: semana tem protestos pró-Arévalo, que promete retomar transição em novo formato – Numa semana marcada por protestos de organizações sociais e indígenas a favor do presidente eleito Bernardo Arévalo e contra as investidas do Ministério Público para tentar barrar o partido dele, decisões importantes a respeito da transição de governo: em um comunicado divulgado em seus canais oficiais na quinta (21), Arévalo anunciou que enviou ao presidente sainte Alejandro Giammattei – que jamais se opôs à passagem de bastão, apesar das várias polêmicas envolvendo seu governo – uma nova “proposta metodológica” para retomar o processo de troca de comando, suspenso desde o último dia 12. Iniciada em 4/9, a transição foi cancelada pelo binômio vitorioso em protesto ao assédio judicial levado adiante por integrantes do Ministério Público, que seguiram investigando urnas e pressionando o partido eleito sob a justificativa de que o processo eleitoral poderia estar diante de irregularidades (entenda como o mesmo órgão do MP tentou, lá atrás, tirar Arévalo do 2º turno). Além de suspeitas, as ações movidas contra a dupla eleita e o partido Semilla – classificadas por Arévalo como uma tentativa de “golpe de Estado” – também não encontram eco na Justiça local, bem como são criticadas por observadores internacionais que acompanharam toda a votação. Após nova reunião com a Organização dos Estados Americanos (OEA), o político que tomará posse em 14 de janeiro disse que submeteu sua nova proposta ao governo atual, com expectativa de que tudo volte aos trilhos a partir da próxima segunda-feira (25). A Presidência, por sua vez, confirmou ter recebido a carta com a nova proposta, mas garantiu que submeteria o documento a uma “análise” antes de dar qualquer resposta. Na Prensa Libre.
🇭🇹 Haiti: com armas na mão, gangues marcham exigindo queda de premiê Ariel Henry – “Estamos iniciando uma luta para derrubar o governo. Nossa luta será com armas”. A frase é de ninguém menos que Jimmy “Barbecue” Chérizier, o ex-policial apontado como principal líder das cada vez mais poderosas gangues haitianas, e foi dita na terça (19) durante uma nova leva de protestos que pediam a renúncia do atual premiê Ariel Henry – homem mais forte da política local, Henry jamais cumpriu com as promessas de convocar novas eleições após o assassinato do presidente Jovenel Moïse em 2021, crime no qual o próprio atual premiê poderia estar envolvido (entenda por que ele é acusado de tentar se perpetuar no poder). Barbecue, que se intitula um líder à frente de uma revolução e se diz contrário a interferências estrangeiras em seu país, cutucou a comunidade internacional – segundo ele, se países de fora “não têm nada a ver com a morte [de Moïse], eles não devem apoiar Ariel Henry”. Enquanto a tensão se alastra pelas ruas e as perspectivas de soluções num país praticamente desgovernado ainda são poucas, aqui um exemplo do quão incerto é o futuro: apenas nessa última semana, o Haiti estabeleceu laços diplomáticos com o Quênia, nação africana que, recentemente, ofereceu “ajuda humanitária” ao convulsionado país caribenho (no caso, enviando não as Forças Armadas, mas, sim, unidades da polícia acusadas de cometer graves abusos). Via Reuters.
🇲🇽 México: derrotado nas primárias, ex-chanceler cria ‘movimento político’, mas mantém mistério sobre saída do Morena – Uma “associação civil, não um partido político”. Foi isso que o ex-chanceler mexicano Marcelo Ebrard, derrotado nas primárias presidenciais do governista Morena, anunciou na segunda (18), duas semanas após ser descartado como candidato oficial nas eleições de 2024. “Por que estamos formando uma associação? É a forma como nos organizamos. Somos um movimento político, mas precisamos ter uma forma própria de organização”, disse, ainda fazendo mistério sobre se deixará ou não o partido no poder para alçar um voo solo no próximo ano. Com direito a assinatura de documento e tudo, Ebrard convocou senadores e deputados a se juntarem à sua nova empreitada, prometendo percorrer o país para costurar alianças a partir dos próximos dias. Enquanto isso, o comitê de justiça do Morena segue analisando a demanda interposta pelo ex-chanceler, que tenta impugnar o processo de escolha que acabou definindo a ex-prefeita da capital, Claudia Sheinbaum, como a presidenciável morenista no próximo ano (saiba mais). Sem entrar em intrigas, o presidente Andrés Manuel López Obrador chegou a dizer nos últimos dias que respeita a decisão de seu “amigo” – os dois trabalham juntos na política há anos – mas afirmou que não haverá um novo processo de escolha de seu provável sucessor. As eleições mexicanas acontecem em junho de 2024. Na Forbes.
