Cuba: Era Castro chega ao fim
As eleições de Equador, Peru e Bolívia | Congresso peruano torna ex-presidente inelegível | Covid: futebol sul-americano vai furar fila da vacina | Vídeo: Haiti segue sem imunizantes
Raúl Castro, irmão de Fidel, anunciou oficialmente que não será mais o primeiro secretário do Partido Comunista de Cuba (PCC), na abertura do 8º Congresso da sigla nesta sexta-feira (16). A decisão coloca um fim formal às décadas de protagonismo dele e do irmão (que deixou o cargo em 2011) sobre a política da ilha desde a Revolução de 1959. A mudança do líder, que completa 90 anos em junho, já era esperada – e, embora carregada de simbolismo, talvez não represente uma alteração significativa nos rumos tomados pelo país nos últimos anos. Na prática, o cargo máximo do Executivo em Cuba já não era ocupado por Raúl Castro desde abril de 2018, quando a presidência do Conselho de Ministros foi passada a Miguel Díaz-Canel, hoje com 60 anos. Em 2019, com a nova Constituição, Díaz-Canel tornou-se oficialmente Presidente da República, com a recriação deste título, extinto por Fidel na década 70. Agora, espera-se que ele também herde o comando partidário.
Mais importantes do que a saída do último Castro da linha de frente do PCC, prometida desde o Congresso de 2016, serão os outros temas em debate na convenção. A reunião se estende ao longo do fim de semana e se encerra na segunda-feira (19), data que também marca os 60 anos da vitória das forças castristas sobre os grupos contrarrevolucionários na invasão da Baía dos Porcos. Em pauta, estão a resposta da ilha à pandemia que se agravou em 2021, as reformas econômicas que vêm sendo implementadas diante de uma crise piorada pelas sanções de Trump e pela covid-19 (saiba mais neste vídeo), e o posicionamento do partido único diante de uma oposição que vem crescendo internamente e volta a ganhar espaço no noticiário internacional.
No front pandêmico, Cuba ainda colhe os frutos de uma resposta que foi elogiada ao longo do ano passado e foi capaz de manter os números baixos, mas enfrenta uma notável piora na situação desde janeiro: se em 2020 foram apenas 12 mil casos e 146 mortes por covid-19 registrados oficialmente no país, nesses primeiros 106 dias do novo ano a ilha já teve quase 80 mil contágios e 354 mortes confirmadas. Cuba ainda não iniciou uma campanha nacional de vacinação, embora esteja em busca de autonomia na produção de imunizantes: duas de suas vacinas próprias, a Soberana 2 e a Abdala, já estão na última fase de ensaios clínicos, e nesse processo já chegaram a mais de 125 mil pessoas. O governo aposta nas vacinas made in Cuba não só para garantir a segurança sanitária do próprio país, mas como ferramenta diplomática e para contornar a crise: a ilha de 11 milhões de habitantes quer produzir 100 milhões de doses até o fim do ano, prevendo a exportação.
Quanto à economia, analistas ouvidos pela agência Reuters apostam que a nova liderança poderia estar mais sujeita às pressões por abertura, acelerando um processo que avançou a passos lentos na última década. Segundo o próprio PCC, cerca de 30% das reformas anunciadas por Raúl Castro no Congresso de 2011 ainda nem foram implementadas. De fato, o governo só abandonou para valer a postura receosa em relação às promessas feitas há uma década nos últimos dois anos, quando as dificuldades se agravaram: além de Donald Trump recuperar uma série de sanções que haviam sido flexibilizadas durante o governo de Barack Obama (saiba mais neste vídeo), a pandemia obrigou Díaz-Canel a introduzir mudanças mais profundas, reduzindo a participação direta do Estado em diversos setores da economia, além de extinguir o “peso conversível”, adotando oficialmente uma moeda única sem paridade com o dólar (veja mais no GIRO #63). Em 2020, massacrado pelo acúmulo de crises, o PIB cubano se retraiu 11%.
O encontro das lideranças comunistas ocorre justamente em um momento de crescimento de uma oposição intelectualizada, que cada vez mais se mobiliza através da internet para arrebanhar solidariedade internacional. Segundo o Banco Mundial, aliás, a proporção de cubanos na rede saltou de 14% para 62% entre 2009 e 2019, o que só foi possível após a chegada de Raúl ao comando do país. Desde o fim de 2020, o chamado Movimento San Isidro é um dos que mais ocupa as manchetes fora de Cuba, tendo organizado manifestações em frente às sedes do poder público. O governo acusa o grupo de ser financiado pelos EUA e já prendeu algumas de suas lideranças.
