🇪🇨 Equador declara ‘guerra ao terrorismo’ em crise inédita
Inflação argentina supera 200% | Sob tensão, Bernardo Arévalo toma posse na Guatemala | Haiti: juiz manda prender autoridades, incluindo ex-presidente
Ao ler a segunda edição do GIRO em 2024 neste sábado (13), você certamente já sabe que o Equador passou a segunda semana do ano engolido por cenas de terror. O fio que desatou o descalabro foi puxado na segunda (8), quando o governo de Daniel Noboa decretou estado de exceção por 60 dias, além de toque de recolher, em resposta à fuga da prisão de Adolfo Macías, conhecido como “Fito” e líder da conhecida gangue Los Choneros – apenas uma entre tantas organizações criminosas que têm atormentado o país nos últimos anos. Como esta mesma newsletter explicou em edições passadas, o avanço do narcotráfico transformou o país andino, até então relativamente calmo, em um dos mais violentos e perigosos da América Latina.
A fuga de “Fito” (a segunda neste século), que cumpria uma pena de 34 anos por diversos crimes, causou uma espiral de violência até então inédita, mesmo para os padrões equatorianos atuais. No dia seguinte à assinatura do decreto, no que se estima ter sido uma reação direta à medida, criminosos armados invadiram os estúdios da emissora pública TC Televisión em Guayaquil. Funcionários foram feitos de reféns enquanto eram ameaçados com explosivos, pistolas e espingardas, tudo captado pelas câmeras durante a transmissão ao vivo. Os criminosos, supostamente, queriam ler no ar uma mensagem dirigida a Noboa. De forma coordenada, delinquentes também atacaram a Universidade de Guayaquil, causando pânico entre estudantes e professores. As aulas presenciais só voltariam a ser permitidas a partir da sexta-feira (12), sob policiamento reforçado. No restante da cidade, houve relatos de explosões, veículos queimados, saques a centros comerciais e tiroteios. Pelo menos 10 pessoas morreram durante os eventos, sendo dois agentes de segurança.
Até a noite de sexta-feira, cerca de 120 pessoas – entre agentes penitenciários e outros funcionários – eram mantidos reféns em sete presídios do país e 56 tinham sido liberados. Já 119 pessoas foram detidas por envolvimento nos atos violentos da última semana, entre foragidos recapturados e novos presos, segundo as autoridades.
Em algumas horas, uma ação da Polícia Nacional prendeu os criminosos que invadiram a sede do TC Televisión. Quase em sequência, o governo Noboa também reagiu institucionalmente, anunciando um novo – e mais urgente – decreto: a partir de terça (9), o Equador estava oficialmente em um “conflito interno armado” contra o crime. Mais severa do que o anterior, a nova normativa manteve a eliminação de garantias constitucionais e passou a listar uma dezena de “grupos do crime organizado transnacional” como “organizações terroristas”. O documento também colocou militares nas ruas, ordenando que efetivos das Forças Armadas neutralizassem todos os que colocassem em risco a segurança nacional. Jaime Vela Erazo, chefe do Comando Conjunto das Forças Armadas, não titubeou, anunciando que a partir dali pessoas identificadas com os grupos armados seriam “objetivos militares” – ou seja, há licença para matar, e até mesmo uma “anistia preventiva” já foi acordada no Congresso.
Dentro e fora do país, Noboa encontrou resposta positiva às ações tomadas no auge da crise. Lideranças de quase todos os países vizinhos, incluindo presidentes à esquerda, usaram as redes sociais para endossar a mão dura do presidente contra o crime, em alguns casos oferecendo apoio para estabelecer medidas de cooperação conjuntas de combate ao tráfico internacional. O Peru de Dina Boluarte, que faz divisa com o Equador, foi além: por meio do primeiro-ministro Alberto Otárola, o governo Boluarte anunciou que toda sua fronteira norte seria mantida em estado de emergência, prometendo o envio de um contingente policial para a região. O controle de postos de fronteira também seria intensificado.
