Chile promete “reforma profunda” da polícia militar
Covid já matou um peruano a cada mil | Rio Paraguai atinge menor nível da história | Sequestro de ex-vice-presidente completa um mês sem respostas | Tempestade Gama mata 6 no México
O presidente Sebastián Piñera pediu, nesta sexta-feira (9), pressa ao Congresso para a aprovação de um projeto de reforma dos Carabineros, a polícia militar do Chile. A proposta não é exatamente nova – está em tramitação desde 2018 –, mas recobrou urgência após mais um episódio de violência policial que escandalizou a sociedade e fez o país virar notícia pelo mundo: na sexta passada, um jovem de 16 anos foi jogado por carabineros no leito do Rio Mapocho, que atravessa Santiago, em meio a mais uma onda de manifestações que ecoam aquelas iniciadas em outubro de 2019. O agente responsável, Sebastián Zamora Soto, está atualmente em prisão preventiva sob a acusação de tentativa de homicídio: com traumatismo craniano, o adolescente está internado, mas não corre risco de morte.
Piñera diz que os últimos acontecimentos tornam a reforma ainda mais necessária para responder “ao que o povo está nos pedindo” e garante que sua reforma será “profunda”. No entanto, uma proposta vinda de um governo conservador e tradicionalmente alinhado às forças policiais é vista com reservas pela oposição – para muitos parlamentares, mesmo “reforma” é um termo inadequado a um projeto que não passaria de uma modesta “modernização”. Dois elementos se somam aos debates: por um lado, o entusiasmo de mudança causado pela iminência do plebiscito constitucional do próximo 25/10, uma conquista das manifestações do ano passado e visto como a maior chance que as forças progressistas têm de derrubar provisões autoritárias herdadas da Constituição de 1980, imposta pela ditadura; por outro, a nova brutalidade deu poder de barganha para a oposição questionar o Orçamento de 2021: em meio à crise que pode levar a um corte de até 16,5 bilhões de pesos chilenos (R$ 115 milhões) no orçamento de Ciência e Tecnologia, por exemplo, o governo quer aumentar os recursos dos carabineros em mais de 33 bilhões (R$ 230 milhões), movimentos que vêm sendo muito criticados.
Agora, a oposição condiciona o aumento a mudanças maiores do que as pretendidas inicialmente e pressiona pela renúncia do general Mario Rozas, que comanda os policiais militares. O plano original do governo, ao anunciar as medidas há dois anos, era que a modernização ocorresse gradualmente e só fosse concluída por volta de 2027, para coincidir com o centenário da criação do corpo de Carabineros de Chile. Mas o aumento das tensões sociais em 2019 e a sucessão de violações de direitos humanos (com o primeiro caso notório da atual gestão Piñera sendo o assassinato de Camilo Catrillanca) apressaram e modificaram as ideias: embora ainda vista pelos opositores como uma medida tímida, a proposta original já foi reformulada pelo governo depois dos protestos, com mais elementos acrescentados no primeiro semestre deste ano. Como a reforma efetivamente se daria, porém, ainda é um debate aberto e o esboço parece uma grande carta de intenções: fala-se, por exemplo, na criação de um Ministério de Segurança Pública próprio (hoje, o tema é parte das atribuições da pasta de Interior), em uma maior restrição ao emprego de força em ações antidistúrbios, na obrigatoriedade de câmeras nos uniformes, em melhores controles na seleção de novos agentes e na promoção interna, entre outros pontos cuja implementação não está claramente definida.
Nesta sexta pela manhã, Piñera encabeçou a reunião da chamada Comissão de Reforma dos Carabineros, composta por representantes de órgãos como a Controladoria e a Procuradoria-Geral do Chile, o Instituto Nacional de Direitos Humanos (INDH) e o próprio general Rozas. A promessa é que o Congresso assuma uma postura de maior protagonismo na sequência do projeto, que até aqui avançava com lentidão, enquanto o Chile aguarda dias tensos nas semanas até o plebiscito: sete dias antes da votação, em 18/10, o estopim dos protestos de 2019 fará aniversário, e há expectativa de mobilizações ainda maiores do que as que já voltam a ocorrer, a despeito das poucas restrições remanescentes da pandemia. Na reunião de ontem, muito questionado sobre os últimos acontecimentos, o general Rozas guardou silêncio e se limitou a fazer anotações.