É nesse contexto de mudanças que a ilha vem conhecendo uma nova versão de si mesma. Sem Fidel ou Raúl no comando, novas dúvidas pairam nas ruas de Havana: quanto dos Castro permanecerá? E até quando? Isso, porém, é algo que o continente ainda há de descobrir.
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Un sonido
No retorno de nosso podcast, explicamos em 25 minutos o que aconteceu nas eleições presidenciais de Equador e Peru, e nas regionais da Bolívia, todas ocorridas no último domingo (11). Os equatorianos já escolheram seu novo presidente, o conservador Guillermo Lasso, enquanto o Peru saiu de um primeiro turno com 18 candidatos para uma segunda volta – que só ocorrerá em junho – extremamente polarizada. Na Bolívia, o partido governista sofreu derrotas e viu a ascensão de novas esquerdas.
DESTAQUES
🌎 REG – A Conmebol, órgão máximo do futebol sul-americano, anunciou na terça (13) que receberá 50 mil doses da Coronavac para vacinar jogadores, árbitros e outros profissionais da área. A decisão, uma polêmica “parceria” com a fabricante Sinovac que contou com a mediação do presidente uruguaio Luis Lacalle Pou, miraria a Copa América, que vai reunir jogadores de seleções nacionais, incluindo os que atuam fora do continente, entre junho e julho. A controvérsia é enorme: além de ser vista como uma forma institucionalizada de furar a fila da vacinação (escândalos similares têm derrubado ministros em toda a América Latina), já que o futebol sequer é um serviço essencial, a doação pode gerar protestos entre os paraguaios, que dividem território com a sede fixa da Conmebol: 50 mil doses representam mais de 70% do total de vacinas aplicadas até aqui no Paraguai, um dos países mais atrasados na imunização em toda a região. Em La Nación.
🇭🇹 HAI – A crise haitiana ganhou novo capítulo na quarta-feira (14), com a renúncia do primeiro-ministro Joseph Jouthe – no cargo desde março do ano passado, ele já era o oitavo a ocupar a posição desde 2015. Desta vez, a saída foi precipitada pelo sequestro coletivo de um grupo de religiosos e seus familiares, que incluía estrangeiros – apenas um episódio a mais em uma epidemia de sequestros e violência que vem se agravando com a crise política nacional (veja mais em Un video). Jouthe, que também estava comandava a polícia e fracassou em conter o aumento da criminalidade, foi substituído pelo ex-ministro de Assuntos Exteriores e Cultos, Claude Joseph. Em El País.
🇵🇪 PER – De ex-presidente a inelegível por 10 anos. É esse o tamanho da reviravolta na vida política de Martín Vizcarra (2018-2020), destituído do cargo máximo do país em novembro e agora oficialmente desqualificado em sua tentativa de ingressar no Congresso. Ainda popular entre os eleitores – ele foi o deputado mais votado nas eleições de 11/4 com 165 mil votos –, o ex-presidente não tem o mesmo respaldo da classe política: a medida que tira de Vizcarra o direito de assumir o cargo legislativo teve unanimidade entre os presentes na Casa: 86 votos a favor e zero contra, ainda refletindo o rechaço que ele enfrentou quando caiu no último ano. Embora negue as acusações de corrupção que motivaram seu afastamento, Vizcarra sofreu desgaste após ter seu nome incluído na lista de autoridades que furaram a fila da vacinação. Ele inclusive admitiu ter tomado a vacina antecipadamente, mas nega que tenha sido algo irregular, alegando que fazia parte dos ensaios clínicos da Sinopharm. De todo modo, o caso “Vacunagate” foi central para a decisão que o tornou inelegível e também puniu a ex-ministra da Saúde, Pilar Mazzetti, agora impedida de ocupar cargos públicos pelos próximos oito anos, e a ex-chanceler Elizabeth Astete, inabilitada por um ano. Em El Comercio.