Internamente, o novo decreto de Noboa também foi abraçado de forma praticamente unânime pela classe política. O Congresso anunciou que “trabalharia em unidade” pela causa, sem se importar “com as diferentes correntes políticas” representadas no legislativo. Respaldando sem contrapesos o trabalho militar nas ruas, o Parlamento também prometeu dar “máxima prioridade” à aprovação de normas de segurança – vale lembrar que Noboa pretende levar o tema a referendo e adicionou nove novas perguntas em seu plano contra o crime diante dos últimos acontecimentos – e concordou em conceder anistia e indultos a agentes de segurança “nos casos em que seja necessário para garantir as tarefas” de manutenção da ordem. Em outras palavras, deputados deram carta-branca para que militares e policiais enfrentem criminosos sem medo de possíveis processos por abuso do uso da força – ainda que o decreto presidencial fale em ações que “respeitam os direitos humanos”.
Até mesmo a Confederação das Nacionalidades Indígenas do Equador (Conaie), famosa por levar adiante suas demandas ao ponto de balançar diversos presidentes, respaldou as medidas duras de Noboa, mas alertou o governo para “não usar esta crise como desculpa para aprovar leis ou políticas antipopulares” – em meio ao furor militarista, nunca é demais lembrar que a história latino-americana está repleta de massacres aos povos originários falsamente acusados de envolvimento com os inimigos públicos da vez.
Mais além no campo político, o apoio ao decreto veio até mesmo do ex-presidente Rafael Correa (2007-2017), líder ‘in absentia’ da Revolução Cidadã (RC), partido com a maior representação no mesmo Congresso – e a quem o agora governista Ação Democrática Nacional (ADN) se aliou tempos atrás. Pelo X (antigo Twitter), Correa disse que nesta guerra declarada pelo crime organizado ao Estado, “o Equador deve sair vitorioso”. O antigo mandatário também fez apelos à “unidade nacional” e até sugeriu que o governo coloque “civis e policiais aposentados em cargos administrativos” para colocar toda a corporação disponível nas ruas. Mas, apesar do apoio, Correa também disse em entrevista à RFI que o governo talvez não tenha todo o preparo necessário para enfrentar o problema e – fazendo um pouco de política – se colocou à disposição para ajudar a conciliar o país.
O líder do correísmo também não se livrou das críticas. Em meio à crise, a ministra do Interior, Mónica Palencia, citou indiretamente o ex-presidente quando atribuiu parte do atual problema a “pactos” feitos com criminosos durante os anos em que a RC esteve à frente do Executivo. Correa se defendeu, dizendo em entrevista que o plano de pacificação adotado durante seu governo tinha o objetivo apenas de desmobilizar pequenas pandillas urbanas, cuja principal atividade era “aplicar golpes”. Ironizando as acusações, disse que um país não pode simplesmente sair do controle tão rápido por culpa de um processo de pacificação de 14 anos atrás.
Como foi o caso durante os últimos dias, seja na macro ou na micropolítica, todas as discussões no Equador devem seguir orbitando o tema da segurança pública.
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🇦🇷 Com inflação anual de 211% em 2023, Argentina ultrapassa Venezuela em ranking indigesto – O Instituto de Estatística e Censos (Indec) da Argentina divulgou na quinta-feira (11) os números que dão uma dimensão do que o governo de Javier Milei terá pela frente na economia: segundo dados oficiais, a inflação foi de 211,4% em 2023, patamar mais alto desde o início dos anos 1990, quando o país agonizou ante um quadro geral de hiperinflação. Considerando apenas o mês de dezembro, os preços subiram pouco mais de 25%, contra 12,8% no mês anterior, acelerando ainda mais a escalada após as primeiras medidas de “choque” adotadas por Milei, na sequência de sua posse em 10/12 – resta ver, agora, como a economia vai reagir durante o trimestre seguinte ao pacote de mudanças colocadas em atividade pela nova administração em Buenos Aires; analistas estimam que os números devem seguir ruins no curto prazo. Se a espiral de preços argentina não é necessariamente uma novidade, o número atingido acabou chamando a atenção por mudar algo que parecia inalterável: o posto de país com maior inflação na América Latina. Considerando o acumulado do último ano, os platinos passaram ninguém menos que a Venezuela, há mais de década a detentora (com folga) da triste marca inflacionária. Ao menos segundo o Observatório Venezuelano de Finanças (OVF), que traz números à margem do governo, o índice no último ano foi de 193%. O mesmo OVF registrou uma inflação de 305% em 2022, contra 234% nas contas oficiais; o Banco Central venezuelano ainda não informou seus números oficiais de inflação para 2023. Em outras notícias, o governo Milei e o Fundo Monetário Internacional (FMI) também entraram no ano fechando acordos referentes à bilionária dívida argentina. No site do Indec.