🇩🇴 Sem reabrir fronteiras, Rep. Dominicana começa suas próprias obras no Rio Massacre – Na semana seguinte ao fechamento das fronteiras com o Haiti como represália pelo desvio das águas do Rio Massacre, na fronteira norte (leia mais), o governo dominicano anunciou que começou a fazer seus próprios trabalhos preventivos para garantir que os agricultores do seu lado da divisa não fiquem sem irrigação. Em outro ponto do curso d’água, também chamado de Dajabón, foram iniciados na quarta-feira (20) projetos de captação para os produtores dominicanos, informou o porta-voz do governo, Homero Figueroa. Enquanto Santo Domingo segue aguardando posicionamentos mais convictos da gestão de Ariel Henry, os trabalhos do lado haitiano continuaram, confirmando as promessas das lideranças campesinas locais de que estavam dispostas a morrer para defender a construção do canal. Numa semana também marcada pela Assembleia Geral da ONU, o presidente dominicano Luis Abinader usou grande parte de seu tempo para reforçar que seu país não pode lidar solitariamente com os problemas do vizinho, enfatizando que “o tempo se esgotou” para a comunidade internacional se mobilizar.
Un dibujo:
MAIS NOTÍCIAS
REGIÃO 🌎🥵
Se você lê este GIRO de algum lugar do Brasil, sabe que está quente como uma chapa de padaria. Mas, com a nova onda de calor no inverno, não seria diferente caso seu endereço de leitura estivesse localizado nos vizinhos Paraguai e Argentina. Se na capital do Chaco há expectativa de termômetros batendo 41 ºC no final de semana (é esperado algo tão brutal para esses dias que São Paulo, por exemplo, pode ter seu dia mais quente de toda a história), em províncias argentinas norteñas, temperaturas podem repetir os 45 ºC vistos em vários pontos do território brasileiro, segundo o Serviço Meteorológico Nacional (SMN). Mais ao sul do subcontinente, o Uruguai vê com preocupação a situação dos vizinhos, mas ainda não tem previsão de picos de calor para os próximos dias.
BOLÍVIA 🇧🇴
Escândalo pitoresco no lugarejo de Buena Vista, cidade de cerca de 10 mil habitantes no departamento de Santa Cruz: os vereadores da cidade exigiram, na terça (19), um pedido público de desculpas do prefeito por ter se animado demais durante o show de uma imitadora da cantora mexicana Gloria Trevi. Tudo aconteceu no último dia 15, quando o prefeito Teodoro Gonzales Saucedo ocupou o centro das atenções durante a apresentação em um município vizinho, que incluiu danças sensuais por parte da cantora com pouca roupa – quem terminou fazendo um strip-tease, porém, foi o próprio Teodoro, que nos vídeos do evento primeiro aparece deitado no chão enquanto “Gloria Trevi” baila sobre ele e, depois, acaba o ato sem camisa, que é atirada na direção da plateia pela imitadora. Para os vereadores, a animação do mandatário constituiu uma série de atos “antiestéticos e imorais”. O prefeito contra-argumentou que tudo foi “são, sem bebidas nem nada de ruim” e que “não houve excessos”. E lançou o que considerou a cartada definitiva para não precisar se explicar para os habitantes da própria cidade: “eu estava em San Carlos, não em Buena Vista”. Em El Deber.