😷 Covid: em uma semana em que o México mudou seus critérios, inflando o número e dificultando o cálculo das tendências regionais, a maioria dos países latino-americanos se manteve em estabilidade ou queda, embora a situação venha se agravando pelo mundo, com uma nova onda na Europa. No acumulado desde o início da pandemia, a América Latina chegará aos 10 milhões de casos neste sábado. Leia nosso levantamento semanal.
Un sonido:
REGIÃO 🌎
O ex-secretário-geral da União de Nações Sul-Americanas (Unasul) e ex-presidente colombiano Ernesto Samper (1994-1998), revelou em entrevista coletiva que a entidade terá sede temporária em Buenos Aires. “Sepultada” para dar lugar à criação do Prosul, uma versão liberal e à direita do multilateralismo regional, a Unasul perdeu protagonismo à medida que a onda rosa – como é chamado o triunfo de governos de esquerda no início do milênio – foi saindo de cena. O Brasil foi um dos países que oficializou a saída do bloco em 2019. Pouco depois, foi a vez do Uruguai, após a vitória de Luis Lacalle Pou sacramentar o fim de 15 anos de centro-esquerda no poder. Na teleSUR.
Quais são os números da qualidade de vida na América Latina? Segundo um estudo da Numbeo, baseado em dados do FMI e da OCDE, como índice de poder de compra, segurança, custo de vida e poluição, Porto Rico aparece em primeiro lugar considerando os latino-americanos (ainda que, a rigor, Porto Rico não seja um país). Logo abaixo aparecem Uruguai, Equador e México. Outros dados, no Dinero.
O futebol sul-americano começou, na quinta (8), a disputa das Eliminatórias para a Copa do Mundo de 2022. Dando sequência às exceções abertas para o esporte, que já haviam sido vistas no futebol de clubes com o retorno da Copa Libertadores em 15/9, mesmo países que ainda não reabriram para viagens internacionais recebem jogos – por enquanto, sem torcida. Ao final das dezoito rodadas, quatro das dez seleções se classificarão diretamente ao Mundial, enquanto a quinta colocada jogará uma repescagem contra um adversário de outro continente a ser sorteado. A tabela, no GE.
ARGENTINA 🇦🇷
Uma mudança de rumos na política externa do país tem gerado uma crise diplomática. Durante a semana, o ministro de Relações Exteriores, Felipe Solá, votou a resolução do Grupo de Lima (fórum de chanceleres criado em 2017 para discutir “soluções para a crise venezuelana”) que condena o governo de Nicolás Maduro, colocando o governo Alberto Fernández ao lado dos conservadores de Brasil, Colômbia e Chile. Ainda que Fernández nunca tenha declarado apoio aos chavistas – com direito a um tuíte discreto e provocativo em resposta aos parabéns que recebeu de Maduro em 2019 – a posição incerta da Argentina em relação a um dos temas mais discutidos na região levanta dúvidas. De fato, qualquer posição tomada de forma oficial geraria polêmica. Agora, ao demonstrar apoio a um grupo bastante criticado por setores da esquerda, sobretudo por não ter demonstrado grandes efeitos práticos diante da crise em Caracas e se transformando em um mero canal de reclamações da Organização dos Estados Americanos (OEA), Solá tem uma nova dor de cabeça: durante a semana, o mal-estar levou à renúncia da embaixadora argentina na Rússia, Alicia Castro, que também já ocupou a posição na capital venezuelana. Castro justificou a decisão dizendo que “não está de acordo com a atual política de relações exteriores”, sugerindo que Solá deveria ter votado ao lado do México. A diplomata ainda disse que a posição atual “não é diferente” da postura do governo de Mauricio Macri (2015-2019). Em 2019, quando ainda concorria ao cargo, Solá chegou a dizer que a posição do país em relação ao tema Venezuela “não mudaria” mesmo com as necessidades de negociar a dívida bilionária do país com o FMI e credores internacionais. No Página 12.