🇬🇹 Após cinco meses de crise intensa, Guatemala empossa Bernardo Arévalo no domingo (se nada mais acontecer) – Desde sua surpreendente e robusta vitória eleitoral no segundo turno das eleições presidenciais no último mês de agosto (relembre), Bernardo Arévalo enfrentou de tudo: escapou de um possível atentado armado, viu seu partido, a jovem agremiação Semilla, ser suspenso sob acusações jamais provadas de irregularidade, e ainda enfrentou pressões políticas das mais variadas vindas de membros do infame Ministério Público, que nunca pareceu aceitar a vitória legítima da esquerda nas urnas. Mesmo assim, Arévalo resistiu e chega pronto para assumir os desafios dos próximos quatro anos de mandato a partir deste domingo (14), data marcada para a cerimônia de posse. Vale lembrar: sua adversária no turno derradeiro, a conservadora Sandra Torres, nunca admitiu derrota publicamente, ao passo que membros do MP seguem colocando asteriscos na transição. Mesmo assim, Arévalo já fala como chefe de Estado, anunciando seu novo gabinete, prometendo revogar benefícios a parlamentares saintes (o Congresso também será renovado neste final de semana, marcando a formação de bancadas que farão dura frente ao próximo governo) e até projetando lidar com pendências na área de segurança deixadas pelo atual presidente, Alejandro Giammattei. O futuro do comando do MP, hoje sob a batuta da (internacionalmente sancionada) procuradora-geral Consuelo Porras, também é incerto: algoz de Arévalo, Porras terá sua renúncia solicitada pelo novo mandatário, que não esconde seu desejo de um pedido de demissão imediata tão logo ele vista a faixa no domingo – ela, no entanto, conta com mandato constitucional para seguir no posto independentemente da vontade do presidente, e não está obrigada a entregar o cargo. Na realidade, às vésperas da posse, o escritório de Porras emitiu nova ordem de prisão vista como provocativa pelos apoiadores de Arévalo: na quinta-feira (11), mandou encarcerar o ex-ministro do Interior do atual governo, Napoleón Barrientos, acusado de descumprir suas funções quando se negou a reprimir… manifestantes que se opunham à ação do Ministério Público contra Arévalo. Caso nada mais aconteça, a esquerda assume o governo da Guatemala em 2024, mas com muitos desafios pela frente: segundo analistas, o direitista Giammattei deixa um saldo negativo no combate à fome, violência e corrupção (sendo ele próprio bastante questionado por se aliar a Consuelo Porras em casos de perseguição política); Arévalo também herdará um país onde mais da metade da população vive na pobreza e onde quase metade do PIB é atrelado à informalidade, segundo o Banco Mundial. A cerimônia também acontecerá sob intensa vigilância nacional e internacional, com a presença de líderes mundiais, olhares de entidades multilaterais e até movimentos indígenas, que prometem protestos massivos caso algo atrapalhe a transição de poder.
🇭🇹 Juiz haitiano emite ordem de prisão contra dezenas de autoridades, incluindo ex-presidentes e ex-premiês – O que ainda existe de ambiente político no Haiti foi sacudido nos últimos dias, após um juiz em Porto Príncipe emitir na sexta-feira (5) ordens de prisão contra mais de 30 altos funcionários acusados de corrupção. A lista é grande e conta com uma série de figuras consideradas – se não agora, no passado recente – politicamente relevantes: entre os nomes na mira estão o ex-presidente Michel Martelly (2011-2016), último a governar o país antes do início conturbado do mandato de Jovenel Moïse, morto quando ainda ocupava o cargo, em 2021; quatro antigos ocupantes da cadeira de premiê também são citados. Segundo a acusação, os altos funcionários teriam participado de um esquema de apropriação indébita de fundos públicos ou maquinário pesado da área de construção. Os equipamentos são usados em casos de terremoto, um problema recorrente no país. Até o fechamento desta edição, apenas um ex-premiê mencionado na medida havia comentado o caso, negando ter cometido irregularidades. O acontecimento também pode mexer com as peças do xadrez haitiano: quem se reuniu com o juiz no início da semana foi Claude Joseph – outro ex-premiê, que não foi citado no processo da vez, ele se tornou uma das figuras mais proeminentes na oposição à atual gestão de Ariel Henry, hoje a pessoa a ocupar o cargo mais alto no governo disfuncional; Joseph cobra que Henry deixe o poder em 7 de fevereiro, dia em que deveria entregar o posto, seguindo um compromisso firmado pelo primeiro-ministro em 2022. Não há, porém, qualquer perspectiva de que novas eleições sejam convocadas em breve, aumentando rumores de que Henry teria um plano para se manter no poder. Via AP.