CHILE 🇨🇱
Em cerca de quatro anos desde a implementação de um protocolo para controlar e punir episódios do tipo, já foram mais de 750 denúncias de assédio sexual e moral nas Forças Armadas do Chile. O número é resultado de um levantamento inédito feito pelo portal El Mostrador a partir de um pedido da lei de transparência do país, e se refere a todos os ramos militares – Exército, Marinha e Aeronáutica – no período entre março de 2019 e maio de 2023. Três quartos dos casos ocorreram no Exército, onde a maioria das investigações foi concluída sem qualquer tipo de sanção aos acusados: apenas 35% das denúncias de assédio sexual e 13% daquelas de assédio moral resultaram em algum tipo de punição. O jornal ainda questionou as Forças Armadas sobre as modificações feitas em função do protocolo, quais tipos de delitos geralmente são denunciados, quais sanções existem e como é a possibilidade de recursos caso a pessoa que fez a denúncia não fique satisfeita com o resultado da investigação – mas nenhuma instituição respondeu. Em El Mostrador.
COLÔMBIA 🇨🇴
De olho no sonhado plano de “paz total”, o governo do presidente Gustavo Petro anunciou na terça (19) o início de tratativas de cessar-fogo com o Estado-Maior Central (EMC), principal célula dissidente das FARC, outrora maior guerrilha do país, mas desmobilizada em 2016. Por meio de um comunicado conjunto, governo e grupo armado se comprometeram a estabelecer uma mesa de diálogo a partir de 8/10 em Tibú, no departamento de Norte de Santander, na região noroeste do país. O objetivo do encontro é retomar contatos com a “participação real e efetiva das diferentes expressões da sociedade”. Em diferentes etapas de negociação de paz com os principais grupos armados do país – com o ELN, principal guerrilha ativa do país, por exemplo, tudo já acontece de maneira formal, mas nebulosa e incerta – Bogotá cortou o contato como EMC em maio, após a morte de quatro menores indígenas em Putumayo. Enquanto isso, mais revelações sobre os casos dos “falsos positivos”: em audiência da Jurisdição Especial para a Paz (JEP), 367 militares e agentes do Estado revelaram como articularam a morte e o desaparecimento de 296 civis no departamento de Casanare, na região das planícies colombianas. Em El País.
COSTA RICA 🇨🇷
Sem o presidente Rodrigo Chaves, que deixou de ir a Nova Iorque por questões de saúde, os ticos enviaram à ONU o chanceler Arnoldo Tinoco, que na segunda (18) se reuniu com o secretário-geral da entidade, António Guterres, para tratar de um tema que se torna cada vez mais recorrente no círculo de poder costa-riquenho: os crescentes abusos que acontecem na vizinha Nicarágua (saiba mais). Segundo Tinoco, há uma “falta de consciência” internacional a respeito da crise nicaraguense, cujo efeito ninguém sente mais do que a própria Costa Rica (para onde vários cidadãos e até veículos de imprensa, afetados pelos problemas internos, fogem em busca de maior estabilidade). As duas autoridades também conversaram sobre o quadro migratório geral na América Latina, algo que vem crescendo após a pandemia de covid-19, sobretudo pelo alto números de travessias entre a Colômbia e o Panamá. De acordo com o governo em San José, a gestão Chaves carece de “recursos e cooperação” para lidar com os mais de 250 mil pedidos de refúgio ainda pendentes. No Nación.