O corpo de Ana Karolina Lara Ferreira Fernandez, morta aos 22 anos, chegou ao Brasil. Em 4/9, a estudante brasileira caiu no poço de um elevador em Buenos Aires em circunstâncias suspeitas, que levaram a uma investigação policial por possível feminicídio, o que atrasou a repatriação. Só na última segunda (5), um mês depois, a família conseguiu um voo para trazer o corpo da jovem. O velório ocorreu na cidade de Chapadão do Céu, em Goiás. No G1.
Un hilo:
Como a Argentina virou o novo epicentro da covid-19 na América Latina.
BOLÍVIA 🇧🇴
O partido do ex-presidente Evo Morales poderá participar das eleições marcadas para 18/10. Foi o que determinou um tribunal do país, após rejeitar um pedido de uma senadora conservadora que pedia a inabilitação do Movimento ao Socialismo (MAS). O imbróglio começou quando Luis Arce, nome escolhido por Evo para tentar uma nova vitória da esquerda após o golpe em 2019, divulgou resultados de uma pesquisa eleitoral interna que apontavam sua vantagem na briga pela presidência. Segundo membros da oposição, já motivados a excluir o MAS do jogo desde o último ano, o gesto de Arce violou as regras eleitorais. Os correligionários de Evo recorreram, alegando que a punição era inconstitucional, o que gerou nova polêmica: durante os 13 anos no poder, o MAS também chegou a apelar à proibição de pesquisas divulgadas em ano eleitoral sob pena de exclusão de candidaturas. Mas, em meio ao fuzuê, a sentença da corte prevalece: Arce, que lidera a maioria das pesquisas de intenções de voto (mas, segundo elas, já não deve vencer em primeiro turno), vai disputar a vaga à presidência com o ex-presidente Carlos Mesa (2003-2005), que concorre logo atrás, e Luis Fernando Camacho, líder de extrema direita e um dos mentores do movimento que levou à renúncia forçada de Evo há quase um ano. Para recapitular toda a crise política na Bolívia, leia este texto, assista a este vídeo e veja as seções sobre o país nas edições passadas do GIRO.
O governo interino de Jeanine Áñez decretou estado de desastre nacional por conta da seca e dos incêndios que já atingem pelo menos cinco departamentos. A medida abre a possibilidade de receber ajuda internacional para conter o descalabro ambiental que, segundo dados do Ministério do Meio Ambiente, já queimou mais de 1,4 milhão de hectares de mata, afetando pelo menos 600 mil famílias por variados motivos. O problema tem feito todos os três Poderes no país voltarem as atenções à questão do meio ambiente. Em El Deber.
CHILE 🇨🇱
Militares chilenos sondaram a inteligência brasileira em busca de informações que pudessem elucidar uma suposta interferência externa nos protestos de 2019, revelou uma fonte do alto escalão com exclusividade ao portal UOL. Reclamando que os governos civis desmobilizaram o aparato investigativo que havia no país durante a ditadura (1973-1990), os militares transandinos realizaram uma consulta informal aos seus pares brasileiros, cuja colaboração teria se limitado a repetir teorias da conspiração: cogitaram que a Open Society, fundação do bilionário George Soros, ou o Foro de São Paulo, que reúne partidos da esquerda latina, estariam por trás das manifestações.
COLÔMBIA 🇨🇴
Congressistas têm pedido a renúncia do senador Carlos Antonio Lozada, membro da Força Alternativa Revolucionária do Comum (FARC) – partido criado a partir da célula pacificada da antiga guerrilha que utilizava as mesmas iniciais – após o ex-combatente confessar participação no assasinato do advogado e ex-candidato à presidência, Álvaro Gómez Hurtado, em 1995. A declaração de Lozada levou a uma onda de repúdio, especialmente por parte de opositores ao Acordo de Paz de 2016, responsável por oficializar a pacificação entre o grupo armado e o Estado. O caso é didático: são justamente esses episódios que os críticos à pacificação usam para denunciar a falta de punição aos crimes cometidos durante os mais de 50 anos de conflito civil, hoje julgados por um tribunal transitório de nome Jurisdição Especial de Paz (JEP), também rodeado de polêmicas. O debate ganhou força após manifestações indignadas por parte da família de Hurtado e declarações do presidente Iván Duque, antigo aluno do advogado morto e um dos maiores críticos do acordo com as FARC. Apesar da pressão, o senador disse que não vai renunciar. Em El Tiempo.