🇲🇽 México: ex-diretora de agência estatal denuncia desvio em campanha presidencial do Morena; AMLO cobra provas – Estava tudo muito calmo para a campanha presidencial do governista Morena, há meses apontado – por praticamente todos os institutos de pesquisa – como o principal favorito nas eleições marcadas para o início de junho (saiba quais outros países elegem presidente em 2024). Nos primeiros dias do ano, porém, uma bomba: sem apresentar evidências, a ex-diretora da (agora extinta) agência estatal de notícias Notimex, Sanjuana Martínez, causou um alvoroço ao denunciar que essa mesma entidade dissolvida teria desviado recursos para a campanha da presidenciável governista Claudia Sheinbaum. Em primeiro lugar, as acusações causaram estranheza por partirem de uma pessoa considerada próxima do presidente Andrés Manuel López Obrador – o próprio mandatário teria não só indicado a jornalista à chefia da Notimex, como também defendido Martínez de várias críticas que causariam o fechamento da agência (entenda). Sem muito alarde, na quarta-feira (10), AMLO cobrou provas de quem chamou de “companheira”, mas cutucou: “(...) não estou limitando a sua liberdade de expressão, mas temos que aderir aos 3 princípios: não mentir, não roubar e não trair”. Perguntada sobre o mesmo tema, Sheinbaum disse que as alegações são “absolutamente falsas”. Resta ver, agora, se a trama vai atrapalhar o favoritismo do Morena – o que não parece ser o caso, ainda mais sem provas apresentadas até aqui. Em El Financiero.
🇻🇪 Caso Julieta Hernández: assassinato de artista cicloviajante venezuelana comove o Brasil – Brasileiros e venezuelanos acompanharam estarrecidos a confirmação da morte de Julieta Hernández, também conhecida como “Palhaça Jujuba”, artista circense venezuelana morta brutalmente por um casal na cidade amazonense de Presidente Figueiredo, a duas horas de Manaus. Conhecida cicloviajante, Hernández morava no Brasil desde 2015 e viajava de bicicleta até seu país natal. Segundo autoridades locais, o crime ocorreu pouco após a artista parar para descansar em um refúgio para viajantes, onde foi atacada por dois agressores. O corpo da venezuelana só seria encontrado no sábado (6), enterrado em uma cova rasa próxima ao abrigo, localizado numa região de mata da cidade. O casal foi detido, confessou o crime e deve responder por homicídio qualificado e ocultação de cadáver. Além de artistas e ativistas, o governo brasileiro também lamentou o ocorrido por meio da Fundação Nacional de Artes (Funarte). Maria Marighella, chefe do órgão, reagiu à notícia com “tristeza e indignação” e disse que, “com toda alegria e irreverência, Julieta viajava com sua arte conduzindo crianças e adultos ao mundo circense e, por isso, sempre será lembrada”. O governo venezuelano também repudiou o crime.
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REGIÃO 🌎
Durante a semana, alguns países latino-americanos passaram a apoiar uma demanda sul-africana que solicitou à Corte Internacional de Justiça (CIJ) a responsabilização de Israel pelo genocídio de civis palestinos, além do cessar-fogo. A ação começou a ser analisada na quinta-feira (11) e, até o fechamento desta edição, já contava com o apoio dos governos de Colômbia, Brasil, Venezuela, Bolívia, Nicarágua e Cuba. Não por acaso, todos esses países são governados por lideranças de esquerda ou centro-esquerda, gestões que costumam se posicionar de forma mais enfática diante da violência cometida em Gaza, como este mesmo GIRO contou algumas edições atrás. Quem também se posicionou, mas no sentido contrário, foi a diplomacia guatemalteca (o país, vale lembrar, é um dos 10 de todo o planeta que em dezembro votaram contra a trégua humanitária, ao lado dos EUA, Paraguai e do próprio governo israelense). De saída no domingo (14), o governo de Alejandro Giammattei chamou o banho de sangue promovido por Israel contra palestinos de “direito de legítima defesa”. Na CNN.