🇺🇾 URU – Não é mais novidade que um dos últimos bons exemplos na pandemia latina caiu por terra, mas as notícias ruins no paisito não param: pela primeira vez, o Uruguai completou uma semana inteira à frente do Brasil no número de mortes proporcionais, com uma taxa de 122 óbitos a cada milhão de habitantes contra 95 entre os brasileiros, agora em segundo lugar. Desde o fim de março, o Uruguai já vinha superando o Brasil nas mortes proporcionais durante o fim de semana, quando por aqui há atraso nos dados, mas agora já faz isso também ao fim dos sete dias. Países com altos números na pandemia, como México e Peru, também já foram superados na triste estatística. Muito por conta do relaxamento de restrições (em um país que nunca chegou a decretar lockdown) e pelo avanço da variante brasileira, o país austral viu a pandemia vir a galope em 2021. Só na última semana, o Uruguai chorou mais que o dobro de mortes do que em todo o ano passado (425 contra 193). Em La Diaria.
Un video:
MAIS NOTÍCIAS
REGIÃO 🌎
A América Latina voltou a registrar recorde semanal de casos e óbitos desde o início da pandemia. Desta vez, a região beirou o milhão de novos contágios confirmados, chegando a 33,8 mil mortes oficialmente atribuídas à covid-19 em sete dias. A situação vem se agravando rapidamente em vários países, e sete dos 21 locais que acompanhamos duplicaram suas mortes na última quinzena. Leia nosso levantamento semanal completo clicando aqui.
O projeto de tornar o Brasil pária internacional, conforme prometido pelo ex-chanceler Ernesto Araújo, segue de vento em popa nos primeiros meses do governo Joe Biden: a primeira viagem oficial do representante democrata na América do Sul, Juan González, teve Argentina, Colômbia e Uruguai no itinerário; o Brasil, por sua vez, foi ignorado. O tour do governo Biden na região falou de segurança, violência, migração e da recuperação econômica dos países sul-americanos, parceiros estratégicos dos EUA. González também reforçou as pressões de Washington contra a Venezuela, ao se encontrar com o opositor e autoproclamado presidente Juan Guaidó. No Valor.
ARGENTINA 🇦🇷
O presidente Alberto Fernández decidiu aumentar os horários de toque de recolher em toda a região metropolitana de Buenos Aires, afetando 16 milhões de pessoas que já estão sob rígida quarentena e com vários serviços essenciais suspensos. Chamando as restrições prévias de “insuficientes”, Fernández citou o aumento drástico de novos casos semanais: se estavam, em média, próximos a 45 mil em março, agora já superam os 160 mil. “Por isso, decidi que entre 20 horas e 6 horas ninguém poderá circular pelas ruas”. A decisão gerou protestos em frente à residência oficial, Olivos, além de panelaços por toda a cidade, e mentiras do presidente brasileiro sobre como funcionariam as restrições no vizinho. Com o PIB caindo quase 10% em 2020 e 42% da população em situação de pobreza, o país entra no terceiro ano consecutivo de recessão, equação que o presidente tenta solucionar sem dar trégua ao coronavírus. No Infobae.
A Justiça inocentou por unanimidade a vice-presidenta Cristina Kirchner no caso “dólar futuro”, relacionado a supostas fraudes bilionárias em contratos de compra de divisas, um dos mais de dez processos contra a também ex-presidenta (2007-2015). A denúncia foi feita por opositores ligados ao ex-presidente Mauricio Macri (2015-2019) e acusa a peronista e outros funcionários de se beneficiarem de um instrumento financeiro; a defesa nega, alegando “manipulação” e acusação por motivação política. No Página 12.
O governo anunciou um novo pacote de medidas econômicas para aliviar os setores de hotelaria, turismo, gastronomia e saúde: o Programa de Recuperação Produtiva II (Repro II) prevê um aumento de 12 mil para 18 mil pesos (R$ 730 para R$ 1.095) no valor que o governo passará a cobrir do salário de funcionários de empresas afetadas. Para ter acesso ao benefício, os empresários terão que comprovar queda superior a 20% na receita real em relação ao mesmo mês de 2019. No EM.