COSTA RICA 🇨🇷
Dramas latinos envolvendo o FMI poderiam ser uma editoria à parte. E nem mesmo a estável Costa Rica, um dos poucos países que geralmente se distancia de crises, está imune aos impasses relacionados à entidade financeira. Como contado no GIRO #50, a sacudida causada pela pandemia deve derrubar o PIB do país em pelo menos 5% ao final de 2020, o que fez autoridades em San José mirarem um acordo de crédito com o Fundo avaliado em US$ 1,75 bilhão. Mas os protestos contra o acordo só crescem: durante a semana, pelo menos 60 pessoas foram presas e outras 25 ficaram feridas, apesar de o presidente Carlos Alvarado já ter voltado atrás em relação à negociação nos parâmetros pretendidos inicialmente. O problema é que os manifestantes – que prometeram novos bloqueios em ruas e estradas – não querem só uma revisão do acordo, mas sim a revogação de qualquer conversa entre o governo costarriquenho e o FMI, sobretudo pelas condições fiscais estabelecidas como condição para o empréstimo. Em El Comercio.
CUBA 🇨🇺
Documentos trazidos a público pelos EUA confirmam que o governo estadunidense recebia informações regularmente sobre o paradeiro de Ernesto “Che” Guevara desde 1965, quando ele deixou de ser visto em público em Cuba. O argentino, um dos grandes líderes da Revolução Cubana, passou a atuar na época junto a um grupo de guerrilhas bolivianas, entre março e abril de 1967, dizem os 29 arquivos compilados pelo Arquivo Nacional de Segurança dos Estados Unidos. As atualizações eram repassadas diretamente para o então presidente Lyndon Johnson. Outro relatório da CIA, datado de 9 de outubro de 1967, relata que, após confrontos entre soldados bolivianos e um grupo de guerrilheiros, havia “três guerrilheiros mortos e dois capturados”. Um dos prisioneiros era Che Guevara – ferido, mas com saúde estável. Não por muito tempo: o presidente boliviano, René Barrientos Ortuño, ordenou a execução do guerrilheiro e, assim, ajudou a transformá-lo em um mártir das revoluções socialistas latino-americanas. A morte completou 53 anos na sexta (9). No Observador.
A reabertura dos aeroportos cubanos ao tráfego internacional está prevista para esta segunda-feira (12), com exceção da Havana. O primeiro-ministro, Manuel Marrero, avisou que os voos internacionais também devem voltar em breve na capital, já que a cidade reúne os requisitos de segurança sanitária. Desde o início da pandemia, Cuba tem menos de 6 mil casos confirmados de covid-19 e 123 mortes em decorrência da doença – o país de região com menos infectados e óbitos em números proporcionais à população. Segundo dados do Ministério da Saúde atualizados até quinta (8), há 420 pacientes internados com coronavírus no país, apenas um em estado grave. No CiberCuba.
Una expresión:
Al tiro – também escrita altiro, é usada principalmente no Chile para se referir a algo que deve ser feito imediatamente. A origem da expressão, porém, é incerta e deu margem a várias hipóteses lendárias: há quem diga que viria da Guerra do Pacífico (1879-1883), quando se conta que os soldados chilenos esperavam para atacar os peruanos enquanto estes recarregavam suas escopetas após atirar (um ataque al tiro); outros, que viria do tiro dado ao ar na largada de uma prova de atletismo para indicar que se deve começar a correr; há ainda quem atribua ao fato de que, no topo do Cerro Santa Lucía, em Santiago, desde 1824 um tiro de canhão marca o meio-dia (o cañonazo de las doce), permitindo que todos os que o escutem possam almoçar al tiro, mesmo sem relógio.