BOLÍVIA 🇧🇴
Uma treta que ninguém mais aguenta, mas que deve seguir pautando os meandros políticos bolivianos – pelo menos até as eleições em 2025. Na quarta-feira (10), o ex-presidente Evo Morales (2006-2019) – que recentemente sofreu um revés na Justiça e não poderá mais se candidatar no ano que vem em função do limite à reeleição indefinida – disse que “alguns membros do governo” de seu ex-aliado Luis Arce estão dispostos a criar uma versão “paralela e ilegal” do Movimento ao Socialismo (MAS), atual partido governista fraturado no qual os dois políticos convivem cada vez mais em colisão. As novas cutucadas de Evo vêm na esteira de uma ruptura quase institucional entre a ala “evista” e a que ainda apoia Arce – como o GIRO explicou no último mês outubro, o atual presidente chegou a ser “expulso” do MAS por alguns correligionários após não aparecer em um congresso liderado por Evo; Arce reagiu cobrando invalidação do evento na Justiça e realizando seu próprio encontro partidário. O entrevero deve seguir sem data para terminar, tudo enquanto o horizonte eleitoral para o próximo ano segue nebuloso. No Nodal.
CHILE 🇨🇱
Conhecido ponto turístico, a cidade de San Pedro de Atacama, principal ponto de referência para quem viaja para conhecer o deserto, leva um nome carinhoso pela grande quantidade de cachorros de rua espalhados pela cidade: San Perro de Atacama. Mas há um outro lado – bastante triste – dessa história. Na última quinta-feira (4), uma brasileira que mora na cidade foi vítima de um violento ataque de uma matilha, no centro do município. Clara de Oliveira sobreviveu, mas precisou ser encaminhada a um hospital em Calama, a 100 quilômetros de San Pedro; ela foi submetida a cirurgias e transfusão de sangue. O ataque, porém, não é tão incomum: no ano passado, uma guia turística morreu após sofrer um ataque dos cães, que em muitos casos vivem de forma praticamente selvagem. Ainda que muitos dos animais espalhados pelo centro turístico da cidade sejam dóceis, esses casos têm levado a população e a administração local a um pedido polêmico: eles pedem que pelo menos 4,5 mil cachorros sejam submetidos a eutanásia. Segundo autoridades, a situação está “insustentável”, apresentando perigo a moradores e turistas. O tema deve seguir em debate. Na CNN.
Dale un vistazo:
🏛️ Museo Andes 1972 – Viu A Sociedade da Neve (2023) na Netflix e quer ter um contato ainda mais próximo com essa história? Se for a Montevidéu, não perca a oportunidade de conhecer o pequeno museu que conserva relatos, objetos e informações sobre a tragédia e a luta por sobrevivência daqueles que estavam dentro do voo 571 da Força Aérea Uruguaia, caído nos Andes em 13 de outubro de 1972, e permaneceram por mais de 70 dias lutando contra os ferimentos, a desnutrição, o frio e até mesmo uma avalanche enquanto aguardavam um improvável resgate – quando já eram dados como mortos. O Museo Andes 1972, inaugurado em 2013, está localizado na Ciudad Vieja montevideana, na rua Rincón 619, a duas quadras da muito visitada Praça Independência, onde fica o fotogênico mausoléu de Artigas.
COLÔMBIA 🇨🇴
Dado trágico que sempre tem na Colômbia uma das líderes regionais, o assassinato de ativistas ficou em 181 mortes no ano passado, informou a Procuradoria do Povo – que zela por temas de direitos humanos no país – na terça-feira (9). Definido como uma “situação inaceitável” e uma “tragédia” pelo responsável pela pasta, Carlos Camargo, o número ainda assim representou uma diminuição em crimes do tipo na comparação com 2022, ano que teve um recorde histórico de 215 assassinatos. A violência contra ativistas sociais e comunitários foi mais acentuada nos departamentos de Cauca, Antioquia e Nariño, regiões pródigas na presença de grupos guerrilheiros, garimpeiros ilegais e plantações irregulares de coca. Via Reuters.