BOLÍVIA 🇧🇴
As eleições regionais da Bolívia, no último domingo (11), colocaram o Movimento ao Socialismo (MAS), partido governista, diante de derrotas em múltiplas frentes e um novo cenário: concorrendo pelo governo em quatro departamentos, o MAS perdeu em todos eles – com isso, o partido, que em 2015 havia conquistado seis das nove regiões do país, reduziu seus governos a apenas três (todos vencidos no primeiro turno). A sucessão de derrotas do partido de Evo Morales e Luis Arce, porém, não necessariamente representa uma derrocada da esquerda, mas o aparecimento de novas dissidências fortes: três departamentos (incluindo dois vencidos no segundo turno) foram para grupos ligados a ex-membros do MAS: o Jallalla (que levou La Paz) e o Movimento Terceiro Sistema (que agora governará Pando e Beni). Saiba mais ouvindo o episódio da semana do Giro Latino Cast em Un sonido.
O governo Luis Arce, empossado em novembro, viveu durante a semana o primeiro escândalo envolvendo um membro do seu alto escalão: Edwin Characayo, até então ministro de Desenvolvimento Rural e Terras, foi preso após ser filmado pela polícia aceitando um suborno de US$ 20 mil em uma rua de La Paz. O dinheiro seria parte de um pagamento de US$ 380 mil para a concessão de um título de propriedade na região pecuarista do Beni. É a primeira vez que um ministro ainda no cargo acaba preso no país por receber pessoalmente valores irregulares. Eduardo Del Castillo, ministro de Governo e braço-direito de Arce, disse que o atual mandatário combaterá a corrupção “com tolerância zero, caia quem caia”. A semana foi agitada nos gabinetes ministeriais do governo para além do escândalo envolvendo Characayo, com vários membros da pasta de Planejamento entregando seus cargos e acusando a titular, Felima Gabriela Mendoza, de assédio moral. Em El País.
Dale un vistazo:
🎥 Últimos Dias em Havana – lançado em 2016, o drama de Fernando Pérez conta a realidade dura (e antagônica) de dois homens em um pequeno apartamento na capital, cercados por uma cidade desgastada pelo tempo e pelas incertezas. Enquanto Miguel dribla o próprio rancor que nutre pelo país para conseguir um visto e se mudar para os EUA, Diego, um homossexual portador de HIV, desencoraja o amigo a deixar Havana, ao passo que padece em meio ao desabastecimento e à própria confusão de sentimentos que mantém pela pátria. Um retrato sensível de uma outra Cuba, de pressões econômicas e desilusões.
Últimos Días en La Habana (Cuba/Espanha, 2016). 93 minutos. Dir.: Fernando Pérez.
CHILE 🇨🇱
Um novo estudo, apresentado na sexta (16) pelo Ministério da Saúde, mostrou que a Coronavac preveniu em até 80% as mortes por covid-19 na faixa de imunizados avaliados 14 dias após a aplicação da segunda dose. A pesquisa considerou dados de 10,5 milhões de pessoas com mais de 16 anos (vacinados com ambas as doses, com apenas uma, e não vacinados), levando em conta taxas de infecção, hospitalização e mortalidade. Segundo a análise, as mortes caíram 80,44% entre os imunizados com as duas doses da Coronavac – que, no Chile, representa 9 em cada 10 aplicações. A notícia vem em boa hora: ainda que tenha a vacinação mais avançada no continente, com quase 30% da população totalmente imunizada, o Chile registrou recordes de contágios entre março e abril. Agora, as autoridades já falam em “estabilização”, um reflexo de vacinas e restrições. Nas últimas três semanas, o número de novos casos permaneceu quase idêntico, embora em um patamar ainda muito alto para o país – em torno de 48 mil novos contágios a cada sete dias. No Poder 360.
COLÔMBIA 🇨🇴
A questão ambiental preocupa nos últimos anos, em especial após o controverso acordo de paz com as guerrilhas: em 2017, ano seguinte ao tratado, o desmatamento atingiu quase 220 mil hectares, quase o dobro de 2015. Com rotas de cocaína sendo construídas de forma ilegal em meio à mata amazônica e grande especulação de áreas verdes, o desastre ambiental particularmente comum na Colômbia se junta ao drama do vizinho Brasil. A semana também foi de derrota para ativistas: o país resolveu aprovar o uso de glifosato para a erradicação de cultivos proibidos de coca, o que causa danos ao solo e à saúde humana. Via Reuters.
A reportagem conta a história da ativista Fanny Escobar, diretora da ONG Mujeres del Plantón e símbolo de resistência no país que mais mata defensores dos direitos humanos na América Latina. Vítima de abusos e assassinatos de familiares, Escobar briga por espaço e reconhecimento em regiões esquecidas pelo Estado e dominadas por grupos armados. Por lá, a luta é diária: segundo o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento e a Paz (Indepaz), mais de 300 líderes sociais foram assassinados só em 2020. Na BBC.