EL SALVADOR 🇸🇻
O presidente Nayib Bukele segue em guerra contra o portal El Faro. A Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) informou que recebeu uma carta assinada por mais de 500 jornalistas e escritores preocupados com os ataques de Bukele contra a liberdade de imprensa. No final de setembro, depois que o jornal revelou os pactos políticos entre o governo e as gangues do país, como contamos neste GIRO, Bukele revidou em rede nacional de rádio e TV: segundo ele, El Faro estaria sendo investigado por evasão fiscal e lavagem de dinheiro. Mas a réplica não colou. Nos EUA, congressistas democratas e republicanos se uniram em um insólito consenso para manifestar (mais uma vez) sua preocupação com a escalada autoritária no país centro-americano. Na BBC.
EQUADOR 🇪🇨
A Corte Nacional de Justiça pediu à Interpol que emitisse uma notificação vermelha contra o ex-presidente Rafael Correa (2007-2017), condenado a 8 anos de prisão pelo crime de suborno. O ex-mandatário vive em exílio na Bélgica desde o final de seu governo e acusa seus antigos aliados de perseguição política em conluio com o sistema judiciário do país (o que, segundo Correa, consiste em lawfare, tema deste vídeo do GIRO LATINO). Não é a primeira vez que o ex-presidente entra na mira em nível internacional. A notificação vermelha da vez, porém, prevê a “detenção provisória de pessoas à espera de pedidos de extradição ou ação legal semelhante”. Em El País.
GUATEMALA 🇬🇹
A Corte de Constitucionalidade (CC), mais alto tribunal para matérias constitucionais do país, vive uma crise desde que a família de um de seus integrantes solicitou seu afastamento definitivo na semana passada, por motivos de saúde. O magistrado Neftaly Aldana, 70, sofreu dois derrames e corre risco de morte, o que motivou o pedido de sua substituição. O problema: a CC acabou de perder outro membro titular, Bonerge Mejía, que faleceu no início de setembro. Com essas duas ausências e outros cargos de suplência vagos em função de indicações políticas no passado, a corte ficaria sem o número mínimo de integrantes (7) para aprovar qualquer decisão. Na prática, isso significa que o tribunal está “desintegrado”, sem poder efetivo, até que o impasse seja resolvido. Até o fechamento deste GIRO, a CC ainda não havia chegado a uma resolução para substituir Aldana, prometendo uma resposta para a próxima segunda-feira (12). Há um elemento a mais na trama: na Guatemala, os mandatos na corte duram cinco anos e novos magistrados serão indicados em 2021, o que reduz o interesse de um substituto em ocupar o cargo por tão pouco tempo. Na Prensa Libre.
HAITI 🇭🇹
Mais um suposto episódio de violência policial. A Polícia Nacional do país abriu uma investigação após a morte do estudante Grégory Saint-Hilaire, baleado na sexta-feira passada (2) durante uma das várias manifestações que são rotina no Haiti. Segundo resultados prévios, o jovem teria sido morto por um dos agentes que faziam a guarda do Palácio Nacional, sede do governo em Porto Príncipe. O porta-voz da polícia diz que haverá punição caso a morte seja oficialmente atribuída a um dos guardas. O caso é só mais um capítulo de repressão por parte do Estado na América Latina, além de um novo indicativo da deterioração democrática em que se encontra o país caribenho. Como já contado em outras edições do GIRO, o país tem registrado uma nova onda de violência, com mais de 150 execuções só em 2020. Muitos deles apontam para o envolvimento de agentes de segurança, além de gangues locais. Na Prensa Latina.