COSTA RICA 🇨🇷
O tratamento inadequado supostamente recebido por uma mãe que deu à luz de forma prematura virou caso de polícia e mobilizou até o presidente Rodrigo Chaves: na segunda-feira (8), Angie Herrera iniciou trabalho de parto após somente 26 semanas de gestação e, embora tenha visto sua bebê nascer com vida, afirma que os médicos negligenciaram as chances de sobrevivência da criança – segundo o relato de Herrera, eles teriam inclusive alertado que ela deveria aproveitar “as últimas horas” com a filha, minimizando os esforços para garantir que a bebê seguisse viva. Só que a criança, agora chamada Isabella Milagro, resistiu – e acabou sendo transferida para outro hospital para receber tratamento intensivo, em situação delicada não só pelo parto prematuro, mas alegadamente agravada pela falta de apoio dos profissionais de saúde no imediato pós-parto. Após a mãe relatar o que vivenciou nas redes sociais, tanto a Caixa Costa-Riquenha de Seguro Social (CCSS), que administra a saúde pública no país, quanto o Instituto Nacional da Mulher, apresentaram denúncias ao Ministério Público, abrindo uma investigação criminal sobre os procedimentos adotados no primeiro hospital. A CCSS também sugeriu transformar o 8 de janeiro, data de nascimento de Isabella, em um dia de conscientização sobre a violência obstétrica no país. Comentando o caso, o presidente Chaves tampouco ficou indiferente, pedindo que a população faça orações “pela senhora Angie e pela menina Isabella, para que essa menina se recupere”. A criança seguia recebendo tratamento intensivo até o fechamento desta edição. No Semanario Universidad.
CUBA 🇨🇺
Os preços dos combustíveis na ilha devem subir 500% a partir de fevereiro, informou no último mês o governo de Miguel Díaz-Canel. Medida impopular, mas que integra um pacote de medidas econômicas que tentará aliviar a atual crise em 2024, o aumento dos preços tem justificativa: Havana alega que “nenhum outro lugar” da região mantém valores tão baixos e conta com o bom senso da população: “todos aqui quase concordam que isso precisa acontecer”, disse o mandatário, durante um evento no final do último ano, talvez subestimando uma possível reação negativa ao encarecimento. Com matriz energética bastante dependente de combustível, Cuba vem enfrentando um dos capítulos mais duros da atual calamidade em sua economia, numa mistura de sanções, efeitos colaterais de reformas recentes e escassez. Entre outras mudanças, numa tentativa de atrair dólares, o governo também vai exigir que turistas estrangeiros usem a moeda internacional para abastecer as reservas locais. Em El País.
EL SALVADOR 🇸🇻
Pela 22ª vez, o Congresso dominado por apoiadores de Nayib Bukele aprovou na terça-feira (9) o regime de exceção do presidente. Sem qualquer surpresa e nem perspectiva de mudar – já que o dominante mandatário deve ser reeleger sem sustos nas eleições do próximo dia 4/2 – a decisão mantém suspensas, por outros 60 dias (no mínimo), as garantias constitucionais, uma medida tão necessária para que o governo siga em sua jornada implacável contra as gangues locais. A empreitada, apinhada de abusos aos direitos humanos e ao devido processo legal, começou em 2022, em resposta a um pico de homicídios na capital. Acusadas de usar o regime excepcional como “propaganda” em período eleitoral, figuras alinhadas a Bukele dizem que essa é uma percepção “que só os criminosos têm”. Na teleSUR.