COSTA RICA 🇨🇷
O governo destinou 370 milhões de colones (R$ 3,4 milhões) a atletas e paratletas de diversas modalidades, por meio de bolsas de estudo. Afetados pela falta de contratos e de treinamentos na pandemia, muitos têm buscado formas alternativas de sobreviver, o que compromete o desempenho e afeta a saúde mental. Entre os beneficiados pelo novo plano, estão os classificados para os Jogos Olímpicos e Paralímpicos de Tóquio, previstos para o final de julho. Entre eles, destacam-se a velocista Andrea Vargas, o ciclista Kenneth Tencio e a surfista Brisa Hennessy, além dos paratletas Steven Román, do tênis de mesa, e Camila Haase, da natação. Na Prensa Latina.
EL SALVADOR 🇸🇻
A Justiça condenou a 183 anos de prisão um dos líderes da pandilla Mara Salvatrucha, por crimes de extorsão, conspiração e homicídio. José Roberto Ayala comandava a célula Centro e recebeu a sentença com mais de 27 pandilleros, muitos com penas superiores a 100 anos. Desde a chegada do presidente Nayib Bukele ao poder, o cerco contra as gangues tem se fechado, com direito a casos de violações de direitos humanos e até denúncias de negociações entre governo e o crime organizado para reduzir a violência e aumentar a popularidade do cada vez mais poderoso mandatário (saiba mais no #GIRO 46). No Notimérica.
EQUADOR 🇪🇨
A vitória do conservador Guillermo Lasso nas eleições presidenciais de 11/4 (saiba tudo no último episódio do Giro Latino Cast, em Un sonido) tem naturalmente mexido nas engrenagens da política equatoriana. Além de levar o país ainda mais à direita, o desfecho do último domingo também adia a volta do correísmo, movimento político centrado no ex-presidente Rafael Correa (2007-2017), hoje asilado na Bélgica e alvo de denúncias de corrupção (que ele diz ser “lawfare”). Para Correa, a própria derrota de seu afilhado político Andrés Arauz é um reflexo do uso político da justiça – ele seria o vice de Arauz, mas foi impedido de concorrer e ameaçado de prisão caso pisasse em solo equatoriano. “Se eu estivesse no país, ganharíamos a eleição”, garante à BBC. Lasso assume a presidência em 24/5.
GUATEMALA 🇬🇹
Terremoto político: o Congresso se recusou a juramentar a juíza Gloria Porras, reeleita para mais cinco anos de cargo no Tribunal Constitucional, mais alta corte do país. Porras tem enfrentado acusações de abusos de autoridade na cruzada anticorrupção. Até o momento, são 60 queixas e 13 pedidos de retirada de sua imunidade, a fim de avançar com um processo criminal. Em longa entrevista, a juíza negou as acusações e se disse preocupada com o “uso do Estado de direito e das leis” para “objetivos avessos”. O caso tem aquecido a política local: Thelma Aldana, ex-Procuradora-Geral (figura conhecida por atuar quase como uma versão local de Sergio Moro, chegando a receber um ordem de prisão à revelia e hoje, nos EUA, enfrentando um pedido de extradição) recomendou que Porras deixe o país. Os EUA, que em teoria nada teriam a ver com o assunto, comentaram a decisão por meio de uma representante de Assuntos do Hemisfério Ocidental do Departamento de Estado, Julie Chang. Segundo ela, a decisão “mina o compromisso da Guatemala com um judiciário independente e com o combate à corrupção sistêmica”. Na Prensa Libre.
Un clic:
Ushuaia, no extremo sul argentino, em 1934.
HONDURAS 🇭🇳
O crime de tráfico de drogas segue vivo no dia a dia hondurenho. Ao passo que o próprio presidente Juan Orlando Hernández é acusado pela Justiça dos EUA de ter embolsado propina de barões do narco, enquanto seu irmão recebeu sentença de prisão perpétua por crimes equivalentes, Honduras iniciou o processo de extradição do cidadão Martín Adolfo Díaz Contreras, acusado de transportar cocaína a vários países. Pode parecer um contrassenso, mas é estratégia: ao mostrar esforços contra o tráfico de drogas, Hernández diz que “reafirma o compromisso” de apoiar os EUA nessa empreitada. Segundo o mandatário, é justamente esse “esforço” contra os cartéis que levaram lideranças presas a acusar o governo hondurenho, como “represália”. A procuradoria em Washington não parece convencida e só aumenta as pressões contra JOH, que deixa o cargo em janeiro de 2022. No Tiempo.