HONDURAS 🇭🇳
Seguindo a tendência regional, o país também registrou uma alta nos números do subemprego na última década. Segundo o Observatório Demográfico da Universidade Nacional Autônoma de Honduras (UNAH), entre 2009 e 2019 mais de um milhão de pessoas passaram a exercer algum tipo de atividade desregulada, elevando o número a pelo menos 2,4 milhões de hondurenhos. Cerca de 63% da força de trabalho do país já se encontra subempregada. Não muito diferente do que vive todo o continente, Honduras também vê os números piorando durante a pandemia: foram pelo menos 200 mil postos de trabalhos perdidos nos seis meses de 2020, cifra que pode decolar até o final do ano. Em termos regionais, esse quadro crítico preocupa: a Organização Internacional do Trabalho (OIT) diz que, até julho, pelo menos 47 milhões de empregos desapareceram por conta da crise gerada pela covid-19. Via EFE.
Un nombre:
Abya Yala – significa “terra em plena maturidade” na língua do povo guna, que habita a região do Darién, entre Panamá e Colômbia, que marca a transição entre as ditas Mesoamérica e América do Sul. O termo era usado para se referir à região antes da chegada dos invasores europeus e, devido à localização central no mapa, converteu-se em um nome alternativo muito utilizado por ativistas indígenas para se referir ao continente como um todo sem usar denominações colonialistas como “Novo Mundo” ou o próprio “América”.
MÉXICO 🇲🇽
A passagem da tempestade tropical Gama pelo território mexicano nos primeiros dias de outubro deixou pelo menos seis mortos e mais de 600 mil pessoas afetadas, segundo números oficiais. Os estados mais atingidos são Chiapas e Tabasco, ao sul do mapa, onde estão concentradas mais de 90% das pessoas impactadas pelas inundações e fortes ventos. A situação levou a Secretaria de Defesa Nacional a estabelecer mais de 130 refúgios temporários, onde quase 4 mil pessoas foram atendidas (fato que também preocupa por conta da pandemia). Além do Gama, causou alerta também o Delta: a tempestade inclusive levou o canal de TV Azteca Noticias a falar dos possíveis desastres de uma forma criativa, mas acabou passando pela península de Yucatán causando apenas danos materiais. Após se tornar um furacão de categoria 4, com ventos de mais de 200 km/h, o Delta seguiu rumo aos EUA, onde tocou terra no estado da Louisiana na noite de sexta (9). E caso você esteja se perguntando por que raios as regiões caribenha e centro-americana sofrem tanto com furacões, é só ouvir o Giro Latino Cast #2.
Morreu aos 77 anos, vitimado por um infarto na quarta-feira (7), o cientista Mario Molina, primeiro e até agora único mexicano a ser premiado com o Nobel de Química. O engenheiro químico foi reconhecido pela Academia Sueca em 1995, após desenvolver estudos reveladores sobre o impacto dos gases cloro, bromo e dióxido de carbono na camada de ozônio. Molina foi o único a vencer na categoria, mas tem companhia conterrânea no Nobel: o Giro Latino Cast #5 contou a história dos latino-americanos galardonados, incluindo outros dois mexicanos. Na BBC.
NICARÁGUA 🇳🇮
Uma lógica que nunca muda. Enquanto a Nicarágua vive sua pior crise política desde o final dos anos 70, quando a revolução sandinista ainda resistia à ditadura de Anastasio Somoza e à contra-investida dos EUA, Washington mais uma vez mostra seu ímpeto intervencionista: segundo o chefe da diplomacia estadunidense para a América Latina, Michael Kozak, uma possível nova vitória de Daniel Ortega nas eleições de 2021 “não é uma opção”; caso o regime vença novamente, novas sanções à economia nicaraguense também estão no calendário, assegurou Kozak. Neste século, porém, não há mais uma revolução. O próprio Ortega, antes um revolucionário, pouco a pouco centrou o poder em sua própria figura, perseguindo opositores, privando jornais críticos de tinta e papel, forçando o exílio de organizações de direitos humanos e reprimindo civis em manifestações. Diante disso, setores da oposição se unem para tentar uma vitória no pleito do próximo ano, em meio a possíveis desistências por suspeitas de fraude. Muitos antigos militantes abandonaram Ortega, hoje já comparado ao próprio ditador que ele ajudou a derrubar. Para acelerar a crise, o poder em Manágua tem ignorado a pandemia.