Una expresión:
No es soplar y hacer botellas – Forma coloquial com a qual hispanohablantes se referem a algo que “não é tão simples quanto parece”, a expressão teria surgido no século 19, quando artesãos da região de Murano, na Itália, um conhecido polo de produtores de cristais, cobravam melhores condições de trabalho. Dessa forma, diziam que exerciam um trabalho que não era nada simples, que exigia técnica, e por isso não era qualquer um que sabia “soprar vidro para fazer garrafas”. A expressão, que também é citada em registros oficiais por ter sido dita por próceres da independência argentina, causou alvoroço na internet durante a semana por ter sido usada pelo presidente salvadorenho Nayib Bukele, pouco após o caos se instalar no Equador (saiba mais no abre desta edição). Sem citar nomes, Bukele se referiu ao decreto de exceção assinado por seu homólogo equatoriano, medida que, segundo o salvadorenho – que esmaga as gangues em seu país – não resolve nada se vier sozinha. O mesmo presidente disse em outra oportunidade que o decreto “não é uma varinha mágica” e que “sozinho, sem estratégias contra o terrorismo, não serve de nada”. Vários fãs de Bukele lembraram do jargão, pedindo que Noboa imite seu equivalente e também reaja à alta criminalidade com bala.
HONDURAS 🇭🇳
Afeto. Parece contraditório, mas é esse o caminho pelo qual as gangues hondurenhas investem para atrair jovens para suas fileiras: recrutando em meio à pobreza e a famílias desestruturadas, as maras oferecem uma sensação de pertencimento, proteção e “ilusão de amor” a crianças e adolescentes vulneráveis, que logo se tornam soldados das organizações criminosas. Quem relata esse processo ao jornal El País é Edras Suazo, hoje com 27 anos, que, após flertar com grupos armados quando era mais novo, agora tenta evitar que outros sigam o caminho (muitas vezes sem volta) que também o seduziu no passado. “O primeiro abraço que recebi foi de um pandillero”, ele conta, hoje à frente de uma ONG que tenta oferecer alternativas longe do crime.
NICARÁGUA 🇳🇮
Aprofundando a nova parceria com a China – e intensificando sua própria cruzada contra organizações estrangeiras –, o governo de Daniel Ortega cancelou na quarta-feira (10) a personalidade jurídica de quatro organizações que promoviam vínculos com Taiwan. Sob o argumento de que as entidades “não cumpriram suas obrigações” ao não reportar suas finanças, a Nicarágua informou que os bens dessas organizações passariam ao controle do Estado. Manágua deixou de reconhecer Taiwan em 2021, quando restabeleceu laços formais com Pequim, e a proximidade com a China se intensificou neste início de 2024, com a entrada em vigor de um novo tratado de livre-comércio com os gigantes asiáticos. Via AFP.
PANAMÁ 🇵🇦
Sem trégua, a nova seca que vem fazendo o Canal do Panamá reduzir os limites para a circulação de navios na área já está obrigando empresas gigantes do setor de logística a rever seus planos: a dinamarquesa Maersk, que controla quase 20% do mercado de cargas no mundo, anunciou durante a semana que vai redirecionar uma parte de seus contêineres para a ferrovia que corre paralelamente ao canal. Com isso, a empresa fará por terra os 76 km que conectam o Pacífico ao Atlântico, um movimento já adotado – ou discutido – por outras companhias que também tentam fugir das restrições causadas pela estiagem no país centro-americano, agravada pelo fenômeno El Niño. Especialistas do setor apontam que é a maior crise no transporte de cargas desde o auge da pandemia. Via Reuters.
PARAGUAI 🇵🇾
Dinheiro não falta, mas os pagamentos estão atrasados: dos dois lados da fronteira, empregados, prestadores de serviços e fornecedores da hidrelétrica de Itaipu – cuja gestão é compartilhada por Brasil e Paraguai – começaram janeiro sem receber em dia, por um impasse sobre o preço da tarifa da energia, que congelou o orçamento para 2024. O problema não é novo, pois há anos os paraguaios brigam para que os sócios brasileiros paguem um valor maior pelo excedente de energia que compram dos vizinhos (Itaipu produz muito mais do que o Paraguai precisa e, pelo acordo entre os países, o Brasil deve adquirir o excesso por um preço pré-fixado), mas, segundo pessoas com conhecimento do tema, é a primeira vez que uma discussão do tipo provoca atrasos de pagamentos. A informação foi revelada com exclusividade pela Folha na quarta (10) e, ao jornal, a hidrelétrica binacional garantiu que o tema dos pagamentos será resolvido ainda em janeiro.