MÉXICO 🇲🇽
Um grupo de 30 militares da Marinha foi entregue à Justiça como parte de uma investigação sobre um caso de desaparecimento forçado em Nuevo Laredo, no estado nortista de Tamaulipas, em 2014. A informação foi confirmada pelo presidente López Obrador, que criticou a gestão de seu antecessor Enrique Peña Nieto (2012-2018) e as “várias violações aos direitos humanos” que permanecem impunes. O local é conhecido pela forte presença do narcotráfico e por ser um corredor de migrantes que tentam chegar aos EUA. No Sputnik.
O governo começou a recrutar voluntários para o ensaio clínico da vacina mexicana “Patria”, que será produzida pelo laboratório Avimex. A informação foi confirmada pela diretora-geral do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia (Conacyt), María Elena Álvarez-Buylla, em coletiva feita pelo presidente López Obrador. A etapa deve contar com a participação de até 100 pessoas e vai colher resultados entre os meses de abril e maio, para depois ser avaliada por autoridades da Cofepris, agência reguladora do país. Ao lado da Argentina, o México também faz parte de um acordo de produção de 150 milhões de doses da Astrazeneca para abastecer países latinos, o que tem estimulado a pesquisa nacional. Na sexta-feira (16), o presidente mexicano anunciou que o país começará a vacinar seus professores no próximo dia 20. Até agora, em toda a América Latina, só Cuba chegou à fase 3 (a última) dos testes de uma vacina própria. Em El País.
NICARÁGUA 🇳🇮
A vice-presidenta Rosario Murillo anunciou que o governo iniciou o processo de repatriação do jovem Wilton Eniel Gutiérrez, 10, encontrado abandonado em uma área desértica dos EUA. O menor está em um abrigo no Texas e vem sendo acompanhado por um cônsul nicaraguense em meio a dias difíceis em um caso cheio de reviravoltas: ao contrário do que se imaginava, o menino migrante não viajava sozinho, mas acompanhado pela mãe, Meyling del Socorro Obregón, 30, que chegou a estar desaparecida. O pai da criança ficou na Nicarágua e só teve notícias do filho por meio de vídeos divulgados na imprensa. Lamentando, disse que tem “esperança” de rever Wilton, mas quer que ele “cresça e decida se vai ficar por lá”, um resumo da dura vida dos migrantes. Na Semana.
Morreu em Manágua, aos 78 anos e com suspeita de covid-19, Paul Oquist, estadunidense com cidadania nicaraguense e nome próximo ao sandinismo. A informação foi confirmada pelo governo Daniel Ortega, que mencionou Oquist como alguém que conhecia a Nicarágua “de forma profunda e extraordinária”. Nascido em Illinois e naturalizado nos anos 1980, foi parte do governo revolucionário, inclusive negociando a rendição dos contras, efetivos armados patrocinados pelos EUA para tentar derrubar a revolução de esquerda. Com a volta dos sandinistas ao poder pelas urnas em 2007, Oquist seguiu à frente da diplomacia do país, onde seguiu próximo ao casal mandatário. Apesar das suspeitas, porém, a causa da morte não deve ser esclarecida: a Nicarágua é um dos países notórios por ocultar dados da pandemia e atribuir pouquíssimas mortes à covid-19. Há 27 semanas consecutivas, desde a metade de outubro, o governo nicaraguense vem anunciando invariavelmente apenas um óbito semanal por coronavírus em todo o país. Na Prensa.
PANAMÁ 🇵🇦
O presidente Laurentino Cortizo anunciou a chegada de mais um lote de vacinas da Pfizer, garantindo que o país tem “doses suficientes” contra a doença. Segundo Cortizo, que tem 68 anos e recebeu ele mesmo a segunda dose do imunizante durante a semana, o Panamá começou a trabalhar para receber as doses na metade do último ano, o que permitiu o avanço mais rápido da América Central na vacinação: até agora, 550 mil doses já foram aplicadas no país de 4,3 milhões de habitantes, com 8% da população tomando ao menos uma dose. No total, o Panamá comprou mais de 7 milhões de vacinas. No Panamá América.