PANAMÁ 🇵🇦
A luta pelo casamento igualitário no país ganhou novos desdobramentos após uma audiência da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) sobre o tema na penúltima sexta-feira (2), que considerou que o país tem uma legislação discriminatória contra a população LGBTQIA+. Não só o impedimento de casamento foi questionado, mas também as barreiras à conformação de uma família, o direito à pensão alimentícia e herança, as coberturas do seguro social destinadas a cônjuges, entre outros pontos que diferenciam essas pessoas de seus concidadãos dentro do mesmo país. Durante a semana, grupos conservadores voltaram à carga, encabeçados pela Igreja Católica, que criticou a CIDH por (segundo a Conferência Episcopal panamenha) tentar “impor” o matrimônio de pessoas do mesmo sexo no país. Na DW.
PARAGUAI 🇵🇾
Como era previsto, o Rio Paraguai igualou sua altura mínima histórica. A marca ocorreu nesta sexta-feira (9), quando a medição oficial do nível das águas no Porto de Assunção chegou a -0,40 m, empatando o registro que só havia sido visto uma vez, em 1969. A perspectiva é que o nível baixe ainda mais devido à longa estiagem que castiga o país (leia mais no GIRO #49), e alguns especialistas chegaram a cogitar que o curso d’água possa deixar momentaneamente de ser um rio, convertendo-se em uma lagoa até a volta das chuvas – hipótese catastrófica que as autoridades, por enquanto, negam. No ABC Color.
Já se passaram bem mais de oito dias e o paradeiro e situação de vida do ex-vice-presidente Óscar Denis (2012-2013), sequestrado por guerrilheiros do Ejército del Pueblo Paraguayo (EPP), seguem desconhecidos. O punhado de dias era o prazo estipulado pelo grupo armado para que fossem enviados suprimentos para 40 comunidades periféricas do país. Caso tudo não fosse cumprido como combinado, Denis seria fuzilado. Desde então, apesar de a família garantir que tudo foi feito e de respostas da guerrilha de que os valores enviados não eram suficientes, a comunicação entre as partes esfriou – o sequestro completou um mês nesta sexta (9), sem novas notícias. A preocupação com a saúde de Denis vai além do risco de execução: idoso e vivendo com uma série de remédios controlados que não levou consigo ao ser sequestrado, o político também pode ter sido infectado pelo coronavírus. Foi o que aconteceu com um funcionário indígena que trabalhava em uma das fazendas de Denis e foi capturado com o político, mas acabou solto dias depois da captura. A novela macabra, até o fechamento deste GIRO, segue sem desfecho. No ABC Color.
Un clic:
PERU 🇵🇪
Na quarta (7), o Peru chegou à marca de 33 mil mortes por covid-19, ou mil mortes a cada milhão de habitantes, visto que o país tem pouco menos de 33 milhões de pessoas. Colocando em termos mais simples: segundo os dados oficiais, isso significa que um a cada mil peruanos já pereceu em função do coronavírus. O recorde infeliz, só comparável aos números distorcidos da pequena República de San Marino, uma ilha em terra dentro da Itália com apenas 34 mil habitantes, reafirma os andinos como o pior índice proporcional de mortes do mundo inteiro entre os grandes países. Em termos comparativos, fica ainda pior: o Brasil, responsável por 51% dos casos do continente e por 41% de todas as mortes em solo latino, registra um número de 713 mortes por milhão, patamar já considerado altíssimo pela OMS, mas muito inferior aos peruanos. E por que tudo deu errado? Segundo várias análises, a questão tem diversos elementos: um sistema de saúde caro e deficiente, a desigualdade, um índice de informalidade que supera os 70%, dificultando opções alternativas de trabalho, e mesmo uma trágica negação misturada à falta de informação necessária para manter pessoas em casa. Medidas precipitadas do governo, com a compra de testes baratos e ineficazes, também se somam à tragédia. No Líbero.