Un nombre:
Gauchito Gil – Uma espécie de “santo clandestino” adorado entre os argentinos – mas não reconhecido oficialmente pela Igreja Católica – é a designação mais comum de António Mamerto Gil Núñez, que teria nascido como um homem comum, mas passado por experiências espirituais durante a vida. Segundo a lenda, Ñandeyara, um deus da cultura guarani típica da região dos Pampas, teria ido até Gil em seus sonhos, levando-o a abandonar o Exército durante a sangrenta Guerra do Paraguai (1864-1870). Dali em diante, em capítulos que nem a mais profunda hagiografia desvenda, ele teria se tornado uma espécie de errante rural, roubando dos ricos para dar aos pobres, sendo aos poucos temido e mitificado num caldeirão de sincretismos. O historiador Matias Pinto, do sempre ótimo Xadrez Verbal, descreve o ícone como um “personagem histórico dos Pampas” que, após ser assassinado em 1878 por autoridades da província de Corrientes, foi “convertido em um santo popular”. O país celebra o santo todo dia 8 de janeiro – na última segunda, afogados por uma inflação sem fim, argentinos usaram a data para pedir, entre outras coisas, uma melhora nos números da economia.
PERU 🇵🇪
Não é só o reforço das fronteiras que está em pauta no Peru em função da crise no vizinho Equador (leia mais na abertura desta edição): Lima também se preocupa com o indicativo do governo equatoriano de que pretende mandar de volta ao país natal os cidadãos peruanos que estão presos em suas penitenciárias. Governadores regionais dizem que a volta massiva de peruanos condenados poderia colocar o país em uma situação de “desvantagem” no combate à delinquência, enquanto a administração da presidenta Dina Boluarte já prometeu reciprocidade: lembrou, na quinta (11), que as cadeias do Peru mantêm 162 criminosos equatorianos, e que eles seriam mandados de volta para “casa” se Daniel Noboa fizer algo no sentido inverso – ou seja, o Equador poderia acabar com até mais apenados do que tem hoje, pois se estima que o número de peruanos presos no outro lado da fronteira seria menor. No Infobae.
PORTO RICO 🇵🇷
Mais da metade dos partos realizados em Porto Rico são feitos por cesariana – e o número vem crescendo, colocando a ilha à frente dos Estados Unidos continentais, onde essa média é de 32%. O declínio do nascimento por vias tradicionais no território tem múltiplas razões, mas a principal delas, segundo especialistas, é a falta de profissionais de saúde: em anos recentes, houve uma debandada geral de médicos e enfermeiros obstetras para os EUA, aumentando a pressão para que os partos ocorram em data “planejada”, garantindo que toda a equipe esteja à disposição da gestante. O êxodo, por sinal, não é só de profissionais, mas das próprias parturientes em potencial: com muitos porto-riquenhos optando por deixar a ilha em busca de oportunidades no continente, o ano passado teve apenas 17,7 mil nascimentos registrados na ilha – o menor número desde que os registros começaram, no final dos anos 1880. Via AP.
REPÚBLICA DOMINICANA 🇩🇴
Após meses de silêncio e com as fronteiras formalmente fechadas desde setembro, a chancelaria dominicana retomou conversas com seus pares do vizinho Haiti durante a semana, tentando negociar uma saída para o impasse que envolve o uso das águas do Rio Massacre, também conhecido como Dajabón no lado hispanohablante da ilha. Os dois lados se encontraram na sede da Organização dos Estados Americanos (OEA), em Washington, nos EUA, e saíram dispostos a “continuar a conversa em uma próxima oportunidade”, informou um comunicado divulgado por Santo Domingo na quinta-feira (11). Apesar da boa vontade, não foi estabelecido qualquer prazo para uma solução ou uma reabertura plena da divisa territorial. Via AFP.
URUGUAI 🇺🇾
Boa notícia para quem tenta atrair investimentos ao paisito: uma nova avaliação do JP Morgan Chase colocou o Uruguai como a nação com o menor “risco país” da América Latina neste início de 2024, considerando a capacidade de “cumprir suas obrigações” com os credores – um indicador útil, também, para o governo local acessar linhas de crédito internacionais. Entre os sul-americanos, a sequência do top-5 da confiabilidade aos olhos do banco gringo tem Chile, Peru, Brasil e Paraguai. Já a Venezuela – sem surpresas – ocupa o último lugar com folga. No Ámbito.
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