PARAGUAI 🇵🇾
“Todos os dias vemos corpos em sacos por falta de insumo”. O relato triste e urgente é de uma paraguaia que aguarda às portas de um hospital para saber a situação de um parente, um dos quase 245 mil contaminados por covid-19 desde o início da pandemia no país. O medo dela também é compartilhado: que o caso de seu ente querido se torne fatal, integrando uma lista de mais de 5,1 mil mortes, muitas delas por conta do colapso total do sistema de saúde. Após ver os leitos baterem 100% de ocupação em março, com recorde histórico de internações e adiamento de procedimentos não-obrigatórios, o país também já convive com novas altas diárias de mortes. Na última semana, mais 412 pessoas perderam a vida por complicações da covid-19. “Esperávamos uma média de 100 mortes diárias em junho, mas isso deve chegar no final de abril”, diz uma autoridade. Há outros dois problemas em curso: a carência de profissionais de saúde e de uma das campanhas de vacinação mais lentas das Américas. A Associação Paraguaia de Enfermaria (APE) reporta que cinco enfermeiras padeceram em decorrência do coronavírus em só 24 horas durante esta semana, totalizando 46 desde março de 2020. Ao mesmo tempo, apenas 70 mil doses de vacina foram aplicadas, no país que é o mais atrasado da América do Sul em aplicação de imunizantes (leia mais no GIRO #75). No ABC Color.
Una palabra:
Muxe – pronunciado “mushe”, esse termo zapoteca surgiu para se referir a homens que assumem “papéis femininos” e, por extensão, passou a ser adotado também por mulheres trans em anos recentes. Acredita-se que a origem remonte ao século 16, de uma corruptela nativa do espanhol mujer (mulher). Muxe é como se identifica Lady Tacos de Canasta, uma cozinheira que ganhou fama nas marchas do Orgulho LGBTQIA+ do país e aparece na série Na Rota do Taco, da Netflix– e agora lançou campanha para o Congresso da Cidade do México.
PORTO RICO 🇵🇷
Walter Mercado (1932-2019), o lendário astrólogo porto-riquenho que por décadas povoou o imaginário latino com seu programa de TV, voltará a ganhar destaque no próximo 16/5: a representante da ilha no concurso Miss Universo, Estefanía Soto, usará como “roupa típica” um vestido inspirado nos figurinos peculiares que marcavam as aparições de Mercado. “Frente aos desafios que a humanidade enfrentou durante a pandemia, a mensagem de alento e de grande impacto universal de Walter Mercado é perfeita para o cenário do Miss Universo”, disse Soto. O astrólogo era conhecido, entre muitas outras coisas, pela frase "mucho, mucho amor”, que também é o título original de um documentário biográfico sobre ele que estreou na Netflix em 2020 (no Brasil, o filme ganhou o nome Ligue Djá, um bordão que o portunhol fez pegar por aqui). Via EFE.
REPÚBLICA DOMINICANA 🇩🇴
Mirando a recuperação econômica, o Ministério do Turismo anunciou a ampliação do plano gratuito de assistência aos viajantes que estiverem no país até o dia 30/4. Incluindo cobertura de despesas relacionadas a possíveis internações por covid-19, a medida quer dar sequência à alta do turismo nos primeiros meses de 2021: apesar da pandemia, mais de 250 mil pessoas chegaram a terras dominicanas nesses primeiros quatro meses, em sua maioria dos EUA. Só em março, a atividade (que representa 12% do PIB) cresceu 3,4%. Via EFE.
VENEZUELA 🇻🇪
“Zero tolerância! União cívico-militar-policial em defesa da soberania”. As ordens do presidente Nicolás Maduro são direcionadas à Milícia Bolivariana, grupos de civis treinados e alinhados ao partido governista PSUV e que, segundo o governo, devem se juntar ao Exército no conflito fronteiriço com a Colômbia, na região de Apure. De extensões políticas, diplomáticas, territoriais e ideológicas, a intriga tem levado os dois governos antagônicos a uma discurso de “guerra”, com milhares de civis em meio ao fogo cruzado e várias denúncias de abusos. O discurso inflamado de Maduro, que evocou até o cubano Fidel Castro, dá a dimensão de que um conflito ainda mais violento possa estar no caminho. Na BBC.