PORTO RICO 🇵🇷
A governadora Wanda Vázquez declarou, nesta semana, seu apoio à reeleição de Donald Trump para a presidência dos EUA. Vázquez reedita a curiosa dicotomia do território, onde os políticos pertencem a uma sigla em Porto Rico e a outra nos Estados Unidos – ao Norte no mapa, ela é republicana, como Trump. Mas, dentro do Partido Novo Progressista (PNP) na própria ilha, ela foi derrotada nas primárias por Pedro Pierluisi, membro do Partido Democrata. Assim, Vázquez não poderá tentar se manter no cargo na votação de 3/11. O apoio também joga luz sobre a limitação dos moradores da ilha no processo eleitoral dos EUA: eles não têm direito a votar para presidente, mas o apoio de Vázquez tenta conquistar os descendentes de portorriquenhos nascidos em solo estadunidense – estes, sim, com direito a votar em Trump ou Biden em novembro. A Flórida, onde vivem muitos deles, é um estado tradicionalmente decisivo na corrida à Casa Branca, devido ao sistema eleitoral com voto indireto que existe nos EUA. Em The Hill.
REPÚBLICA DOMINICANA 🇩🇴
“A República Dominicana não pode ser a solução da crise no Haiti”. A frase foi dita pelo presidente Luis Abinader, enquanto pedia o apoio da comunidade internacional para sanar o drama irresolvível no país vizinho, com quem os dominicanos dividem a pequena ilha caribenha de Hispaniola. Empossado há menos de dois meses, o mandatário alertou que o problema vivido pela nação mais pobre do Hemisfério também não ajuda o seu governo, que assumiu um país “quebrado” – apesar de não ser o latino com piores estimativas de crescimento em 2020, é esperado um tombo anual de 4% do PIB em função da pandemia, que foi implacável contra o setor turístico, principal atividade comercial dominicana. No Listín Diario.
URUGUAI 🇺🇾
De saída da política, mas ainda bastante crítico ao atual governo. Durante a semana, o ex-presidente Pepe Mujica (2010-2015) disse que a gestão de Luis Lacalle Pou, iniciada em março, não tem conseguido dialogar com o governo argentino, especialmente durante um período de crise vivido no país vizinho. Segundo Mujica, o “erro diplomático” pode, inclusive, comprometer as negociações entre os dois países, fato que, no limite, torna as projeções de crescimento da economia uruguaia meramente “otimistas”. A falta de atenção dada aos vizinhos levou o ex-presidente a sugerir uma conversa pessoal com Alberto Fernández para melhorar o clima. Em La Diaria.
VENEZUELA 🇻🇪
O presidente Nicolás Maduro apareceu em um vídeo desejando a recuperação de seu homólogo e ferrenho inimigo Donald Trump, que testou positivo para covid-19 nos últimos dias. Sem deixar de criticar o republicano por “subestimar medidas de prevenção”, o venezuelano disse que seu país não deseja que nenhum ser humano seja infectado e que, apesar de Trump ser um inimigo visceral de seu governo, deve se recuperar. Por fim, sem ironia, disse esperar que a doença possa despertar um lado mais humano seu algoz yankee. Na NBC.
A Universidade Central da Venezuela (UCV), maior instituição pública de ensino superior do país, luta para se manter em pé (por vezes, literalmente, dada a falta de manutenção dos prédios) em meio à crise endêmica agravada pela pandemia. Com 32 mil estudantes, a UCV é uma central da fuga de cérebros do país, estimando que pelo menos 30% deles abandonam a Venezuela tão logo obtém o diploma. Não é à toa: com o bolívar extremamente desvalorizado após sete anos de contínua hiperinflação, mesmo os professores da instituição fundada em 1721 convivem com salários equivalentes a US$ 1,50 por mês. A deterioração econômica também se refletiu no orçamento da UCV: de US$ 500 milhões em 2008, passou a míseros 2 milhões neste ano. Via Reuters.
Gostou do nosso conteúdo? Ajude a construir um GIRO ainda melhor e mais completo. Conheça nossa campanha no Catarse!
Conheça quem faz o Giro Latino. Também estamos no Twitter, Instagram, YouTube e em Podcast.