Un nombre:
Pablo Neruda – Nobel de Literatura em 1971, senador pelo Partido Comunista, embaixador do governo de Salvador Allende e dono de um gigantesco currículo de obras publicadas em décadas de carreira, o escritor cuja morte completa 50 anos neste sábado (23) não se chamava nem Pablo nem Neruda quando nasceu. Ricardo Eliécer Neftalí Reyes Basoalto adotou o pseudônimo – que mais tarde virou seu nome legal – quando lançou seus primeiros textos, aos 16 anos, em 1920. O poeta nunca revelou publicamente o motivo da escolha do nome, nem se ele de fato era uma homenagem ao escritor tcheco Jan Neruda (1834-1891), mas esta foi a versão que prevaleceu – em La Chascona, a casa-museu onde o Neruda chileno viveu em Santiago, inclusive há uma placa entregue pelo governo tcheco exaltando a suposta relação. Nome notório da esquerda, Neruda morreu há exatos 50 anos nesta data quando a ditadura de Augusto Pinochet recém entrava em seu 12º dia. Até hoje continuam as investigações para determinar se ele não foi uma vítima a mais do regime: em fevereiro, o resultado de uma nova perícia indicou que o poeta teria sido envenenado e muitos veículos chegaram a noticiar essa versão como uma conclusão já reconhecida, mas a Justiça chilena ainda não ditou sentença sobre o caso. Oficialmente, Neruda teria morrido em decorrência de complicações de um câncer de próstata.
CUBA 🇨🇺
“Ampliar a troca de tecnologias entre os dois países”, entre outros acordos, foi o que acordaram representantes cubanos e brasileiros durante um encontro realizado em Havana no último sábado (16). As reuniões contaram com a participação do presidente Lula, que se tornou o primeiro chefe de Estado brasileiro a visitar a capital da ilha desde 2014, quando a então presidenta Dilma Rousseff foi ao Caribe para a inauguração do porto de Mariel, modernizado com financiamento do governo brasileiro. Os dois países também acordaram medidas na área de saúde, definindo, por meio de protocolos de cooperação, troca de figurinhas na área científica. Segundo a ministra brasileira da Saúde, Nísia Trindade, “o Brasil se beneficia de um conhecimento de ponta que Cuba desenvolveu e investiu por anos”. Lula, por fim, endossou as denúncias históricas repetidas por seu homólogo Miguel Díaz-Canel: “[Cuba é] vítima de um embargo econômico ilegal”. A posição, que ganhou manchetes, não chega a ser grande novidade na comunidade internacional – a ONU aprova todos os anos há três décadas uma resolução conjunta condenando o embargo, com os únicos votos contra normalmente sendo os dos próprios EUA e de Israel –, mas virou assunto porque o Brasil havia mudado seu posicionamento histórico durante os dias de Jair Bolsonaro (2019-2022). Via Agência Brasil.
EL SALVADOR 🇸🇻
“As decisões que El Salvador tomou [contra as gangues] são corretas”, “os resultados estão aí” e são “irrefutáveis”, disse, na terça (19), a pessoa que… decidiu iniciar uma guerra às gangues. Na ONU, com seu jeitinho de sempre, o presidente Nayib Bukele voltou a exaltar o próprio plano de segurança pública, que desde o ano passado vem esmagando a atividade das pandillas e elevou a taxa de encarceramento salvadorenha ao maior patamar global, tudo enquanto um sem-número de abusos aos direitos humanos se acumulam – com prisões, torturas e mortes de cidadãos comuns, sem ligação com o crime, sob custódia. “Hoje venho dizer que esse debate acabou”, disse Bukele, que costuma usar suas redes sociais para ironizar reportagens, sobretudo da imprensa internacional, com críticas às táticas adotadas em seu país. É fato que a violência diminuiu – afinal, trata-se do país que, até 2015, era considerado o mais violento do mundo. Mas a sensação de segurança nas ruas, refletida no apoio quase religioso recebido pelo presidente, não é fácil de ser medida em dados oficiais – há suspeitas de que os próprios números de baixa na criminalidade sejam manipulados, com homicídios caindo mais do que o esperado porque o número de “desaparecimentos” explodiu. O mandatário também falou da migração, prometendo reverter o fluxo de pessoas que deixam El Salvador em função de “políticas erradas do passado” e dos “efeitos da Guerra Civil” (1979-1992). Via AP.
EQUADOR 🇪🇨
Em um país que vive uma crise de segurança pública, não parece uma grande ideia simular uma perseguição policial em um lugar lotado. Mas, para o influencer equatoriano Aaron R., o bom senso passou longe e foi exatamente isso que ele resolveu fazer: em um vídeo com intenção de se tornar viral, um suposto criminoso foge de dois homens vestidos como policiais em um shopping… até que tudo termina com um beijo entre o “bandido” e um dos “agentes”. Diante do pânico de quem testemunhou a cena ao vivo antes do desfecho improvável, as autoridades ecoaram a indignação e prometeram processar o criador de conteúdo por utilizar irregularmente o uniforme policial, o que pode render até 30 dias de cadeia. Assustado, Aaron R. gravou um vídeo na quarta (20) pedindo desculpas, dizendo que só reproduziu uma paródia já feita em outros países e garantindo que os “agentes” não usaram distintivos nem indumentárias oficiais da Polícia Nacional. Em El Universo.
GUATEMALA 🇬🇹
“A bandeira fica aqui, um território belizenho”. Bem ao estilo conquistador, foi isso que um grupo de civis, divididos em quatro embarcações, fez na última semana enquanto passava pela foz do rio Sarstún, cuja bacia é compartilhada pelos territórios de Guatemala e Belize. Só revelado no domingo (17), o caso virou treta: após fincar a bandeira, os navegantes foram abordados pela marinha guatemalteca, que retirou o artefato e entregou a autoridades do país vizinho (saiba mais sobre o quase latino-americano Belize neste podcast). Segundo militares do lado guatemalteco, episódios desse tipo, mesmo que pacíficos, devem seguir acontecendo até que os dois países resolvam a disputa territorial, insular e marítima que divide as duas nações e leva a Guatemala a reclamar quase metade do território ao lado há mais de 160 anos (entenda o contexto histórico). Após consultarem, em 2018 e 2019, suas respectivas populações sobre o envio da demanda à Corte Internacional de Justiça (CIJ) – o “sim” venceu nos dois casos –, os países aguardam novidades no processo, que deve passar por novas audiências em 2024. Na Prensa Libre.
HONDURAS 🇭🇳
Agora vai? Na segunda (18), a presidenta Xiomara Castro entregou ao secretário-geral da ONU, António Guterres, um documento oficial para a instalação da Comissão Internacional Contra a Corrupção e a Impunidade em Honduras (Cicih), tema que se tornou um dos pilares de suas promessas de campanha. Segundo um comunicado da Presidência, o material entregue visa acelerar os trâmites para que a implementação da Cicih possa ganhar corpo ainda este ano, dando ao país apoio da ONU em investigações de crimes de colarinho branco com “imparcialidade, independência e autonomia” – tudo, porém, é mais nebuloso, já que o processo precisa de aprovação do Congresso, onde o governo Castro coleciona cada vez mais adversários. O tema também gera dúvidas, já que a maioria das promessas da presidenta – como avanços em pautas sociais e a redução da violência contra ativistas – não se cumpriram. Na Prensa.
NICARÁGUA 🇳🇮
Em semana de Assembleia Geral na ONU, foi difícil para a Nicarágua não ficar no centro dos holofotes em diversos momentos – até porque o país é investigado pela própria entidade multilateral por violações de direitos humanos atribuídas ao governo de Daniel Ortega. Entre os atos simbólicos das reuniões da vez, figura a entrada do Brasil em um bloco de países latino-americanos (mais o Canadá) que vem pressionando o regime em Manágua a libertar dissidentes presos e autorizar a entrada de inspetores da ONU para investigar as denúncias contra o país. Sob Lula, o Brasil vem defendendo a manutenção de canais abertos de diálogo com Ortega, mas nem mesmo a boa vontade do novo governo em Brasília com o histórico líder guerrilheiro impediu o Itamaraty de se juntar aos clamores que cada vez agrupam mais líderes de esquerda. O Brasil e os países do grupo pedem que a Nicarágua “liberte todos os presos políticos e inicie um diálogo de boa-fé com a comunidade internacional”. No UOL.
Una expresión:
Con el diario del lunes – Uma maneira platina de dizer que é muito fácil opinar sobre alguma coisa quando o fato já está consumado e os resultados de uma determinada ação são conhecidos. A frase usada na Argentina e o Uruguai literalmente significa “com o jornal de segunda-feira” e teria origem no futebol: como as rodadas dos campeonatos normalmente eram disputadas ao longo do final de semana, ficava mais simples dar pitacos cheios de convicção tendo em mãos o que saiu impresso na segunda. Com o tempo, a expressão passou a ser empregada em diferentes contextos para criticar quem só se anima a tomar posição quando todas as informações já são amplamente disseminadas, algo semelhante ao “engenheiro de obra pronta” que temos em português.
PANAMÁ 🇵🇦
Migração. Sem qualquer surpresa, esse foi o tema que balizou uma breve conversa realizada na terça (19) entre o presidente Laurentino Cortizo e seu homólogo colombiano, Gustavo Petro. Em Nova Iorque para compromissos na ONU, os dois mandatários tiraram um tempinho para tratar do principal assunto envolvendo suas fronteiras: o incessante fluxo de pessoas que atravessam o estreito de Darién. Além da preocupação humanitária, o número cada vez maior de travessias também tem gerado ruído entre autoridades migratórias dos dois países, com acusações panamenhas que apontavam falta de cooperação por parte dos colombianos. Enquanto os dois países (além dos EUA, principal destino desses migrantes) não se encontram para falar do assunto devidamente, Cortizo e Petro abordaram métodos para alcançar um fluxo migratório “ordenado e seguro”. O encontro também tratou de outros temas bilaterais, como a interconexão elétrica entre as duas nações vizinhas. No Panamá América.
PARAGUAI 🇵🇾
Troca: o governo do recém-empossado presidente Santiago Peña anunciou na terça-feira (19) que devolverá a sede da embaixada paraguaia em Israel para Jerusalém, decisão confirmada após uma conversa com o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu. Em resposta à decisão, Netanyahu anunciou que Israel também vai reabrir uma representação diplomática em Assunção. Historicamente, a embaixada guarani sempre esteve estabelecida em Tel Aviv, repetindo o que fazem quase todos os países do mundo (com exceção, deste lado do mapa, de Guatemala, Honduras e EUA). A decisão de transferir o escritório para Jerusalém – um tema caro à Palestina, mas encorajado por Israel, que reconhece a cidade como sua capital “eterna e indivisível” – veio no final do governo do ex-presidente Horacio Cartes (2013-2018), mas acabou rapidamente revertida por Mario Abdo Benítez, antecessor de Peña. Agora, o movimento inusitado se repete e também reproduz as discórdias internas no partido hegemônico que governa o Paraguai: embora Cartes, Abdo e Peña sejam todos do mesmo Partido Colorado, o atual presidente é da ala cartista, enquanto o mandatário que deixou o cargo em agosto representava uma corrente oposta na sigla. Vale lembrar: tirar a embaixada de Tel Aviv é uma medida que, geralmente, carrega um elemento político, sendo algo que o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro (2019-2022), num gesto de subserviência a Washington, também prometeu fazer durante sua gestão. No ABC Color.
PERU 🇵🇪
O que parecia um centro de cuidados obstétricos operando na cidade de Cusco era, na verdade, a unidade clandestina de uma infame rede de tráfico de bebês, que fazia crianças e familiares vítimas em troca de dinheiro. Sem ainda conseguir dimensionar o número total de pessoas envolvidas, autoridades peruanas tornaram públicas algumas informações: em um dos casos, um bebê chegou a ser comprado por pouco mais de US$ 800, sem que fosse possível descobrir o paradeiro de sua mãe biológica (ou mesmo se ela própria estava entre as vítimas da rede). A procuradoria que investiga tráfico de pessoas, um dos órgãos à frente do caso, também deve levar a inquérito funcionários da área da saúde, acusados de colaborar com o esquema. “O Ministério Público estima que cerca de 20 crianças tenham sido vítimas do crime”, diz a polícia local. O Peru convive com um histórico preocupante de crimes contra a família e a mulher, com destaque para a macabra onda de esterilizações forçadas de mulheres – majoritariamente indígenas em regiões periféricas – vendidas como “política sociossanitária” durante a ditadura de Alberto Fujimori (1990-2000). N’O Globo.
PORTO RICO 🇵🇷
Não quer dar margem para concorrência: a equipe do governador Pedro Pierluisi anunciou, na terça (19), que o mandatário vai lançar sua campanha à reeleição para o comando de Porto Rico no próximo dia 1º/10, tentando dar um basta aos rumores de que pode sofrer com primárias do Partido Novo Progressista (PNP), que ele próprio preside. O movimento pode parecer óbvio à primeira vista, mas se explica pela forma como a política porto-riquenha se organiza: os candidatos têm um partido na própria ilha (neste caso, o PNP), mas também são vinculados a alguma das duas grandes legendas dos Estados Unidos, país ao qual Porto Rico é um território livre associado. Assim, como Pierluisi é militante democrata, existe expectativa de que os republicanos lancem um nome para tentar encabeçar a chapa do PNP – no caso, o de Jennifer González, que atualmente exerce o cargo de comissária residente em Washington (posto que representa os interesses de Porto Rico no Congresso estadunidense, mas sem direito a voto). Em março, uma pesquisa indicou que Pierluisi poderia ter vida difícil em eventuais primárias contra ela, aparecendo atrás nas preferências. Enquanto González ainda não confirma se tomou uma decisão a respeito da própria candidatura, Pierluisi força a mão e organiza o ato com um nome sugestivo: Puerto Rico tiene Líder. A ilha escolhe governador em 5 de novembro de 2024, junto com as eleições gerais dos EUA. Em El Nuevo Día.
URUGUAI 🇺🇾
O esporte parece mesmo ser um tema recorrente no noticiário envolvendo o clã presidencial dos Lacalle. Na semana após o presidente Luis Lacalle Pou – ele próprio já famoso como surfista amador e por frequentar os jogos da equipe do Boston River, um dos clubes pequenos do futebol montevideano – visitar a França para se encontrar com Emmanuel Macron e assistir a um jogo da Seleção Uruguaia de rugby, agora foi a vez do filho do mandatário virar notícia por razões esportivas: Luis Lacalle Ponce De León, de 19 anos, fez sua estreia no futebol do paisito na terça-feira (19), em uma partida do nanico Cooper pelas fases preliminares da Copa do Uruguai. Lacalle, o filho, entrou aos 34 do 2º tempo e teve participação discreta no jogo que, se não fosse por ele próprio, seria totalmente esquecível: o confronto acabou em 0 a 0 e o Cooper, que disputa as ligas amadoras, acabou sendo eliminado nos pênaltis pelo também modesto Libertad de San Carlos. Em El Observador.
VENEZUELA 🇻🇪
O governo dos EUA anunciou, na quarta (20), que vai conceder autorização especial de trabalho para quase meio milhão de imigrantes venezuelanos já instalados no país. A medida, que a princípio valerá por 18 meses, afeta cerca de 472 mil pessoas que chegaram do país sul-americano até o final de julho e serve para protegê-los de uma remoção e para acelerar o processo de encontrar um emprego enquanto aguardam uma decisão sobre seus pedidos de asilo. A ideia do governo Joe Biden é aliviar o peso sobre o sistema de seguridade social que precisa atender aos solicitantes de refúgio, dando aos venezuelanos a oportunidade de se sustentar no período em que esperam uma resposta das autoridades. Autoridades em Washington enfatizaram que o status especial não vale para quem chegou a partir de agosto – esses, por sua vez, seguirão sendo “removidos quando não estiverem uma base legal para permanecer [nos EUA]”. No New York Times.
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